Trilha dos Porcos e Cachoeiras do CTG

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Choveu a noite inteira e, hoje, sábado, o dia continua nublado com muita cerração, encobrindo o interior do cânion e a paisagem ao redor. Embora tenhamos acordado cedo, só saímos lá pelas dez e meia da manhã. O plano é descer a trilha dos Porcos acompanhando a parede norte do cânion Churriado cuja parede sul vem a ser a parede norte do Malacara.


A mochila está deveras pesada! Também pudera – são 8 kg – porque, além das roupas de neoprene molhadas, levo outras cositas mais. Nunca na minha vida carregara tanto peso nas paletas. O tempo continua fechado. À medida que nos aproximamos do cânion Churriado, percebe-se o espesso nevoeiro saindo de seu interior. O céu, totalmente, nublado e a temperatura, em torno de 17º C, torna gostosa a caminhada, evitando que se sue muito. Paramos algumas vezes pra descansar e comer nozes, amendoins, pistaches e amêndoas. Estas frutas oleaginosas por conterem muitas calorias são boas pra reporem as energias perdidas num trekking pesado como o de hoje.

Serão aproximadamente 8 horas batendo pernas. Ainda não fiz rapel no Cânion Churriado que, segundo Kaloca, não é lá dos mais legais. Diz ele que as cachoeiras são quase secas e sua extensão é menor que a do Malacara. Eu gosto de saber disso, afinal, muita água nas cachoeiras me assusta um pouco. Gosto mesmo é de descer no seco. Combino com ele um canionismo nesse cânion numa próxima aventura. A conformação do Churriado é bem diferente da do Malacara porque, de sua parede norte, saem, perpendicularmente, várias gargantas menores. O caminho ondulado sobre o campo turfado requer certa habilidade de modo a evitar que os pés afundem no terreno mais encharcado que o habitual, pois chove na região faz dois meses.

Distinguem-se nitidamente vários tipos de flores amarelas, brancas e roxas despontando entre as gramíneas, nesta época do ano. Atingimos o platô do Churriado quando o ponteiro do meu relógio atinge exatas 13:00. Decidimos então fazer outra parada, dessa feita, pra almoçar. Entretanto, preguiçosos, desistimos de acender o fogareiro e nos limitamos a comer a sobra dos fiambres.

Vou até a borda do Churriado, porém mal posso enxergar algo de seu interior, a cerração continua senhora do perau. Retomamos a caminhada e, um pouco mais adiante, enveredamos pela trilha dos Porcos. Sei lá por quê, pensei que o tal carreiro seria moleza. Qual o quê! É uma descida íngreme, estreita, escorregadia. Receio que a mochila pesada me faça rolar tal qual uma bola desgovernada ribanceira abaixo. Bah, nem pensar, comento preocupada com meus botões! Redobro, assim, os cuidados na descida, entretanto a paisagem trata de dar um chega pra lá em meus temores de mulher urbana.

Não há como não se envolver com a rica e variada flora que se sucede diante meus olhos: matas de araucária, pequenos trechos de floresta atlântica onde brotam grandes quantidades de xaxim, orquídeas e bromélias, sem faltar, inclusive, vegetação rupestre, destacando-se no terreno enormes urtigões, cujos caules espinhosos aninham em seu interior estupendas cachopas vermelhas. E tudo isso existe, aqui, nos campos de cima da serra! Após sete horas e meia de caminhada, enxergamos o capô vermelho do táxi do seu Denoir. Aleluia! não agüento mais caminhar.

Domingo, tiro pra descansar, minhas pernas e panturilhas estão deveras doloridas. Limito-me a uma breve caminhada até a casa de Kaloca pra devolver sua mochila, pouca coisa, 4 km entre ida e volta da pousada. O restante do dia fico só na conversa fiada com Maria, Paulo e João Paulo na cozinha.

Na segunda-feira, embora bem doída, não resisto e telefono pra Kaloca. Combinamos, então, fazer uma seqüência de seis rapéis. E lá vamos nós até o armazém do Louro, estabelecimento situado na beira da estrada da Serra do Faxinal. A primeira cachoeira, com 7 metros, à esquerda de quem sobe a serra, fica na frente do bolicho. Rapelamos sem grandes emoções a cascatinha, coisa pra criança. Cruzamos a estrada e descemos o leito do rio para então rapelarmos duas outras quedas, com 25 e 30 metros, fáceis demais ambas.

A quarta, a única com nome, chama-se cachoeira do CTG, assim chamada devido a um centro de tradições gaúchas, o Porteira do Faxinal, aquerenciado aos pés da colina onde a queda d´água se localiza. Apresenta de tudo um pouco: negativo, positivo, trechos na água, trechos no seco e um amplo platô quase em seu final. É tudo de bom essa cachoeira embora sua altura seja de 47 metros. Absolutamente deliciosa, sua descida é tranqüila. Adoro rapelá-la. Sucedem-lhe outras duas quedas, igualmente, gostosíssimas, medindo 25 e 15 metros. A única dificuldade é a subida até lá porque pra alcançá-las temos de subir uma encosta coberta de bananais bastante íngreme e tortuosa, tipo escalaminhada. Ainda bem que de vez em quando dá pra se agarrar nos putamerdas, raízes de árvores que servem de agarras.

Desço as duas últimas cachoeiras, cantarolando, feliz da vida. Terminados os rapéis, subimos uma colina bem inclinada que nos leva direto à pousada Colina da Serra. Despeço-me de Kaloca e vou pra cabana me alongar e tomar banho. Depois do almoço, vou com Maria dar uma banda em Praia Grande. Ela quer que eu conheça sua casa da cidade. Aproveito pra visitar um casal de amigos, seu Pedro e Emília. Conversamos um pouco e depois Maria me leva pra conhecer dois de seus irmãos. Após, vamos ao super onde ela compra mantimentos pra reabastecer a pousada. Terminado nosso périplo pela cidade, ardo pelo sossego da minha cabana. Chega de civilização ainda que esta nem ultrapasse 3.000 almas. Ando de um jeito tal que até essa quantidade de gente me soa demasiada. É, tou ficando meio misantropa, tenho de admitir.

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