Boris Korshunov: A lenda russa

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Por Rodrigo Granzotto Peron
Praticamente desconhecido no Ocidente, o alpinista Boris Korshunov é uma das grandes lendas do montanhismo russo e com uma história rica e repleta de fatos interessantes.
Nascido em 31 de agosto de 1935 em Moscou, Boris Korshunov graduou-se na High Aero School e trabalhou como engenheiro espacial para a Agência Espacial Federal Russa (hoje, Roscosmos), auxiliando na construção dos equipamentos que permitiram o histórico vôo de Yuri Gagarin, ao se tornar o primeiro homem no espaço. Boris recebeu uma homenagem em 2006 por seus serviços ao programa espacial russo.
Encantou-se pelo montanhismo nos anos 60 e foi, nas décadas seguintes, protagonista de inúmeras façanhas e histórias bizarras e divertidas.
EVEREST 1999: LOUCURA E INSANIDADE
Em entrevista para o site Russianclimb, quando perguntado se atingiu o cume do Everest, ele respondeu com toda sinceridade: “Eu não tenho a mínima ideia”.
A história é bastante estranha.
Ele resolveu atacar o cume sozinho, sem oxigênio engarrafado, na temporada de 1999, pelo flanco tibetano. Acima dos 8500 metros, devido à hipóxia, sua memória começou a falhar e ele alternou momentos de lucidez com períodos de total blackout mental.
Foi encontrado apagado dentro da tenda de outra equipe (da Geórgia), em péssimo estado, mas conseguiu, com ajuda, descer a montanha. Além disso, segundo relatos, foi flagrado uivando para a Lua e fazendo outras esquisitices sem sentido, tudo fruto da falta de oxigenação cerebral por vários dias a fio.
ANNAPURNA 2004: UM ERRO QUE DEU CERTO
Novamente sozinho e sem tanques de oxigênio, em 2004 ele tentou o Annapurna.
Devido a um erro seu de navegação, ele desviou da rota francesa regular e passou a escalar mais à esquerda, acabando por culminar o Annapurna Central (8.051m), por uma nova via, numa das raras ascensões a este difícil sub-pico do maciço do Annapurna, aos 69 anos de idade.
BARUNTSE 2004: NOVA ROTA
Na companhia de Simone Moro e Denis Urubko, Boris ajudou a forjar uma nova e dificílima rota direta no centro da Face Norte do Baruntse, uma das escaladas mais incríveis da Alta Ásia daquele ano. O russo foi fundamental para esta conquista, abrindo boa parte da rota e fixando cordas.
CHO OYU 2007: SEPTUAGENÁRIO NO CUME
Aos 72 anos de idade, Boris culminou, sem oxigênio extra, o Cho Oyu em 2007.
DHAULAGIRI 2008: À BEIRA DA MORTE
Reconhecido por preferir escalar solo, Boris tentou o cume do Dhaulagiri em 2008. Antes que ele pudesse atingir a segurança do Campo 3, anoiteceu, forçando-o a passar a noite sozinho, aos 7600 metros, ao relento, em meio a um frio intenso.
Naquela mesma ocasião, o top climber Denis Urubko tentava bater o recorde de velocidade de escalada do Dhaulagiri e encontrou de madrugada o alpinista russo desorientado e com muito frio. Denis abriu mão de sua tentativa de recorde e auxiliou o russo a descer em segurança.
MARATONA DO ELBRUS 2012
Mostrando estar em plena forma, Korshunov participou da Elbrus Race em 2012 (VII edição) e não apenas completou a prova, aos 77 anos de idade!, como o fez em 8º lugar geral, deixando vários alpinistas e maratonistas mais jovens para trás.
ELBRUS 2016
Em outra lição de longevidade no esporte e para aqueles que acham que estão muito velhos para o montanhismo, Boris aprontou de novo em 2016, ao culminar o Elbrus (5.642 m) pela 83ª vez!, aos 81 anos de idade!, e sob temperaturas congelantes de -50ºC.
PIK LENIN 2017
Em 2017, aos 82 anos, culminou o Pik Lenin (7134m) pela 25ª vez na carreira. Com isso, passou a ser o alpinista mais idoso a culminar qualquer montanha acima dos 7000 metros.
O MAIOR DOS SNOW LEOPARDS
Torna-se Snow Leopard (Leopardo das Neves) o alpinista que escala todas as cinco maiores montanhas do território da ex-União Soviética: Pik Communism 7495m; Pik Pobeda 7439m; Pik Lenin 7134m; Pik Korzhenevskaya 7105m; e Khan Tengri7010m.
Boris conhece essas montanhas como ninguém.
Escalou o Pik Lenin 25 vezes, o Khan Tengri 16 vezes, o Korzhenevskaya 13 vezes, o Pik Communism 12 vezes e o Pik Pobeda 9 vezes, totalizando 75 cumes nessas montanhas e resultando na finalização do Programa Leopardo das Neves por inacreditáveis 9x.
Além de tudo, tem ano a ano esculpido um legado de amor à montanha e a lição de que alpinismo não tem idade.
 por: Rodrigo Granzotto Peron
texto de: 26.7.2017


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Sobre o autor

Rodrigo Granzoto Peron é o mais importante historiador do montanhismo brasileiro. Ele coleta e compila informações de expedições a grandes montanhas contribuindo para a memória do montanhismo nacional. Já colaborou para diversos meios, como Revista Desnível, Explorer's Web e outros.

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