TEKENIKA

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TEKENIKA – Setenta Dias Sozinho Em Uma Canoa No Mar Do Cabo Horn, de Giuliano Giongo, original de 1992, 280 páginas da José Olympio Editora – 1995, tradução de Élia Ferreira Edei. Uma verdadeira obra prima.

É um livro onde o autor mergulha dentro de si próprio como sempre acontece àqueles que encaram grandes caminhadas solitárias. Apesar de ser ele próprio uma das estrelas do auge das escaladas invernais na Patagônia da década de 80 – Fitz Roy, Torre Egger e Cerro Torre, juntamente com Bill Denz e tantos outros, o livro não foi escrito para descrever perigos ou enaltecer seu ego.

Todas as páginas são dedicadas a uma estranha forma de afirmar e viver sua filosofia, combatendo seus “medos” mais íntimos e reafirmando uma cultura avessa ao consumismo desenfreado. Este livro é fundamental para quem realmente ama a natureza e procura uma forma sadia de se relacionar com ela. Não trás respostas prontas e nem faz perguntas, mas deixa um exemplo e muito para se pensar.

Confira pequenos trechos – nem de longe os melhores:

“É claro que naquele dia tive medo. O instinto de conservação fez com que eu me debatesse como uma galinha que estivesse sendo depenada viva. Mas assim que pus a cabeça para fora da água, consegui raciocinar. E, raciocinando, um pouco de calma voltou. Houve também uma dose de fatalismo. Esforçara-me em aceitar a morte, no final das contas, é uma lógica conseqüência da vida. Alguém havia escrito que as mortes são todas iguais, mas as vidas não. E um outro sábio disse que a calma era a única e verdadeira riqueza do homem. E como todas as verdadeiras riquezas, não se podia comprar.”

“Era uma tristeza eu estar atormentado pela fome. Pensei que, se tivesse apenas um saco de farinha, seguramente teria ficado ali. Pelo menos até que ele esvaziasse. E poderia mandar buscar minha família, vivendo sem outra preocupação a não ser alimentar-me e divertir-me. Não causaria danos, nem criticaria mais a sociedade. Realmente eu me tornara um chato. Cultivaria a sublime filosofia do não fazer, na qual acreditava como sendo a única religião capaz de garantir a sobrevivência de nossa espécie.”

“Naquele momento senti não ter um daqueles motores poluidores e todos os outros artifício da técnica, desde que servissem para evitar toda aquela canseira. A única coisa que importava, entretanto, era impedir que aquele pesqueiro me escapasse. Não era possível que todos os pescadores fossem cegos. Nenhum deles fizera qualquer sinal provando que me haviam visto. Subitamente retrocedeu um pouco, talvez pronto para partir. Gritei como um louco.
Na luz diáfana divisei um dos três homens que olhava na minha direção. Mas não tinha certeza. Agitei o remo e comecei a zigzagear. Quem sabe expondo o lado da canoa me vissem com mais facilidade? Vi então que ele se voltava para os outros, apontando para o lado onde eu estava. Subitamente, tornei-me corajoso de dar nojo.”

É um livro para ser entendido e está fora do alcance daqueles que pararam em Jon Krakauer.

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Sobre o autor

Julio Cesar Fiori é Arquiteto e Urbanista formado pela PUC-PR em 1982 e pratica montanhismo desde 1980. Autor do livro "Caminhos Coloniais da Serra do Mar", é grande conhecedor das histórias e das montanhas do Paraná.

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