Kilimajaro Parte 3: No vilarejo de Mochi.

0

Fomos recebidas pelo motorista do transporte, e levadas para o Hotel em Mochi. Já no caminho pudemos ver em destaque, ao longe, no plano relevo, aquela que seria nossa casa nos próximos dias. O Monte Kilimanjaro. E também pudemos observar pelo caminho, um pouco do povo do vilarejo e arredores, e seu modo de viver. Da África eu só conhecia o Egito, e já percebi a grande diferença entre este, que visitei anos antes numa viagem de mergulho, e a Tanzânia, a terra do Kilimanjaro. No Egito há pobreza, mas tentam escondê-la atrás de muros por onde os turistas circulam. Guaritas com soldados armados em muitas esquinas, prédios antigos, prédios novos. Já em Mochi, a falta de recursos na periferia que circunda o vilarejo é mais notada. Poucos turistas nas ruas, a grande maioria é de moradores da região.

 
Uma hora depois chegamos ao Hotel. Uma fortificação, com grandes muros e portão fechado, rodeada por casas mais humildes e terrenos com mata escassa. Atrás dos portões um agradável jardim, bancos, mesas e guarda-sóis, e a nossa espera, parecendo feliz com a chegada de todos os integrantes da expedição, nosso guia , Maximo, que rapidamente nos levou ao nosso quarto,  carregou nossas malas, e deu as orientações sobre o aquecimento do chuveiro, funcionamento da luz, e de como nos proteger dos pernilongos durante a noite com o ar condicionado no nível polo Norte. Noite de jantar com a equipe que agora estava completa. Éramos 6 clientes, 3 mulheres e 3 homens. Uns com outros cumes no histórico, outros com muitos trekkings, todos com muitas doações e vontade de se divertir subindo a montanha e conhecendo novas pessoas e a cultura local.
 
Como de costume no primeiro dia tivemos nossos equipamentos conferidos pelo guia, e aquilo que faltou alugamos no próprio Hotel. O hotel era um mundo a parte no vilarejo de Mochi. Afastado do movimento da cidade, as acomodações nos faziam parecer num filme. Quartos equipados com camas com telas anti mosquitos, um grande jardim com mesas e guarda-sóis onde no segundo dia da viagem colocamos todas as nossas doações e cuidadosamente separamos entre artigos de montanhas, roupas civis ( como Max chama as roupas do dia-a-dia ), roupas para crianças, homens e mulheres, sapatos. 
 
Entre as doações raridades como a calça que o Maximo próprio fez para suportar frio em grandes altitudes ( conta que não tinha como comprar das especializadas quando iniciou nas altas montanhas e o jeito foi fabricar ele mesmo as suas! ), mochilas que visitaram os himalaias e muitas montanhas nos andes com o nosso guia, botas, óculos escuros, tudo ainda aproveitável e de muita importância para o pessoal que ia receber. Ainda faltava a doação em dinheiro que só saberíamos quanto seria ao final da expedição. 
 
Arrumadas nossas doações, conferidos nossos equipamentos de montanha, hora de começar as atividades na montanha. Conhecemos a figura ilustre do “Teacher”, nosso guia líder local, o guia com mais experiência no Kilimanjaro. Uma pessoa de um sorriso cativante, calado, que no final da expedição mostrou como é possível fazer a diferença para quem precisa, mesmo quando não temos muito. É, além de guia, o fundador de uma escola para crianças do vilarejo, e de um orfanato onde cuida de crianças de diferentes idades, algumas em tratamento pelo vírus do HIV. Na escola e no orfanato as crianças estudam, e são alimentadas, vestidas e visitadas por pessoas como nós que vão para lá visitar a montanha, e quando tem a oportunidade e sorte de terem entre seus guias o “Teacher”, vão conhecer o Kilimanjaro Orphanage Center. 
 
Terceiro dia da expedição, hora de partir para a montanha. Além de Teacher e Maximo, fomos acompanhados por mais guias, cozinheiros e carregadores. Na entrada do parque nossos guias recolheram nossos passaportes e se encarregaram de fazer nossa identificação de entrada no Parque. O dia estava nublado, uma garoa caía, lembrei-me que esqueci a capa da mochila, que ganhei do Pedro Hauck numa travessia semanas antes em Curitiba. Saí dos portões do parque para procurar uma, havia muitos vendedores no portão, escolho uma, e os vendedores tensos se afastam da entrada, pois guardas, que rodeiam e vigiam as proximidades não permitem que eles abordem os turistas. Triste ver a cena, mas é assim a vida por lá. Comprei uma capa e retornei para junto dos meus companheiros de expedição. Havia montanhistas de várias partes do mundo. Um grande grupo de adolescentes americanos, com seus guias, foi assunto para nosso grupo. Chamou atenção, discutimos sobre o quão interessante é ver que em outros países os jovens já estão saindo pelo mundo para conhecer lugares que aqui no Brasil, alguns começam a visitar depois de estabelecidos em seus trabalhos e tendo já alguma independência financeira. Nosso grupo , por sua vez, chamou atenção de estudantes do vilarejo que visitavam o parque. Fomos atração, e um de nossos montanhistas foi solicitado para uma sessão de fotos com os estudantes locais enquanto aguardávamos nossa liberação para começar a caminhada.  Uma grande fila de estudantes se posicionou a espera de uma foto com nosso colega.
 
Entrada no parque autorizada, começa a nossa jornada rumo ao primeiro acampamento, Machame, o mesmo nome da rota que percorreríamos.
 
Compartilhar

Sobre o autor

Tatiana Batalha, natural de Mogi das Cruzes SP é médica ortopedista e montanhista, tenho escalado diversas montanhas como Aconcagua, Huayna Potosi, Acontango, Kilimanjaro e outras.

Deixe seu comentário