Contudo, o sol nos minava cada vez mais, fritando nossos miolos! Parecia q o calor não vinha de cima e sim de baixo, principalmente qdo atravessávamos matacões de samambaias! Não víamos a hora de alcançarmos o fundo de algum vale, de preferência o do Rio Três Barras, q corria ruidosamente à nossa direita, ao longe! Dessa forma, a trilha prosseguiu sempre rumo sudeste, onde encontramos trocentas clareiras e áreas de acampamento (e muito lixo, infelizmente), mas depois virou levemente pra sudoeste, cada vez mais próxima do Rio Três Barras, q naquela altura era nosso “objeto do desejo” diante daquele calor dos infernos! Não demorou a desembocarmos num trilho calçado de pedras q ia no sentido desejado. Era o famoso “Caminhos dos Ambrósios” ou “Caminho das Tres Barras”, pois acompanhava o dito ribeirão ate sua foz! O mesmo me lembrou muito o “Itupava”(PR), a “Trilha do Ouro”(RJ) ou ate mesmo a ” Trilha Inca” pois é de uma largura regular (perto de 1,5 m) e com as pedras dispostas sob um arranjo ordenado! E de certa forma os Ambrósios tem algum parentesco com esta ultima, uma vez q é remanescente catarinense do “Caminho do Peabiru”, um trilho indígena q se dirigia ao Peru!
Divagações históricas a parte, logo o caminho desviou pra leste, evidentemente indo de encontro ao Monte Crista! Antes, porem, tomamos uma bifurcação obvia à direita q nos levaria ao Rio Três Barras! Dito e feito, não pensamos duas vezes e foi pra lá mesmo q fomos naquele calor infernal! A picada se transforma numa pirambeira se alternando entre vala erodida, degraus de pedra e lajotas escorregadias besuntadas de limo, em seu trecho final! Mas td isso teve seu prêmio qdo desembocamos, as 14:30, no riacho q tanto almejávamos! Poções, piscinas e cachus pra dar e vender eram a recompensa mais q merecida naquele dia! Com td isso a nossa disposição e donos absolutos daquele paraíso, encerramos nosso expediente ali mesmo, descansando e nos refrescando nas águas do Três Barras ate não poder mais!! E dessa forma passamos a tarde td ali, lógico!
Por volta das 17:30, vendo q algumas nuvens se adensavam no céu e a contragosto, retornamos afim de encontrar um local pra pernoitar, o q não foi difícil. Subimos novamente ate a bifurcação pro Monte Crista e logo adiante havia uma boa clareira protegida onde jogamos as coisas no chão, em definitivo, lá pela cota dos 835m! Apesar do horário o calor ainda era infernal e precisou o sol pousar atrás das montanhas pra finalmente termos uma temperatura mais amena.
Após montar as barracas preparamos uma janta coletiva, onde nosso chef Mamute cozinhou uma mistureba de td q tínhamos e q nunca esteve tão delicioso: um mix de miojo, yakissoba, calabreza, ervilhas, queijo e sei-la-mais-o-q!! Na seqüência, nos recolhemos a nossas respectivas barracas, mas o sono custou a vir em virtude do calor, inclusive à noite! Não bastasse ainda havia o inconveniente dos pernilongos, q fizeram um banquete conosco e só sossegaram qdo a madrugada tornou-se mais fresca! Entretanto, a madrugada fora agraciada por uma esplendida e maravilhosa lua cheia, q iluminou tds as montanhas , e campos , ao nosso redor!
NO ALTO DO MONTE CRISTA!
A manhã sgte raiou tal qual a anterior: com promessas de um dia de céu azul e estupidamente ensolarado! Por conta disso levantamos bem cedo afim de não pegar o calor abrasivo matinal e poder pernar num tempo mais agradável e ameno. Imediatamente nossas mochilas engoliram o equipo e nós, nacos de bolachas e bisnagas! Zarpamos então por volta das 7hrs, enxotados de nossa clareira por nuvens de pernilongos q protestavam nossa breve ocupação de seu habitat.
Tomando a picada sempre sentido leste, imediatamente caímos nos “Ambrosios” q por sua vez desceu por um tempo e mergulhou na mata de um pequeno vale, onde abastecemos os cantis num riachinho. Emergimos outra vez no aberto, agora subindo, descendo ou bordejando pequenos morrotes, ate finalmente alcançar uma crista principal. Foi aqui q topamos com nossa 3ª peçonhenta, q dormia folgadamente no meio da trilha! Ganhando altitude agora lentamente crista acima, agora através de uma picada-vala, não demorou a cair num belo mirante lajotado à beira de um enorme precipício! Claro q houve pausa pra cliques! Na seqüência caímos no selado recortado q nos separava do Crista, pra em seguida subir vigorosamente a inclinada piramba final, q exigiu bastante fôlego e pernas pra ser vencida!
E assim, as 8:30 alcançamos um trecho do alto dos 967m q assinalam topo do Monte Crista! A montanha mais conhecida de Joinville ganha este nome pq seu cume parece uma “crista de galo”, q por sua vez se esparrama escarpadamente ainda pra oeste! Entretanto, nos mantivemos apenas à parte leste dessa tal “crista”, q oferecia vistas soberbas da planície catarinense, com destaque pra Baia de Babitonga (em S Fco do Sul), de Guaratuba, da BR-101 e da Pedra Branca de Araraquara! O cume rochoso tb apresentava pequenas e providenciais clareiras, como também muito lixo e pixações, infelizmente! Agora entendi pq essa montanha é tida como “mística” e atrai td qto é farofeiro sem consciência alguma! Pausa pra descanso e beliscar alguma coisa ao sopé da “Pedra do Guardião”, uma curiosa formação rochosa q lembra qq outra coisa (fálica, principalmente) menos um “homem sentado”, como diz a lenda.
Não deu nem meia hora de relax q retomamos a pernada, agora descendo o Crista, onde de cara uma pequena placa laconicamente anunciava q teríamos sinuosos 7km pela frente! Da “Pedra do Guardião” a trilha embica fortemente a encosta abaixo ate nos despedirmos do aberto e mergulharmos num matagal de samambaias, q é vencido desescalaminhando lances de pedra, sulcos e algumas valas! Logo caímos novamente na trilha íngreme, desta vez ancorada por tabuas de madeira pra conter a erosão!
Mas uma vez na mata fechada não demora a cairmos em definitivo no ardiloso calçamento de pedras dos “Ambrósios”, cuja umidade o deixava liso feito sabão e não evitou q tds tivéssemos nossos respectivos capotes! Por conta disso a descida foi feita lentamente, com td cautela e cuidado, e não raramente descíamos pelas beiradas do caminho, próximo á mata, e não pelo seu miolo. Assim pudemos apreciar melhor os detalhes q nos cercavam, seja como a densa mata ao redor, as bicharadas q eventualmente cruzávamos, como simplesmente bebericar água fresca e cristalina, q esteve sempre presente na forma de bicas despencando da montanha!
Perdendo altitude rapidamente aos ziguezagues, cruzamos com as duas primeiras almas vivas da travessia, um pai suado levando o filho novo prum perrengue! A medida q íamos descendo, o calor abafado ia ficando cada vez mais quente, nos deixando ensopados num piscar de olhos! Da mesma forma, o numero de pernilongos ia aumentando e não nos davam sossego nem pra descansar, tanto q as paradas pra isto realmente foram poucas! E assim prosseguimos a pernada durante um bom tempo!
Após um breve trecho no aberto -mais precisamente um enorme deslizamento – q foi vencido contornando matacões de capim-navalha, mergulhamos outra vez na densa mata fechada, onde topamos com enormes clareiras, mais turistas, algumas bifurcações e uma cachu escondida, onde me dei o luxo de um banho-relâmpago! Tomando a bifurcação q sempre ia no sentido desejado, esbarramos com nossa 4ª cobra no meio da trilha, uma enorme e vistosa falsa-coral! A bichinha, no entanto, não estava afim de paparazzis e rapidamente enfiou-se na vegetação!
Após descer um tempo q pareceu interminável, alcançamos o fundo de um enorme vale na cota próxima dos 200m. A partir daqui a pernada perde o resto de altitude, alternando picada, valas, calçamento de pedras, mas principalmente brejos e charcos! Neste trecho quase horizontal esbarramos com nossa 5ª e ultima peçonhenta, uma enorme e lustrosa cobra preta! Meu!!! Vai ter cobra assim lá no Instituto Butantã! Portanto, qq pernada c/ vara-mato aqui no verão é impensável! Emergimos da mata 130m acima do nível do mar pra cair num belo gramado com restos de construções, as 13:30, e logo na seqüência cruzamos o manso e raso Rio Três Barras saltando de pedra em pedra. Como o sol e calor estavam de rachar, tivemos uma breve pausa pra tchibuns no belo ribeirão, q mais adiante entra em confluência com o Rio Crista!
Na outra margem, a picada dá lugar a uma estrada de terra q logo nos leva a uma ponte pênsil, onde o Três Barras é atravessado pela ultima vez! Estamos finalmente na “civilização”, isto é, o quiosque q dá acesso ao “Parque Aquático Monte Crista”, um balneário local bem freqüentado! No quiosque matamos nossa vontade de breja e refri, alem de conhecer seus donos, Seu Roberto e Seu Ari, q alem de boa prosa, lembranças e petiscos nos providenciaram tb um telefone pra contatar um taxi de Garuva pra nos resgatar! Ufaa, menos mal! Do contrario teríamos ainda q andar 3km ate o asfalto tentar condução, o q naquele calor de inicio de tarde era impensável!
Nos despedimos dos tiozinhos assim q o taxi chegou e imediatamente zarpamos pra Garuva, onde pegamos o nosso veiculo e rumamos prum restaurante no centro da cidade, onde matamos a vontade de nossas lombrigas, q exigiam um almoço mais consistente e saboroso! E assim, por meros R$10 comemos num self ate fazer bico, as 15hrs! Ato sgte rumamos pruma pousadinha baratinha próxima, “Hotel do Carmo”, a fim de relaxar do cansaço acumulado e à noite fomos numa pizzaria badalada da cidade pra bebemorar a empreitada, desta vez limpos e cheirosos. Choveu horrores durante td madrugada, mas assim q amanheceu tomamos o asfalto pra retornar pra Sampa a tempo de passar o réveillon com as respectivas famílias.
E assim transcorreu a Garuva-Monte Crista, uma travessia q guarda em suas encostas patrimônios naturais, paisagísticos e históricos q lhe conferem forte identidade, característica exclusiva apenas de poucas gdes e selvagens caminhadas. Seja caminhando no histórico “Caminho dos Ambrósios” em meio a exuberante Mata Atlântica, pode-se viajar no tempo e observar enorme biodiversidade, ou contemplando a beleza dos rios, campos de altitude, cachus e curiosas formações rochosas, assim como a majestosa vista q se descortina do alto dos Picos Garuva e Monte Crista. Reunindo historia e natureza, os Campos do Quiriri estarão sempre nos brindando com mais alguma nova e agradável surpresa ainda a ser desvendada, mas naturalmente esse é apenas mais um motivo pra retornar lá noutra ocasião. Outras muitas vezes, diga-se de passagem.
Obs: mais detalhes do “Caminho dos Ambrósios” no livro “Caminhos Coloniais da Serra do Mar“, do Julio Fiori.
Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos