Neve no Rio de Janeiro?

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Você já viu neve nas Agulhas Negras? Não! Que pena, ela cai todos os anos lá, mas…


Aliás, não é apenas lá, na Pedra da Mina e nos picos adjacentes também. Apesar de nevar praticamente todos os anos nessas montanhas, ela não se acumula, derrete logo depois de cair porque geralmente a temperatura na superfície da rocha escura é mais alta que a temperatura do ar.

Outro fator é que a quantidade de neve raramente é grande o suficiente para acumular, o que ocorre excepcionalmente uma ou duas vezes por década. Às vezes pode acumular 15 cm como aconteceu em meados da década de 80, mas derrete em um ou dois dias.

Se a água lá encima congela nas poças e a geada é frequente no inverno, então por que não neva? Como alguns de meus alunos e colegas já me perguntaram. Para provar isto não é tão simples, desconheço equipamentos automáticos para presenciar e registrar os cristais de gelo (neve) nessas condições. Isto é, é preciso estar nas agulhas negras durante tempo ruim nas noites mais frias. A verdade é que nenhum pesquisador faz isto porque este tipo de dado não é relevante.

Entretanto, a qualquer inverno desses podemos ver acúmulo significativo de neve nas Agulhas Negras ou na Pedra da Mina, pode ser até neste inverno, ninguém sabe. Isto ocorre de forma cíclica que pode ser aproximadamente uma vez por década.

Por exemplo, em 1957, 1979 e 1996, a Serra Santa Catarina e a cidade de São Joaquim registrou acúmulo significativo de neve. O meteorologista Ronaldo Coutinho do Prado lembra que em 1957 o município catarinense ficou isolado durante cinco dias devido a dois (2) metros de neve acumulado!

Mas o grande problema é a falta de dados, certamente já tivemos grande acúmulo de neve na Serra da Mantiqueira, mas temos dados confiáveis apenas a partir de algumas décadas atrás. Para se ter uma idéia, antigamente os meteorologistas brasileiros confundiam geada com neve, para eles, tudo que caía aqui era geada!!

Como vocês são montanhistas cultos, sabem que geada é o congelamento do orvalho na superfície. Isto ocorre frequentemente em vastas áreas do Brasil, até na Bahia, como no Pico das Almas e no Pico do Barbado, como eu mesmo presenciei.

Dados paleoclimáticos de muitos trabalhos indicam que a 18.000 anos antes do presente, a temperatura média no Brasil era bem mais baixa e a umidade também era menor. Isto significa que naqueles tempos as montanhas mais altas do Sudeste e do Sul do Brasil deveriam ficar cobertas por neve durante breves períodos ao longo do inverno. Ou seja, a neve deveria ser pouca, mas era frequente.

Geleiras no Brasil??? A última vez que isto ocorreu foi a centenas de milhões de anos, foi quando o sul e o sudeste do Brasil (Gondwana na época) estavam muito próximos do pólo sul!! As placas tectônicas migraram para o norte. Isto podemos comprovar por causa de rochas típicas (tilitos) formadas em ambientes periglaciais. Em São Paulo existem grandes depósitos.

Então… Prepare seu equipamento de esqui ou snowboard, ou mesmo snowshoe e espere… Pode ser que neste inverno você possa usá-los no Brasil, mas pode ser também na próxima década ou daqui a 100 anos. Ninguém pode prever.

Texto: Antonio Paulo Faria
Fotos: Google Earth – Por Moacir Nunes de Castro

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Sobre o autor

Antonio Paulo escala há tanto tempo que parece que já nasceu escalando... 30 anos. Até o presente, abriu mais de 200 vias no Brasil e em alguns outros países. Ele gosta de escalar de tudo: blocos, vias esportivas, vias longas em montanhas, vias alpinas... Mas não gosta de artificiais, segundo ele "me parecem mais engenharia que escalar propriamente". Além disso, ele também gosta de esquiar, principalmente esqui alpino no qual pratica desde 1996. A escalada influenciou tanto sua minha vida que resolveu estudar geografia e geologia. Antonio Paulo se tornou doutor em 1996 e ensina em universidades desde 1992. Ele escreveu sobre escalada para muitas revistas nacionais e internacionais, capítulos de livros e inclusive um livro. Ou seja, ele vive a escalada.

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