Travessia do Rio Pequeno: Cunha à Paraty por trilha. Parque Nacional Serra da Bocaina

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A proposta era de nível moderado, o que normalmente não me traz grande atenção… o que mudou quando soube que faríamos a ligação Cunha – Parati por trilha, com um singelo ataque à Pedra da Macela para apreciar o nascer do sol antes de nos enfiarmos pelas matas a perder de vista que separam as duas extremidades.

Nossa rota, denominada Trilha do Rio Pequeno escondia muitas grandezas, sob o despretensioso nome. Nas minhas idas anteriores à Macela, era desejo antigo fazer a ligação “até a praia pela mata”, mas nunca soubera de trilha ou vereda ali. Mistérios de Amanda, esse frequente descobrir de lugares e passagens invulgares, que ainda que estejam “abertas” ao grande público são trilhadas por dezenas, ou menos, de intimoratos montanhistas. Aqueles raros que trilham, mesmo fora da “temporada”, com os cuidados e cautelas imprescindíveis. Que buscam o conciliar do gosto pelo desafio agreste com a rotina citadina.

De imediato, apreciei a ideia e agendei a data. Decisão que se mostraria muito mais acertada do que poderia supor. Fui o terceiro a garantir a vaga, em meados de junho para um rolê em dezembro… para quem me conhece, pode imaginar a “gana”, ainda mais se considerarmos os projetos de discutível sanidade em que andava envolvido à época.

Nas vésperas, uma sequência de dissabores inesperados resultou na fratura de 3 costelas da líder dos Arcanjos, grupo que arrisco dizer, traduz “o crème de la crème” do trilhar paulista atual. “Poucas” trilhas, mas daquelas bem apuradas, selecionada à dedo pelo potencial desafiador, beleza cênica, natureza muito preservada, ineditismo etc. Apesar de não ser exclusivista, tem um quê de elitista por campear pela preservação de montanhismo-raiz, de batalhar pela formação de novos trilheiros, às antigas, pelo exemplo, pela mão na massa, ou melhor, pelo pé no barro… nunca pelo pregar dissociado do agir.

Montando a mochila

Como de praxe, o ano passou voado, e a distante data se avizinhou. Apesar da detida avaliação do tempo, considerei a possibilidade de pancadas de chuva, pernoite inesperada na mata, etc e montei uma mochila compacta, mas com recursos críticos para eventual necessidade.

Em resumo: 2 blusas segunda pele; calça segunda pele; par de meias; 2 capas de chuva, 2 ponchos térmicos, 1 cobertor de emergência reutilizável; 1 saco de bivaque de emergência, fogareiro e combustível, 2 pacotes de sopa, 4 de chás, 1 sachê chocolate quente, 1 sachê de café com leite; 2 isqueiros; diversas toalhas compactas; kit de primeiros socorros “mediano”, pois apesar da trilha ser curta, o grupo seria grande. Torcendo para não usar, torniquete e bandagem elástica, compunham os itens mais volumosos dessa parte do equipo. Doces diversos, queijos, salaminho completavam meus provimentos, arranjados em uma mochila de 9 litros.

Imprimi e plastifiquei o mapa detalhado do rolê, com as informações copiladas do Wikiloc, das imagens de satélite e dos relatos que estudamos previamente. Providencie 2 cópias, mantendo uma comigo e a segunda com a Amanda, sabendo que, em caso de necessidade ela navegaria tranquilamente com as informações dali e seu bom fato de rastro de trilha.

Na sexta, o sol intenso do começo da tarde cedeu lugar a ameaçadoras nuvens por sobre a serra do mar, enquanto seguia de Santos para o Tatuapé. Confesso que cogitei reforçar o quantitativo de capas de chuva, rsrs. Peguei a Amanda e seguimos, discutindo (mais) a evolução do tempo nos últimos dias e as previsões conflitantes que surgiam para a região. Amanda apostava que teríamos o nascer do sol com tapete de nuvens e que, ao longo da descida, o sol forte dissiparia as nuvens. A Fernanda cantara essa bola, no grupo, na véspera. A previsão de resgate era para 16h, o que, considerando o pôr do sol das 18h30, nos assegurava pelo menos uma hora de luso-fusco, já fora da mata mais fechada. A lua, ainda cheia, também era uma condição favorável em caso de necessidade de eventual navegação tardia.

Soube que a Glau precisara abdicar da trilha, em função de algum B.O. no trampo. Lamentável, mas acontece. Chegamos no ponto de encontro, sinalizamos no grupo e aguardamos os colegas. Estranhamente, nessa oportunidade, não dividíamos a lanchonete com outros grupos de trilheiros em concentração para rolês. Talvez a época do ano, afinal trilhar fora de temporada e com o tempo menos estável é mais raro mesmo.

O Gabriel já estava por lá, e aos poucos o pessoal foi chegando. Com o aproximar da hora, a Amanda deu uma “cobrada” geral na localização dos faltantes para apurar a viabilidade de esperar a todos. Os atrasos não seriam expressivos e verificou com nosso destemido e insone motorista de ajustarmos a duração da parada para garantir a chegada na abertura do parque, 4h. Chegar muito antes nos obrigaria a esperar dentro da van, chegar depois poderia comprometer o apreciar do nascer do sol, previsto para 5h08. Com a chegada da derradeira dupla, o Cristiano e a Ana, embarcamos sob a cuidadosa direção do Éber e partimos. O trânsito estava um pouco congestionado, mas logo alcançamos a rodovia dos trabalhadores e o Éber conseguiu imprimir uma boa velocidade ao nosso deslocamento. Ansioso pela trilha e sabendo que a parada de lanche seria em pouco mais de uma hora, segui conversado com o Éber sobre trilhas e histórias envolvidas.

No Frango Assado, fizemos uma parada para esticar pernas, aliviar bexigas e mastigar algo. Seguimos viagem e agora, me entreguei, sem pudores aos braços de Morfeu.

Como usual, acordei com a mudança no comportamento do carro, ao deixarmos a Via Dutra e tomarmos a sinuosa Cunha – Parati. Revisei o avanço com o motorista e foi minha vez de renunciar à passada célere pelo cenotáfio à Paulo Virgílio, civil paulista barbaramente trucidado pelas tropas federais que subiram de Parati para dar combate aos Revoltosos Paulistas em 1932. Torturado para que revelasse a disposição das tropas de São Paulo, teria dito: “eu sei, mas não digo. São Paulo vence!”. Obrigado a cavar a própria cova, foi fuzilado e coberto por pedras. Representa, nas palavras poéticas, a “alma paulista”, indomável e inquebrantável. Ao passarmos, apenas apontei o local e fiz uma silenciosa oração pela Paz negada a esse civil em vida, que tenha sido alcançada na eternidade.

Chegamos com 15 minutos de antecedência e, autorizados pelo vigilante, já nos preparamos para a subida, deixando parte do equipamento na van, para recuperarmos na volta. Minha mochila já estava otimizada, de forma que não precisei remover nada. Prudente, a Andressa optou por aguardar nosso retorno na van, por estar convalescente de uma gripe mais severa. Iniciamos o ataque à Macela, com as lanternas clareando o piso de bloquetes recém-instalados, muito diferente das minhas incursões anteriores, quando a erosão provocada pela chuva na terra desnuda resultara numa ladeira irregular forrada de pedras, mantida no limiar da transitabilidade por veículos de tração integral.

Nas condições presentes, subi a passo, tentando refrear o ímpeto Amandino de caminhar célere, pelo “trecho plano”. Suas três costelas quebradas faziam jus ao adicional de prudência. Dispúnhamos de 1h15 para o romper daquela aurora. Subimos apreciando o colorir intenso que o arrebol trazia no horizonte, com o luar sendo vencido gradativamente pela alvorada. Paulatinamente, fomos dando passagem aos colegas de subida, buscando alcançar os menos céleres do grupo, para assegurar uma ascensão tranquila, com o ritmo alinhado ao inexorável nascer do astro-rei.

Nascer do sol

Cumeamos a Macela com 20 minutos de margem, permitindo apreciar o lindíssimo tapete de nuvens, se estendendo alvo para todas as direções, com imponentes cumes se destacando como “ilhas negras” aqui e ali. Em dois pontos, a suavidade do tapete se quebrava na vertical, com montanhas escarpadas de nuvens. Minha primeira impressão era de que decorriam de tempestades no horizonte, onde as fortes correntes convectivas venciam o nivelamento térmico do topo das nuvens stratus. Fiquei conjecturando o porquê daquelas singularidades, observando a topografia por sob as nuvens com o PeakFinder. Talvez elevações de serras distantes? Ficou como lição de casa.

Após centenas de tapetes e arrebóis o ímpeto de registrar com fotos deu lugar a um apreciar que acredito mais completo. Dei algumas voltas, observando a floração das abundantes myconias theezans que perfumavam o ar matinal. Fui até o outro mirante, que dá vista para os picos da Mantiqueira e da Bocaina. Acordamos de iniciar a descida às 6h, no fito de entrarmos na trilha da travessia, às 7h. Fizemos uma rápida parada para um registro do grupo nesse mirante com a Pedra da Mina alinhada à pedra que, guarnecida de rústica escadinha, se presta de pedestal aos aficionados por cliques.

O grupo reunido

Na descida, encontrei algumas poucas pixiricas temporãs e infindáveis fúcsias. Chegamos na van, o pessoal revisou as mochilas da trilha e seguimos para a entrada da trilha, sinalizada com placa indicativa de direção e extensão. Deixamos informado o horário em que começaríamos a caminhada para Parati, 7h. Próximo de nós, o grupo que descera à frente aproveitava o sol matinal sob um carregado pé de pororoca indicando a elevada disposição de água do solo. Quem optou por não se valer dos sanitários da parte alta (precários), teve nova oportunidade antes de entrarmos na trilha.

Pontualmente, iniciamos a trilha, tendo o cuidado de conferir a totalidade do grupo. Assumi a honrosa posição de cerra-fila, como combinado previamente com a Amanda. Assim teríamos a tranquilidade de que não ocorrer desencontros ou perdidos significativos. Nossa primeira parada, praticamente na entrada da trilha foi na Cachoeira das Bromélias. Uma pequena queda d’água, que forma um dos tributários mais elevados do Rio Pequeno, cujo curso seguiríamos de longe, com o marulhar de suas águas à nossa esquerda, ao longo de toda a caminhada. Nos banhamos em seu leito apenas na parte baixa, após alcançarmos a van, já em terras paratienses.

A sinalização desse início pode iludir o caminhante desavisado de que o restante do caminho recebeu igual atenção. Nada mais longe da realidade. Não haveria novas placas indicativas ou informativas ao longo da quase totalidade dos 16 km de trilha. Apesar de bastante intuitiva ao olhar mais tarimbado da Amanda e do pelotão da frente, diversos rastros podem induzir o desviar do trajeto correto, com a consequente incremento na exposição ao risco por parte dos frequentadores. A presença de gado vacum, criado livre também não é reportada. Amigo, quer seja um boi ou uma vaca, mal manejados ambos podem ser bem mais perigosos ao caminhante despreparado que uma onça parda… facilmente ultrapassam 700 kg e o comportamento gregário pode resultar em um “estouro” de dezenas de animais, caso sintam-se acuados ou ameaçados.

Logo no começo da descida, chegando no primeiro rancho encontrei um senhor subindo, com galochas brancas, que me recordaram o pessoal na lida agrícola. Talvez fosse o melhor calçado para aquela travessia. Já acompanhei pessoal acostumado com bota dessas andar quilômetros, como se fosse o calçado mais confortável do mundo. Como se diz, o hábito faz o monge.

Seguimos em frente, passando por inúmeras pequenas corridas d’água que apenas cruzavam a trilha, quando o manejo estava eficiente ou formavam extensos charcos e lamaçais quando o descuido no manejo das drenagens. O transitar dos animais ao longo de décadas intensificou a erosão dos trechos de solo exposto na trilha, resultando em “canaletas” que frequentemente alcançavam 60 cm de profundidade, muitas delas parcial ou inteiramente ocultas pelo capinzal que viceja intensamente sob a fartura de água, nutrientes orgânicos e sol.

Atravessando o capinzal

Por vezes, me surpreendo com os alinhamentos de expectativas e acontecimentos. Há menos de uma semana, completei a leitura de “Erosão – Dos Solos às Civilizações” que trata, fundamentalmente das consequências do impacto antrópico ao solo. Leitura conceitual feita, me surge a enriquecedora oportunidade de percorrer esse trajeto, sem pressa, divagando sobre o que li e o que presenciava. O resíduo orgânico das criações domesticadas permitiu que algumas civilizações superassem o intenso desgaste do solo pelo desmatamento e produção de alimentos nas encostas e nos vales. Superar não é a melhor palavra, dado que diversas civilizações se perderam na história, mesmo com essa prática. Melhor falarmos “postergar a exaustão do solo”. Processo vivenciado aqui, às mãos-cheias na rodovia Presidente Dutra, onde segue-se por quilômetros de terras “perdidas”, onde o capim viceja menos que os cupinzeiros.

Divagação feita, retornemos ao caminhar cuidadoso que esse arranjo de terreno, hostil como bem definiram, demandava. Os passos cuidadosos e temerosos da Ana Maria foram se somando, aos milhares, e metro após metro, os pastos foram sendo vencidos. A Juliana andava com igual cuidado, mas com maior destemor. O Cristiano guardou os próprios bastões e usando um dos bastões da Ana Maria procurava suportar a companheira, nos trechos em que clamava silenciosa por socorro. Poucas vezes precisou verbalizar o pedido, frente à atenção dedicada pelo Cristiano. Encontramos um cogumelo do gênero _panaeolus_ cujo consumo tem efeitos psicodélicos. Esse eu não ousei provar, ao contrário dos _ auricularie_ encontrados.

Passando por mais pastos.

O pelotão da frente (Márcio, Fernanda, Caio, Cayuan, Shirley e Gabrielle), composto pelo pessoal mais desenvolto acabou por encurralar (aos olhos dos animais) algumas cabeças de gado entre eles e uma porteira… quando a Amanda chegou e eles conseguiram tocá-los, o solo estremeceu sob suas patas, numa corrida que só sei descrever como galope. Duvido que alguém tenha permanecido inalterado frente ao poder que as poucas cabeças de gado em movimento representaram.

Por algum desígnio da natureza, a lama dessa porteira estava particularmente mais nutrida de componentes orgânicos, e os mais desenvoltos seguiram se equilibrando pelas travessas até o outro lado. Eu preferi manter a atitude low profile, fleugmática até, (difícil cair quando já se está no chão,) e fui ajudando aos outros na passagem, até que o Gabriel, no afã de oferecer um caminho mais viável aos menos desenvoltos lançou à lama um pedaço de tronco que conseguira coletar à margem, aspergindo lama e dejetos em todas as direções. Se Maomé não vai ao solo (Márcio e Amanda o fizeram), o solo veio a esse profeta que vos escreve.

Passado esse ponto, ao final da descida desse pasto, encontramos uma corrida de água e tratei de auxiliar a Amanda na recuperação da dignidade e o asseio possível, ali. Tomamos banho de garrafa e esfregamos a roupa para remover a sujeira e retomamos a caminhada, a Amanda à frente do segundo pelotão, formado pelos mais conscientes e cuidadosos (Márcia, Bruna, Andressa, Murilo, Natasha, e Anderson escudados pela própria Amanda). Fizemos uma primeira parada para lanche ao final de um trecho de pasto, antes de entrarmos novamente na mata, apreciei enormemente o lanche de pão integral, patê de ricota com peito de frango e alface. Para não deixar a musculatura esfriar demais, a parada foi curta e logo retomamos o caminhar. Reassumi a posição de cerra-trilha, de forma a garantir que não houvesse ninguém desguarnecido no caso de alguma complicação. Acreditem, elas acontecem.

Final da descida, hora de dar uma pausa.

Alcançamos uma grande laje banhada pelo sol e com um curso d’água bem razoável e a Amanda determinou uma parada de 20 minutos para lanche e descanso antes de prosseguirmos. Na saída, o rastro batido e uma porteira aberta, como muitas encontradas antes pela fosse pela passagem descuidada do pelotão da frente ou não, induziu o seguir em frente (nesse trecho, a trilha correta faz uma curva fechada de 90 graus, enquanto o caminho errado segue em frente). A sinalização muito deficiente consistia de um defectível totem: uma pedra grande, natural dali e uma segunda, pequena, sobreposta a essa primeira. Com o olhar buscando um desvio do caminho, consegue-se perceber um fraco rastro, à esquerda, em nível, atrás e acima desse paupérrimo totem. As meninas, que seguiram na nossa frente enquanto o Cristiano amarrava os cadarços, não notaram o rastro, mesmo cantada a bola e estando ambas em pé, sobre o início do desvio. Também iniciaram o subir do pasto em direção à porteira aberta. Para assegurar que o trajeto que supunha estava correto, pedi que aguardassem um pouco, paradas onde estavam, enquanto eu e o Cristiano seguimos cerca de 10 metros pelo rastro, para confirmar a correção da rota que eu havia suposto. Com ela confirmada pelo GPS do Cristiano, pedi às meninas que nos alcançassem e seguimos pelo rastro que vai se consolidando à medida que se afasta do ponto de erro, conforme as pessoas convergem para o caminho correto. Evidente indício de que a sinalização é mais precária do que aconselhável, ainda mais para uma trilha de parque, na Serra do Mar. Os custos, tanto humanos quanto ambientais de operações de resgate extrapolam por ordens de grandeza o custo de uma sinalização minimamente adequada.

A trilha não tem sinalização adequada, que pode ocasionar perdidos.

Notei movimento no alto da colina e, como se para confirmar a inadequação da sinalização, descubro que o grupo do meio também enveredara pelo erro, antes de constatar e corrigir, voltando sobre seus passos até a porteira. Liberei o trio que acompanhara até ali para que fosse em frente, e fiquei para aguardar a correção de caminho do segundo pelotão, para então fazer o fechamento da trilha com eles. A mudança no terreno da trilha os favoreceu e só os encontraríamos no final da trilha.

Aos poucos, a Amanda alcançou a frente do agora, terceiro pelotão e se distanciou nas curvas da trilha. Segui me arrastando no fechar de trilha, dividindo minhas dores com meus novos companheiros de rabeira, notadamente, o Murilo que claudicava discreto e constrito usando o bastão que adotara. Sabendo que não acreditaria auxílio de pronto, apenas acompanhei por algum tempo, esperando a oportunidade de apoiar.
Antes que ela surgisse, à nossa esquerda uma placa me chama atenção e a serendipidade se fez presente naquele final de rolê: apontava as ruínas históricas de um alambique do período colonial, algo que sem dúvida, eu precisava conhecer.

Apesar do portãozinho fechado, consegui visualizar alguém bem lá pra dentro e engolindo a vergonha de entrar em casa alheia e o temor de ser mal interpelado por cães de guarda, abri o portãozinho e fui avançando, esperando reduzir a distância ao ponto de conseguir contato para uma comunicação civilizada. Contato estabelecido, fui muitíssimo bem recebido pela Ângela e seu esposo, que me mostraram o muro de cantaria do antigo alambique da família Maan, construído por escravos ainda nos primórdios da ocupação de Paraty. Prosa boa, não fosse meu desconforto em preocupar o grupo, teria ficado bem mais. Me prometi voltar ali com calma para conhecer mais do lugar. Agradecendo toda a gentileza, me despedi do simpático casal e apertei o passo na tentativa de reduzir o a preocupação.

Antes do fim da trilha

As ruinas do muro

Mandei mensagem no grupo e por SMS, informando da minha peripécia. Em alguns pontos de terreno menos hostil arrisquei uns trotes, apesar das dores dos pés. Como a Amanda fala, “teatro” … meus pés são atores muito convincentes nessas horas. Descobri depois que a sola bem gasta e a palmilha destruída pela abrasão reduziram em muito a capacidade do tênis de distribuir os esforços e absorver os impactos. Sofrendo também se aprende.

Apertando o passo e dando curtas corridinhas, logo alcancei o Murilo para meu grande alívio. Agora, irmanado nas dores musculares, tinha intimidade para oferecer cataflan, e, pelo que ele disse aliviou um pouco o desconforto. Mais algumas centenas de metros de caminhada e encontramos a Amanda que se deitara para nos esperar, literalmente. Essa mulher tem rodas nos pés, ainda mais nas descidas. Os metros finais foram percorridos comigo confabulando sobre o que encontrara (o muro de cantaria) para alegria de uns e tédio de outros.

Chegamos no final da caminhada desse dia às 15h e junto à van, encontramos notícias de todos os grupos. Pegamos as mudas de roupas limpas e seguimos para um rápido mergulho no Poço da Laje, do Rio Pequeno. Com bastante cautela nos banhamos e trocamos de roupas antes de retornarmos a van para que o Éber nos conduzisse em segurança ao ponto de partida. Pouco depois das 22h, estávamos de volta no Tatuapé. Uma trilha desafiadora, não pelo esforço físico de vencer a gravidade, mas pela tensão de pisar no local correto (ou menos errado), quase que o tempo todo.

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19 Comentários

    • Rogerio Alexandre em

      eu diria que é moderada pelas questões de lida com o gado e de sinalização, que atualmente está deficiente. Atenção com a pisada pelo risco de torções nas erosões criadas pelo passagem do gado. Tecnicamente, para mim, foi bem tranquila.

  1. Bom prestar um ouço dr atenção!!! Primeiro que o nome do revoltoso não é Pedro Virgílio, e Dim, PAULO Virgílio.
    Segundo, com tanta placa, e tanto estudo prévio, conseguiram errar o nome do lugar! É “Parque Nacional da Serra da Bocaina” e NÃO Parque estadual da bocaina.
    Mas realmente a sinalização feita ao longo da trilha já está apagada, e o gado é um problema muito sério!!!

  2. Bom prestar um pouco de atenção!!! Primeiro que o nome do lavrador morto não é Pedro Virgílio, e sim, PAULO Virgílio.
    Segundo, com tanta placa, e tanto estudo prévio, conseguiram errar o nome do lugar! É “Parque Nacional da Serra da Bocaina” e NÃO Parque estadual da bocaina.
    Mas realmente a sinalização feita ao longo da trilha já está apagada, e o gado é um problema muito sério. Além de que não deveria estar lá, causa um estrago danado !!!

  3. Parabéns por seu relato impressionante e quase impecável…
    O único pecado foi trocar o nome do herói das terras cunhenses, Paulo Virgínio, que tem uma bela homenagem da história vivida no Obelisco do Ibirapuera, juntamente com os quatro ‘famosos’ heróis caídos na irraciva revolução, estou falando do MMDC.

    Agora, de encontro ao seu belo texto, nos cabe como cidadãos acolhidos por esta terra, tentar junto aos órgãos públicos e mantenedores da trilha, fazer a correção da falta de sinalização adequada. Seu texto é preciso e servirá de guia..

    • Rogerio Alexandre em

      obrigado pela generosidade na crítica. Faremos as correções devidas. Talvez fosse legal prepararem um mapinha – padrão da trilha e disponibilizarem no site do parque. Serviria para quem esta planejando fazer a travessia se basear, e, em caso de necessidade de acionamento de resgates/buscas que a pessoa “falasse a mesma língua” dos bombeiros.Uma sugestão. Se de alguma forma ajudar, disponibilizo o arquivo que preparei para a nossa travessia. Seria legal, nesse caso, que o nome CORRETO do parque constasse do mapa, talvez fosse um bom desagravo quanto a gafe do meu relato, no título.

  4. …uma observação sobre o relato relacionado a Paulo Virginio… Na verdade ele estava no lugar errado e na hora errada… E essa frase” sei mas não conto”, é lenda urbana. Assim como a própria “estória” a respeito dele. Pesquisas realizadas com seus familiares, trazem uma outra verdade. Essa trilha, e outras existentes na região, foram feitas por mim qdo adolescente, juntamente com primos e amigos meus residentes no município, tanto de Cunha como Paraty. A pé, a cavalo, de bike, de moto…, de off roud. A região merecia mais atenção por parte dos administradores, e órgãos responsáveis pelo desenvolvimento turístico do lugar, tanto de Cunha, como de Paraty. Lamentavelmente, isso não acontece!!!…

    • Rogerio Alexandre em

      obrigado pelas informações adicionais. Se houver local/fonte para me informar melhor, agradeço informar. Independente da historicidade da célebre frase, pelo que entendo foi uma baixa civil em um contexto de enfrentamento militar, o que é dramático.
      concordo integralmente que a região merece mais atenção dos prefeitos/vereadores/etc. Região repleta de historias e belezas naturais. Me parece que Cunha enveredou por privilegiar a parte da cerâmica, que é excepcional, inclusive com fornos de tecnologias centenárias… mas descuida do turismo, a exceção de poucas (sei que há varias) cachoeiras, o Lavandário e a própria Macela.

  5. …uma observação relacionado a Paulo Virginio… Na verdade ele estava no lugar errado e na hora errada… E essa frase” sei mas não conto”, é lenda urbana. Assim como a própria “estória” a respeito dele. Pesquisas realizadas com seus familiares, trazem uma outra verdade. Essa trilha, e outras existentes na região, foram feitas por mim qdo adolescente, juntamente com primos e amigos meus residentes no município, tanto de Cunha como Paraty. A pé, a cavalo, de bike, de moto…, de off roud. A região merecia mais atenção por parte dos administradores, e órgãos responsáveis pelo desenvolvimento turístico do lugar, tanto de Cunha, como de Paraty. Lamentavelmente, isso não acontece!!!…

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