Cachu da Torre: A Grande Queda do Perequê

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A Cachoeira da Torre é daqueles programas q quase ninguém conhece por duas razoes: escassez de infos e, principalmente, por suas restrições de acesso. Primeira grande queda do Rio Perequê no planalto em seu acidentado trajeto rumo à baixada santista, localiza-se nos domínios do &ldquo,Polo Ecoturistico Caminhos do Mar&ldquo,, distrito periférico de SBC. Seu acesso é em tese proibido podendo ser eventualmente liberado mediante alguma burocracia p/ grupos guiados pré-agendados, a outra forma é meter as caras na portaria, contar com a sorte, alguma conversa fiada ou se valer de &ldquo,caminhos alternativos&ldquo,. Dessa forma, fizemos um bate-volta relativamente tranqüilo neste novo atrativo pouco conhecido nos arredores de SP, q alem de nos surpreender com uma das maiores cachoeiras do estado, vislumbra novas possibilidades de caminhadas e travessias neste rincão &ldquo,proibido&ldquo, da Serra do Mar paulistana.


O dia estava totalmente desfavorável pra qq espécie de passeio e mto mais propicio a nos prender às cobertas. Entretanto, nem mesmo o leve friozinho e garoa fina da madruga de sexta nos desestimulou à empreitada reservada àquele dia. Assim, entre um bocejo e outro encontrei o Nando no Term. Metrop. do Jabaquara, as 7:30, onde tomamos o busão pra Ferrazópolis meia hr depois. A viagem atravessa a cidade e parece interminável, com paradas consecutivas nos terminais de Diadema, Piraporinha e São Bernardo, até finalmente darmos no nosso destino, as 9hrs, município q pode ser considerado um “pré-fim-do-mundo”! Ali encontramos o Ronaldo e nos dirigimos noutro ponto a fim de aguardar outro busão q nos levaria de fato aos limites de SBC, um tal de “31- Paço/Alto da Serra”. O q não contávamos é q o dito cujo passa em apenas 4 horários com pontualidade nada britânica, nos obrigando a nova interminável espera no pto, espremidos com os nativos pra não receber respingos da chuva q lá tb caia com intensidade.

Embarcamos, enfim,&nbsp, as 10:15, já nos informando com o cobrador dos horários de retorno pra poder programar nossa volta sem maiores correrias. Esta viagem é no mínimo pitoresca, pois num momento vc se encontra no centro acizentado e frio da cidade, mas num piscar de olhos – principalmente após tomar a Via Anchieta em direção à Represa Billings – a paisagem muda radicalmente! O cinza dá lugar ao verde intenso da vegetação serrana salpicado do lilás das quaresmeiras refletido no espelho-dágua da represa, conferindo à viagem um charme especial! Passamos pelo centro de Riacho Grande, q mais parece um vilarejo do interior do Missisipi com suas trocentas lojas de pescaria e restaurantes flutuantes, pra depois atravessar uma planície totalmente reta, tendo água de ambos lados pontuada por varias ilhas verdejantes.

Alias, o nível da represa estava bem elevada em função do excesso de chuvas deste mês de janeiro. Saltamos do busunga as 11hrs, em frente à cancela-portal do “Polo Ecoturistico Caminhos do Mar”, onde um guardinha já veio em nossa direção, mas ate lá já tínhamos nosso discurso pronto na ponta da língua! Argumentamos q não éramos agencia e q íamos fazer um trabalho de limpeza/catalogo de trilha, deixando claro q não iríamos pra “Calçada do Lorena” e mto menos descer pela “Estrada Velha de Santos”, o q de fato é proibido. O jovem guarda nos mediu com desconfiança da cabeça ao pés, mas o q corroborou nosso discurso foi qdo o Nando apresentou-lhe sua carteira de guia da Embratur! Na verdade, o acesso é proibido pq no geral grupos vão lá dentro pra “farofar” ou fumar “umzinho”, o q pode trazer problemas aos guardas. Mas se vc argumentar com alguma seriedade de suas verdadeiras intenções de visitação, provavelmente liberem a entrada. Na verdade é questão de sorte ou do ânimo dos mesmos. Mas uma coisa é certa: grupos com mais de 5 pessoas são terminantemente barrados! Não era nosso caso, mas se tivéssemos tido problemas já tínhamos em mente outro “caminho alternativo” q nos consumiria algo de 40min a mais do total, contornando a represa.

Adentramos apressadamente pela guarita antes q o guardinha mudasse de idéia a nosso respeito e sumimos da vista dele numa curva no asfalto, tomando um amplo espaço à esquerda com jeitão de ter sido um estacionamento. Indo ao final dele, no canto esquerdo, uma discreta entrada na mata nos leva planície adentro, com sentido tendendo pra leste. Não tem erro, a picada é larga, plana e inconfundível, com jeitão q já fora antigamente uma estrada de manutenção, há mto tempo em desuso e já erodida pelo tempo. Alternando seu chão com areia, terra e pequenas pedras, a vereda se encontra principalmente tomada por brejo e charcos em virtude das chuvas, e logo nossos pés já não escapam de sair secos no trajeto. A chuva havia dado uma trégua limitando-se apenas a leves respingos q fustigam nosso rosto de forma agradável. Por sua vez, o vento soprava do continente permitindo um belo visual da região, uma vez q o panorama recorrente é da mais pura neblina.

Meia hora depois e após passar por baixo de torres de alta tensão, ignoramos uma saída à direita tomada pela água (q leva à “Calçada do Lorena”) e mais adiante, numa bifurcação, deixamos de lado a trilha da direita (q desce a serra até o vale do Perequê, já em Cubatão) em favor da picada da esquerda, q acompanha a abaulada borda da serra a certa distancia, em suave sobe e desce em meio à vegetação arbustiva.

Contudo, 1 hr depois seguindo aquele mesmo compasso a picada envereda com alguma declividade em meio à mata mais densa, e se espreme através de uma vala terrivelmente erodida e escorregadia, q demanda cautela e firmeza das mãos em qq apoio à disposição. Porem, depois de cruzar um pequeno córrego novamente subimos ate emergir no aberto. Este processo de sobe-desce se repete inúmeras vezes, cada vez mais exigindo cuidado em função do piso escorregadio, composto principalmente de um barro duro e amarelado recoberto por um musgo verde, visguento e liso feito sabão! Aqui o jeito é seguir pela mata rente a trilha, principalmente nas descidas, q cada vez parecem tornar-se mais íngremes.

Vários sobe-desce-piramba depois cruzando pequenos córregos no caminho, alcançamos uma beirada de serra q permite um belo visual numa fresta da mata q serve de mirante, com ampla vista da fumegante Cubatão e dos vários canais q serpenteiam Santos. A partir dali a trilha desce de vez, onde já podemos ouvir um gde curso d´água nas proximidades assim como temos contato visual com a torre de alta tensão q nomina a cachu. A picada desce numa íngreme piramba e, na bifurcação, tomamos à esquerda, descendo mais e mais pro fundo vale ao nosso lado.

Assim, as 12:30 desembocamos num pequeno afluente do Perequê, o Rio das Pedras, q acompanhamos por pouco tempo de ambas margens ate cair finalmente no gde e imponente Rio Perequê, q aqui deixa de ser calmo pra se espremer furiosamente entre gdes paredões rochosos numa espécie de cânion. Continuando cautelosamente por cima das pedras rente o rio, as vezes adentrando na mata nos trechos mais verticais, num piscar de olhos a vista se amplia e os horizontes serranos se abrem, a exatos 700m de altitude. Estamos no alto da Cachu da Torre, local onde o Rio Perequê deixa o planalto numa queda impressionante de mais de 150m verticais, divididos em varias quedas de níveis menores, pra depois serpentear o acidentado fundo do vale, ao sopé de imponentes montanhas forradas de verde q compõem os contrafortes da Serra de Cubatão!!

A queda é a primeira (de 17, ao todo) do Rio Perequê e lembra muito a Cachu da Fumaça (aquela entre RG da Serra e Paranapiacaba) porém esta ganha em vários outros requisitos, alem da altura! Com muito mais volume de água, o topo da cachu esta repleto de poções enormes, represados ideais pra um bom banho! Pausa pra fotos e um breve descanso nas escorregadias lajotas da margem direita do rio, um pouco abaixo das enormes fundações de concreto q servem de apoio à torre de alta tensão, q alem de nominar à cachu serve de sentinela à mesma!

Na seqüência, já com a chuva ameaçando engrossar, resolvemos subir o rio por um tempo afim de explorar algum bom remanso pra relax. E assim nossa pernada tem continuidade através das pedras da margem esquerda do rio, q aqui marulha manso e plácido, à diferença da proximidade com sua queda maior. Não demoramos a encontrar um rabicho de trilha q facilita o avanço através de uma íngreme encosta, numa das curvas do rio. Caminhando em nível, não demora a nos vemos subindo pela encosta com gde declividade pra depois dar no outro lado de um morro, descendo a piramba da mesma maneira, isto é, nos segurando no q tiver ao alcance. Mas uma vez do lado do rio, a picada nos leva a um belo local de acampamento, marcado por uma pequena clareira, um gramado bem fofo, uma bela prainha fluvial ao lado de enormes e convidativos poções represados pelo leito do rio.

Um lugar digno de nota e tinha ate uma corda amarrada numa arvore, q provavelmente serve de trampolim! O Ronaldo me contou q antigamente ali o pessoal batia cartão, mas q depois q vieram as restrições de acesso e são poucos os freqüentadores mais ousados q costumam pernoitar ali. Pausa pra beliscar alguma coisa, tchibuns e descanso, ainda mais com o tempo desta vez ameaçando limpar! Aqui tb reparei q a trilha aparenta acompanhar o rio acima. Pra onde irá essa picada? E descer o rio pela cachu, seria possível? Bem, são missões pra outras ocasiões, pq por ora ter chegado ate ali já tava de bom tamanho.

Atentanto sempre pro horário q o bus supostamente passava pelo asfalto, as 15hrs começamos a retornar, no mesmo instante em q um espesso nevoeiro baixou e conferiu ao lugar um quê de místico! Mas claro q antes disso nos permitimos mais um breve e ultimo tchibum nos poções represados entre os paredões próximos do alto da cachu. Donos absolutos do lugar, não me furtei de nadar como “vim ao mundo”, apenas pra sentir a água tinindo de gelada nas partes baixas! “Putaqueopariu, q friiio! Meu biláu recolheu-se por inteiro e agora não presta continência nem por ordens expressas do alto comando!”, gritei tirando onda. “É, tô vendo!”, emendou Ronaldo, demonstrando q prestava atenção a mais coisas além da natureza à nossa volta. Nando, por sua vez, só dava risada de td isso enqto fumegava seu Malboro q teimava em não acender por estar bem úmido.

As 15:40 iniciamos de fato a nossa volta, nos despedindo daquele belo e incrível lugar, já prometendo breve retorno. Por incrível q pareça, a volta fora muito mais rápida q a ida, mesmo com a lentidão dos trechos pirambeiros-escorregadios. E assim alcançamos a entrada do parque no asfalto um pouco antes das 17hrs. A guarita estava vazia, e ali mesmo nos prostramos a espera do busão, no mesmo instante em q a chuva voltou com alguma intensidade. O bus (“31-Rudge Ramos”) passou apenas uma hora depois, pra pegar transito em virtude de deslizamentos na estrada pra Ribeirão Pires. Nesse ínterim, paramos em Riacho Gde pra beber alguma coisa e depois em Ferrazópolis, pra dar continuidade à bebedeira. Resumindo: só cheguei em casa por volta das 23:30!

E assim transcorreu nossa primeira incursão à essa “lenda urbana” chamada “Cachu da Torre”, q de lenda não tem nada a não ser as verdadeiras restrições ao seu acesso. Primeira incursão de muitas q virão, o local esta repleto de possibilidades q fizeram minha cabeça logo de cara, tal como a subida do Perequê, a descida total do mesmo ate Cubatão ou até uma pernada de crista até Paranapiacaba, entre muitas outros programas q a criatividade alentar. Claro q são programas q requerem planejamento e, principalmente, logística apurada, mas q são inteiramente viáveis. Quem sabe assim, com visitação consciente e com alguma divulgação maior, este pequeno “paraíso proibido” da Serra do Mar paulistana tenha seus portões de fato abertos definitivamente, sem necessidade de qq subterfúgio pra fazer valer nosso direito de ir e vir. Mesmo q ele se trate de uma pura e simplória pernada no mato.

texto e fotos: Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/antigo/l_trek.html
http://jorgebeer.multiply.com/photos

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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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