Após sua criação, o Parque esteve abandonado por dez anos. Naquele período, ele foi depredado por madeireiras e caçadores, que se tornaram mais ativos dada a ausência de vigilância. As comunidades à volta do Parque também exerceram uma ação predatória, pela caça, desmatamento e exploração do calcário.
Por estas razões, lá acabaram se tornando extintas espécies como veados, emas, tamanduás bandeira e tatus canastra. É surreal pensar que a criação de um parque tenha contribuído para o desaparecimento delas, cuja proteção deveria sempre ser um dos objetivos de qualquer unidade de conservação.
Cerca de dez anos depois de criado, o Parque passou a ser gerido por Niède Guidon. Esta enérgica arqueóloga dedicou sua vida à pesquisa dos antigos sítios rupestres lá existentes, vindo a revelar o mais importante patrimônio pré-histórico do Brasil. Para quem está acostumado ao desleixo dedicado à nossa natureza, é impressionante encontrar tanto cuidado, seja na sinalização, no atendimento, na conservação ou no manejo do Parque.
Ele possui quatro portarias, das quais as principais são as do Baixão da Pedra Furada e da Serra Vermelha. Calculo que apenas um terço da área total de 129 mil ha seja visitável. Nele foram catalogados quase mil sítios, sendo dois terços com inscrições rupestres, mais de cem dos quais abertos à visitação. Acho que visitei metade das trilhas do Parque.
Você verá que as pinturas são muito abundantes e interessantes, pertencendo a duas distintas tradições, que recuam de 3 a 12 mil anos, chamadas de Agreste e Nordeste. Restos de uma fogueira foram datados com 50 mil anos. Isto sugere que o homem poderia ter chegado à América pelo sul, antes daqueles que atravessaram ao norte o Estreito de Behring.
O relevo do Parque distribui-se entre as áreas planas e baixas das planícies, os aclives destas, chamados de baixões, e as chapadas dos topos das serras. Você notará que os cânions ou boqueirões possuem clima mais úmido e fresco, devido à proteção dos grandes penhascos em arenito, com desníveis de até 200 metros. Estes podem apresentar as usuais estrias avermelhadas ou então serem na rocha compacta dos conglomerados. A altitude é baixa, entre 300 e 600 metros.
A vegetação é muito expressiva, variando da caatinga arbustiva e arbórea às matas dos boqueirões. Nas úmidas bacias dos poços, chamados de caldeirões, você encontrará vegetação de gramíneas. Ao contrário, nas áreas rochosas das chapadas, aparecerão os cactos e as bromélias. É muito interessante como estes ambientes podem rapidamente variar, à medida que você sobe dos baixões para os lajeados.
A visitação ao Parque é sempre guiada, devido a seu acervo arqueológico. As trilhas têm fortes aclives, saindo de regiões baixas, passando por desfiladeiros e subindo aos topos planos dos penhascos. Não são percursos longos, mas tornam-se cansativos devido ao calor. Como o principal atrativo é a observação das tocas e paredes com pinturas rupestres, você avançará num ritmo bem lento.
No passado, esta era uma região úmida e povoada, o que explica a diversidade de sua ocupação durante milhares de anos e as belas representações de caça nas pinturas pré-históricas. Toda a população existente quando da colonização foi exterminada pelos homens brancos. Entretanto, a região é hoje semiárida, havendo ocorrência de até três anos sem chuva, sem nenhum rio perene.
A fauna tem um número restrito de espécies, dada a severidade do ambiente. Há poucos mamíferos (mocós, pacas, guaribas), mas morcegos, répteis e aves são abundantes. Devido ao calor, muitos dos animais costumam ter hábitos crepusculares ou noturnos, alguns chegando a ser hibernais.
Mas a Serra da Capivara é também conhecida como um dos últimos redutos da onça pintada, o maior e mais feroz dos felinos das Américas. Aplicando técnicas usadas na Índia para o estudo da pelagem dos tigres, foram identificados 35 adultos circulando na área. Mas não ouvi nenhum relato de avistamento destes belos animais pelos visitantes.