Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 3º e 4º dia

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3º DIA – DO LUXO DA PRAIA DO FORTE À RÚSTICA STO ANTONIO – Levantei antes do sol emergir no horizonte e parti por volta das 5:30, sentindo algumas dores musculares nas pernas, assim como um pouco queimado. A maré não tava tão baixa assim e normalmente sempre as primeiras hrs da manha eram razoavelmente difíceis de andar: numa faixa semi-estreita e misto de areia firme e fofa, q no decorrer da manha ia se alargando cada vez +. Ainda sim, o frescor daquele inicio de dia era bem + estimulante q o sol escaldante da tarde. A praia estava deserta, o sol saia timidamente porem razoavelmente encoberto, e não havia vento algum. Os coqueiros se sucedem no mesmo compasso q as poucas habitações, todas desertas, onde apenas siris e quero-queros reclamam da minha presença.


As 7hrs (e quase 12km, desde Guarajuba) chego ate mais um rio q marca o final de Itacimirim, é o Rio Pojuca, relativamente grande e fundo, limite da Estrada do Coco c/ a Linha Verde. Ele serpenteia um bom trecho de mangue, rio adentro. Sem barqueiro de plantão, frustrado, acabo tendo q esperar alguém dar as caras e aguardo sentado num dos vários rústicos quiosques q beiram o rio. Um pescador q ali passava (q se dizia chamar ´Zéu-Seis-Dedos´ devido à visível polidactilia na mão direita) me disse q teria q aguardar os quiosques de pitu abrirem pois os donos sempre chegavam de bote, vindos rio acima. E lá fico eu, prostrado durante quase 1hr!

Aos poucos os quiosques vão abrindo mas nem sinal de barco algum. Aí q uns moleques me dizem q a maré havia baixado e q era possível chegar na outra margem. Bem, deixei eles irem na frente e fui atrás, s/ mochila, claro, afim de testar a profundidade. De fato, dava pra atravessar e fui buscar a mochila. Lentamente, c/ a mochila (quase 13kg) na cabeça e água ate o peito, atravessei o dito cujo cautelosamente pra não tropeçar num banco fundo de areia. E tateando bem o chão e indo de contra uma leve corrente, cheguei ate a outra margem!
Novamente na praia, já c/ sol forte batendo no rosto, retomo a caminhada pela areia neste q deve ser o inicio da Praia do Forte, bem deserta por sinal! Aqui se anda em chão amplo e firme o resto do dia, os coqueirais perfilam-se charmosamente e na areia as varetinhas do TAMAR são uma constante! A medida q me aproximo do Farol (ou Forte, q nomina o local) Garcia D´Ávila, as pessoas vão surgindo, assim como casas, jangadas de passeio, hotéis e quiosques padronizados, enfim, muvuca.

A maré baixou consideravelmente e uma barreira enorme de arrecifes formam piscinas naturais de cor esmeralda em todo o percurso, onde crianças se esbaldam juntamente c/ pescadores q procuram moluscos em meio aos corais, são os chamados ´Papa-Gente´. Atravesso o Rio das Moças, bem rasinho. E as 10hrs me encontro no centrão da Praia do Forte, a ´Polinésia Brasileira´, onde turistas de toda espécie circulam tanto pela praia como pela vila, onde as casinhas rústicas dos locais tornaram-se lojas (de artesanatos, souvenirs, etc) em meio à visível urbanização c/ muitos loteamentos e ate sofisticados resorts e restaurantes. Logo atrás esta a Reserva de Sapiranga. Enfim, um pólo de turismo internacional.

Ainda caminhando pela areia grossa, após a ponta do Farol, estou na Praia do Leste, ao lado da base-mãe do Projeto TAMAR, onde uma espécie de Simba-Safari de bichos marinhos é ate bem interessante! Logo, após umas 3 pequenas enseadas seguidas, as praias voltam a ser selvagens e desertas. A paisagem é idílica: sol forte, céu limpo e azul, com as ondas fortes quebrando atrás das piscinas de tons verde turquesa de corais!

Logo começa uma enorme praia reta interminável, q deve corresponder ao ultimo trecho dos 13km q contabilizam a Praia do Forte. A caminhada – de chinelo, pra não esfolar o pé – pela areia clara e firme é cansativa neste horário e minha preocupação se volta pra água q disponho, q vai lentamente diminuindo devido ao forte sol do meio-dia. A monotonia se instala e procuro andar olhando pro chão, pros siris ou pros coqueiros, pra não ver o quanto falta a minha frente. Neste trecho cruzo apenas com 4 pescadores solitários, reclamando q o mar bravio os impede de fisgar arraia e xereu..

As 12:30, e muito cansado, cruzo o raso Rio Barroso e chego na bela Praia de Imbassaí, c/ muvuca similar a da Praia do Forte, porem o ambiente é muito + rústico e original. A praia é extensa, separada do continente pelo manso Rio Imbassai (em tupi, ´caminho do rio´), q corre paralelo à orla toda a parte central da praia, formando uma pequena península de areia claríssima onde se concentram todos os quiosques lado a lado. As barracas colocam as cadeiras e espreguiçadeiras em ambos os lados, ora do lado da praia ora do rio. Num dos quiosques estaciono e mando ver 2 geladas! O cardápio é farto: caldo de sururu, pititinga, agulhinha, moqueca dourada, badejo, e drinkes a base de pinga, caipiroska, siringueroska, mangabaroska, etc.., mas me contento c/ uma porção de aipim (mandioca) frita e carne de sol, enquanto troco idéia com o ´barman´. Me diz q a ´vila´ de Imbassai não tem quarteirões nem centro organizados, tampouco rua a beira-mar, apenas os quiosques e as pousadas, alem do rio.

Apesar de charmoso e simpático ate, o local estava fervilhando de gente, e decididamente não era ali q iria pernoitar. Fui tomar um banho de rio pra me refrescar e apenas constatar q a água escura era um pouco salobra, isto é, intragável! Comecei a me preocupar com meu estoque da dita cuja. De acordo com as informações do cara, Sto Antonio era a próxima vila, a quase 6km dali, e foi pra lá q rumei após merecido descanso pós-banho. A areia fervia de quente e chegava ate ofuscar a vista de tão clara q é, ainda + naquele horário. E assim novamente me vejo numa enorme praia deserta, ornada de coqueiros q + parecem sentinelas permanentes daquela bela região, s/ nenhuma alma a vista, onde o vento e a maresia disfarçam o calor do sol a pino, tornando a coloração do mar estupidamente azul!

As 16hrs chego no primeiro sinal de vida de Sto Antonio, a Praia do Diogo, onde um único quiosque, rústico e simples, serve p/ q estacione definitivamente. Tomo + um ´energético de cevada´ e mando ver uma porção de pititinga, farofa e salada, além de repor meu estoque de água. A faixa de areia vai se estreitando e os corais a muito foram cobertos pelo mar, sinal q a maré sobe rapidamente. Sentado comodamente no quiosque, posso ver a ponta q terei de andar amanhã, onde as belas construções da Costa do Sauípe se misturam nos coqueirais rente a praia, a meros 8km dali.

Uma trilha de areia fofa adentra uma enorme duna ornada de coqueiros q separa a vila da praia, e logo estou numa extensa faixa de restinga salpicada de pequenos arbustos, pé-de-manga e coqueirais onde uma tímida e pequena vila parece estar mais escondida do q estabelecida propriamente dita. Sto Antonio foi uma enorme e agradável surpresa! Se tivesse + tempo certamente ficava ali uma semana!! Em contraponto à P. Forte e Imbassaí, esta vila é um charme só: criada recentemente, aqui se resume a um punhado de casinhas locais bem simples, um restaurante pra lá de rústico, uma lojinha de artesanias e uma única pousadinha, q basicamente se concentram no q deve ser a ´praça´ central, onde todas as ruas são de areia, e os carros só chegam por uma imperceptível ´estrada de chão´ (como eles chamam estrada de terra) pela Linha Verde. No meio da ´praça´ havia um chuveiro comunitário q lavou a alma deste q vos fala. O movimento se resume aos locais, já q não vi turista nenhum!

Como havia espaço de sobra, armei a barraca perto da duna e da praia, próximo da barraca de outros dois jovens casais, provavelmente ripongas ´snowboarders´. Aqui tive q me chinelar pois na areia haviam alguns matinhos espinhentos, mas o local era perfeito e sossegado, protegido do vento pelas dunas, e do sol pelos coqueiros! Conversei um pouco c/ um jovem morador q me recomendou conhecer as dunas interiores e o rio, vila adentro. E foi o q fiz. O cara já me confundiu c/ hippie e, discretamente, perguntou se eu não tinha uma ´seda´ pra lhe oferecer. Aff!

Atravessando a pacata vila chega-se num misto de dunas e restinga bem bonito, onde os montes de areia clara e fofa tem tamanho considerável, e seguindo o q parecia ser um discreto trilho chega-se no topo de uma delas, de onde se tem uma vista fantástica da vila e do mar azul, logo atrás, do outro lado, o verde de resquícios de Mata Atlântica, misturado com coqueirais contrastam muito com a claridão da duna e, lá embaixo, um rio de água doce q, timidamente, serpenteia toda essa paisagem!!! Não pensei duas vezes e foi lá onde dei um tchibum! A água era doce mesmo e mandei ver vários goles, embora ali houvessem uma locais lavando roupa. Mais adiante havia o q parecia ser uma ponte de madeira q provavelmente devesse levar ate o asfalto…

Revigorado, volto pra vila apenas pra apreciar o sol faiscar seus últimos raios do dia no horizonte sob a duna e os coqueirais da praia.. Mais tarde janto um suculento miojo e me recolho merecidamente. Estou exausto e meu lado direito do rosto arde de queimado. As poucas luzes da vila me dizem q ela está literalmente morta, td fechado e silencioso!
Dormi muito bem naquela noite fresca e de vento considerável. O céu esta coalhado de estrelas, porém ao norte notava-se o horizonte fortemente iluminado, provavelmente oriundo da sofisticação dos resorts do Sauípe. No entanto, a tranqüilidade de Sto Antonio é um convite irrecusável ao ócio, e torno a dormir. Assim como a simpática vila.
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4º DIA – DA CHIQUE SAUÍPE AOS PELADÕES DE MASSARANDUPIÓ – Amanhece c/ nebulosidade, diferentemente dos d+ dias, e o mar estava bravio. Minha empolgação c/ Sto Antonio fora tanta q esqueci de comprar lanche pro café-da-manhã e improviso c/ o q tenho: misturo adoçante em pó num pacote de miojo, q trituro, chacoalho, e logo tenho um ´sucrilhos emergencial´. E olha q tava até bom! 6hrs já estou novamente pisando na praia deserta c/ a mochila nas costas. Pra variar, a maré ta semi-baixa e o primeiro trecho de pernada é razoavelmente sacal, alterna chão firme e areia fofa. Porém, a proximidade c/ o Complexo do Sauípe, 1hr depois, chama minha atenção. Mas minha presença tb desperta a atenção dos inúmeros seguranças (armados) q surgem, ora pelas espreguiçadeiras na praia ora em meio aos coqueiros, e começam a se comunicar entre si por meio de comunicadores, provavelmente pra ´ficar de olho no elemento mochilado na praia.´

O Complexo do Sauípe é um ´resortódromo´ pra lá de chique, o oposto de Sto Antonio! Da praia é possível ver, no meio dos coqueirais e um belo gramado bem cuidado, hotéis luxuosos ligados por uma passarela de madeira, no interior, piscinas, campo de golfe, quadra de tênis, etc.. Sei q ainda tem shopping próprio e q quem não estivesse hospedado e quisesse desfrutar das praias deveria desembolsar 50 pilas (carro c/ 4 pessoas). Um belo sistema de seleção natural. Tratei de atravessar rápido aquele trecho, pois tava ate me sentindo mal de tão vigiado, já q a praia tb não era lá essas coisas, e não havia nenhum hospede naquela manhã.

Em pouco tempo me vejo numa praia deserta, já um pouco maior e + ampla, ainda c/ o tempo nublado e ventando razoavelmente. Novamente as varetinhas do TAMAR e a fileira de coqueirais marca presença. Deserta e com tempo ruim, o tédio se instaura e procuro caminhar olhando pro chão, afim de não ver o quanto ainda falta, um artifício bem eficaz! A enorme praia termina quase 8km após, limitada por + um enorme rio a transpor, o Rio Sauípe, cuja largura, profundidade e correnteza impediam qq ilusão de cruza-lo no peito.

São 8hrs. Esperei um pouco e gritei pra única pessoa q vi na outra margem, q pra minha sorte estava c/ uma pequena canoa! O cara atendeu meu pedido e veio ate mim. Era um funcionário do TAMAR q tava andando por ai, mas a canoa dele era menor, de plástico e creio q comportava apenas 1 pessoa, isto é, ele, porem, como pra ganhar um troco vale td o cara me garantiu q eu e minha pesada mochila cabíamos na dita cuja. Sem escolha, topei a parada. Meu, essa travessia foi medonha! Com o peso, a canoa boiava-afundava levemente ate a metade, molhando toda minha bermuda, eu carregava no colo minha mochila torcendo pra canoa – literalmente – não virar de vez, enquanto o cara remava rapidamente e insistia p/ não me mexer muito.. já q aquilo tava + pra caiaque q canoa!

Após um tempo q pareceu interminável, cheguei são e salvo do outro lado, embora molhado ate a cintura! Dei o ´agrado´ ao cara e continuei minha marcha por entre os quiosques fechados no inicio daquela nova praia a percorrer, Porto Sauípe, um ponto de atracação de barcos pesqueiros, com uma infra mais modesta e simples q a praia anterior. Felizmente, a praia aqui é bem larga, de chão duro, ideal pra caminhar e procuro forçar o ritmo. Rente a orla apenas algumas casas esparsas, pequenas pousadas e barraquinhas, separadas por amplos trechos de restinga e coqueirais. Poucas pessoas circulavam naquela manhã cinza, nenhum turista e quase todos pescadores. Alguns vendedores de artesanato, chapéus e bolsas trançadas em palha de piaçava, circulam a procura de fregueses, em vão. Lentamente o sol vai surgindo…

A medida q me afasto de Porto Sauípe, a praia vai novamente ficando deserta e reta, onde minha diversão é ver o forte vento fazer deslizar a espuma do mar pela praia, alem de fustigar minhas pernas c/ grãos de areia. O sol já esta c/ forca total e varias paradas pra descansar e beber água são necessárias! Não vejo a hora de chegar na próxima praia, q será a q vou permanecer pq mesmo chinelados, sinto os pés levemente esfolados.

Quase 10km depois de não ver alma viva, eis q surgem vultos à minha frente, e um quiosque tb!! Demorô! Ao me aproximar, reparo q os poucos casais na praia – sentados em cadeiras – passam a me olhar feio, o q me incomoda de certa maneira. Meu cansaço era tanto q nem havia reparado num detalhe: estavam tds pelados! Estava em Massarandupió!! Como quem não ´viu´ nada, passo batido e coleto informações c/ o tiozinho do quiosque, tb peladão, q confirma onde estou. Mais adiante uma placa anuncia, em sentido oposto, ´Amanat – Praia Nudista – Nudez Total Obrigatória´. Se viessem me encher o saco eu simplesmente retrucaria q de onde vim não havia placa alguma..

Tomo uma trilha q sobe a duna rente a praia e atravesso uma faixa de restinga rala de onde sai uma estrada de terra, por onde veículos chegam à praia.. A vista aqui é muito bonita: restinga, dunas claríssimas e um rio lado-a-lado.. é aqui q pernoitarei! Ando por + 3km ao lado de uma área de várzea, c/ muito esforço sob forte sol, ate chegar no centrinho da vila. Meus pés estão doloridos e pedem pra sentar! Felizmente me delicio c/ mangas, carambolas e cajueiros, onde é possível pegar o fruto apenas esticando o braço! O centro de Massarandupió é uma vilinha simples, rústica e de pouca infra! Mas foi lá q mandei ver num bar 2 Frevo (a cerveja regional q não é lá essas coisas, mas dá pro gasto) e um suculento PF (bife, feijão e arroz) pra comemorar minha chegada, alem de pegar mantimentos e água de uma bica disponível. São apenas 11hrs!!

Em seguida, depois do almoço, volto pra me refrescar. O calor e sol estão de torrar miolos e passo o resto da tarde descansando no riozinho q atravessa toda a faixa de restinga q antecede a praia dos peladões! O banho foi ótimo, dose foi aturar os peixinhos ficarem beliscando vc. Logo após fui de fato acomodar minha barraca, embora não faltasse vontade de dar uma espiada na praia. A faixa de restinga é descoberta, ampla e larga, porem + próximo das dunas haviam coqueirais q providenciavam a sombra e privacidade necessárias e foi lá q estacionei. Só dava eu lá! Descansei, fiz um lanche e ate mandei ver água-de-coco direta da fonte! No final da tarde o tempo fecha&nbsp, e começa a ventar bem forte.
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Exausto, me recolho antes de anoitecer, enquanto o céu faísca com clarões de relâmpagos anunciando chuva vindo ai. Dito e feito acordei horas depois c/ água pingando no rosto e fortes rajadas de vento estremecendo a estrutura (já quebrada) da barraca. Por + de 2hrs fiquei ali – sob a frágil luz da lanterna e dos raios esporádicos – tentando conter os vazamentos q se concentravam do lado das rajadas carregadas de chuva, alem de segurar a estrutura qdo as rajadas a atingiam agressivamente. Foi uma noite dura, ate q desencanei já q precisava dormir, deixei molhar mesmo o q fosse molhar, apenas protegendo minhas roupas e saco de dormir. Só dormi mesmo qdo a chuva diminuiu, assim como o vento…

Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 7º e 8º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 5º e 6º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 3º e 4º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 1º e 2º dias

Texto e fotos de Jorge Soto
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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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