A tal Península Kamchatka e seus vulcões

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Tempo livre para um montanhista significa ir sempre à montanha. Tempo livre para um montanhista duro significa ficar na internet pesquisando montanhas, aumentando seus sonhos. Fomentando meus sonhos descobri este lugar incrível e escrevo um pouco sobre ele.


A Península Kamchatka é uma enorme língua de terra de 1.200 kms que desce a leste do Mar de Okhotsk, possui clima severo com grande incidência de chuvas, nevascas e neblina durante grande parte do ano, além disso uma peculiaridade: Mais de cem vulcões dentro dos 270.000 quilômetros quadrados da península dos quais cerca de uma dúzia estão em atividade com fumarolas visíveis.

As maiores cidades da península são Petropavlovsk-Kamchatsky (200.000 habitantes), Yelizovo (42.000 habitantes), Vilyuchinsk (25.000 habitantes), Aldeia Palana (24.000 habitantes) e Klyuchi (7.000 habitantes).

A grande quantidade de vulcões e atividades sísmicas se deve ao fato de que a península está sobre o encontro de duas grandes placas tectônicas: A sul a placa do Pacífico, e ao norte a placa norte americana, ainda mais representativa em tamanho. O encontro destas duas enormes placas é justamente ao sul da península, tornando-a limite norte da Placa do Pacífico.

Este lugar fantástico de mil e uma cores abriga vasta vida animal e vegetal, sobretudo ursos marrons, muito comuns lá. São conhecidos por serem de tamanho assustador, porém pacíficos. Entretanto, o comportamento do animal já é muito popular em qualquer lugar do mundo, curiosidade é sua principal característica. Por este motivo, ao entrar no parque da península para fazer trekking ou montanhismo, um aviso é repetidamente dado: Esconder muito bem sua comida e nunca deixar nenhum resto por perto, pois existe a possibilidade de um encontro traumático com um urso faminto. É normal encontrar também no parque marmotas, lobos e raposas.

A regulamentação e controle de visitas e permissões fica a cargo de dois grandes parques, um deles é o Parque Natural Nalychevo (309.000 hectares), fundado em Agosto de 1995 e adicionado à lista de patrimônio mundial da UNESCO em 1996.

Diversas atividades podem ser feitas no parque: Ascenções a vulcões (ativos ou não), ski, trekkings curtos ou longos, travessias, ski com cachorros na neve, até mesmo visitação a geysers e águas termais (O vale dos geysers do parque é a segunda maior concentração de geysers do mundo, várias agências fazem um tour específico para o local).

Avachinsky, outro bonito vulcão de 2.741 metros de altitude pode ser visitado no parque. Juntamente de seu vizinho um pouco maior chamado Koryaksky de 3.456 metros, foram considerados “vulcões da década”, uma vez que ambos estão ativos (última erupção de Avachinsky – 2001; última erupção Koryaksky – 2009) e ficam próximos ao centro administrativo da península. O estudo busca prever e evitar grandes devastações em concentrações urbanas próximas a vulcões ativos.

O outro parque que administra espaço físico ainda maior de 376.000 hectares, se chama Kliuchevskoy  e foi criado em 1.999. Lá encontra-se a grande estrela da península, o imponente vulcão Klyuchevskaya Sopka de 4.835 metros de altitude, um estratovulcão ativo com constantes fumarolas saindo de sua cratera de 700 metros de diâmetro. O vulcão faz parte do Círculo de Fogo do Pacífico e é o ponto mais alto de toda a península. A paisagem do vulcão perfeitamente cônico lembra muito o vulcão Licancabur (fronteira Bolivia – Chile).

O vulcão é considerado o maior vulcão ativo de toda Eurasia, uma vez que o vulcão Damavand (5.610m – Maior montanha iraniana!) não vem mostrando nenhuma atividade recente além de fumarolas ocasionais. Já o Klyuchevskaya constantemente causa pequenos abalos sísmicos e erupções (última em 2005).

Mas a paisagem não é exclusiva do Klyuchevskaya, outros belíssimos vulcões nas proximidades também são alvo de expedições buscando suas crateras, o vulcão Ostry Tolbachik e o Plosky Tolbachik. Suas altitudes são respectivamente 3.682 metros e 3.085 metros. O menor, Plosky Tolbachik, é ativo, e sua cratera é colossal, nada mais nada menos que 3 quilômetros de diâmetro. Na verdade os dois fazem parte do mesmo complexo vulcânico, mas possuem nomes diferentes.

Em ambos parque é fácil encontrar rios repletos de salmão selvagem. Algumas variações de espécies de salmões são endêmicas da península. A pesca é permitida, porém controlada. A abundância de água e o solo vulcânico fértil favorecem à vegetação herbácea, que em apenas uma temporada de chuvas pode atingir 2,5 metros de altura, cobrindo algumas trilhas e dificultando a orientação visual.

Uma bela floresta com diferenciais pinta o solo das altitudes menores, dentro dos vales (altitude de 600 a 800 metros), a floresta tem o nome de Stone Birch (tipo de madeira das árvores). Como o vale sofre constantes tempestades de neve, muita se acumula nas árvores provocando peso. Isso faz com que não haja árvores com tronco perfeitamente reto, todas exibem os mais variados formatos retorcidos. A expectativa de vida destas árvores varia de sensacionais 500 a 600 anos.

“Hotspots” da península e seus parques:

Dentro do parque, Avachinksy e Koryaksky são continuamente procurados para sky e não ascenções. Ocorrem, porém são poucas e não registradas. Alojamento é facilmente encontrado dentro e fora do parque, bem como lojas para aluguel e compra de equipamentos. Em temporada os vulcões ficam repletos de turistas, na sua grande maioria, europeus e orientais. Poucos norte-americanos e sul-americanos passam por lá por motivos óbvios, distância.

Para os que gostam de uma atividade mais extrema, dois pequenos vulcões, Maly Semiachik e Karymsky, que passam por pouco a barreira dos 1.500 metros, só são acessíveis através de uma caminhada de vários dias de pura solidão dentro do Parque Nalychevo, porém o cenário promete arrancar suspiros. A trilha é muito bem marcada, mas é indicado contratar um dia ou se informar bastante para este trajeto, de preferência contanto com um GPS para orientação.

A Caldera Uzon: Este lugar incrível talvez seja a maior diversidade de cores em um só espaço físico, um verdadeiro arco-íris. Trata-se de uma planície de 10 km de diâmetro (uma caldeira) que contém águas termais, geysers, piscinas termais de lama, e muita vegetação, única coisa que sobrou de um vulcão após uma série de explosões que destruiram por completo a montanha. A visitação é complicada porque o local é de difícil acesso, além disso, é preciso um permisso individual para visitação. Este permisso pode ser processado por uma agência de turismo que não lhe permitirá mais que uma curta caminhada para contemplação do local, que fica próximo ao vale dos geysers. Para lugares distantes como a caldeira, o serviço de helicóptero pode ser contratado fora dos limites do parque, o preço é cobrado por hora e é ideal um número mínimo de pessoas para dividir o custo do “passeio”.

As estonteantes cores da Caldera Uzon. Foto: englishrussia.com

O lago Kuril: Um enorme lago de 77km², com profundidade aproximada média de 180 metros e máxima de 300 metros, repleto de salmões. Um lugar perfeito para foto e observação do vulcão Ilinsky. O local é perfeito para observação também dos ursos, que param no lago para sua pescaria de salmões.

O lago Kuril com o Ilinsky ao fundo. Foto:
summitpost.

Conhecer lugares novos sempre é um diferencial na carreira de um montanhista por vários motivos: exclusividade em seu país por visitar estes lugares inóspitos, que pode trazer reconhecimento de uma primeira ascenção ou abertura de rota; preenchimento da lacuna aberta previamente pelo desejo de estar lá, ou seja, realização pessoal; intercâmbio cultural com povos de outros países distantes, o que é por essência um dos fatores que atrai os montanhistas a outras montanhas que não as de sua pátria. Porém o fator que eu considero um bocado importante, que é desconhecido pela grande maioria de pessoas é que, a soma de todos estes fatores resultam em um ítem vital para o próprio bem estar do ser humano enquanto indivíduo: Felicidade. Um bom momento de felicidade, que pode variar de algumas horas a semanas ou anos dentro de um espaço temporal, pode proporcionar a este indivíduo tamanho bem estar, que é capaz de reverter estes sentimentos bons em saúde física. Pois é, sentir-se bem e realizar sonhos é saudável e proporciona saúde. Grande parte das enfermidades que acometem nós, seres humanos, têm sua origem em problemas psicológicos ou são agravados por eles. Dificuldades no lar, insegurança de relacionamentos, vida financeira, trânsito das grandes cidades, desavenças na família, tudo isso corrobora para “N” problemas de saúde, dentre eles os mais comuns são gastrite, úlcera e enxaquecas.

Já parou pra pensar nisso? Não? Então arranje um tempo e vá praticar uma atividade física que te agrada. A saúde te espera.

A Península Kamchatka é muito longe, mas vale pelo menos um mês de férias inteirinhos lá dentro. A vida é muito curta, desfrute!

Fontes de pesquisa: www.summitpost.org, Wikipedia, www. englishrussia.com

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Sobre o autor

Parofes, Paulo Roberto Felipe Schmidt (In Memorian) era nascido no Rio, mas morava em São Paulo desde 2007, Historiador por formação. Praticava montanhismo há 8 anos e sua predileção é por montanhas nacionais e montanhas de altitude pouco visitadas, remotas e de difícil acesso. A maior experiência é em montanhas de 5000 metros a 6000 metros nos andes atacameños, norte do Chile, cuja ascensão é realizada por trekking de altitude. Dentre as conquistas pessoais se destaca a primeira escalada brasileira ao vulcão Aucanquilcha de 6.176 metros e a primeira escalada brasileira em solitário do vulcão ativo San Pedro de 6.145 metros, próximo a vila de Ollague. Também se destaca a escalada do vulcão Licancabur de 5.920 metros e vulcão Sairecabur de 6000 metros. Parofes nos deixou no dia 10 de maio de 2014.

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