Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 7º e 8º dia

0

7º DIA – CONDE, POÇAS, SIRIBINHA, COSTA AZUL. – Pra variar, acordei c/ o corpo moído + uma vez as 6hrs, aproveito pra enrolar e descansar + um pouco, alem de dar uma arrumação e ´faxina´ no interior da barraca, repleta de areia. Isso ate qdo os primeiros raios alcançam a lona, avisando q é hora de zarpar. O dia promete, e à leste um tênue arco-íris torna a paisagem mais encantadora.


Pé na areia novamente, c/ suave brisa no rosto, marcho apenas 4km em praia ampla, larga e deserta, mas q aos poucos vai mostrando vida diante a aproximação de Sitio do Conde, principalmente de pescadores artesanais e, pra variar, os onipresentes quiosques, gde parte deles c/ erros gramaticais grotescos nos anúncios. Sitio do Conde já é uma antiga vila de pescadores + estruturada, c/ pousadas, restaurantes, etc e tal. Quitutes como potu c/pirão, caldo de sururu, porções de pescada, cação, vermelho, cavala e curvina parecem apetitosos, mas os quiosques ainda nem abriram. As noites parecem animadas rente a orla e descansei rapidamente à sombra de uma barraca, evitando sentar nas mesas ou cadeiras (´proibido usar mesa s/ consumir!´) e dei continuidade à pernada. Antes, porem, conversei com uma suíça q ali passeava.

A partir daqui a praia se estreita +, deixando à mostra muitos recifes e lajedos q parecem ´placas de asfalto rachadas´ acompanhando todo o trajeto, onde pescadores artesanais (c/ gaiolas) parecem tirar seus sustento nas várias banheiras q se formam. Durante um bom tempo se caminha alternando areia fofa e recifes. Depois, à minha esquerda, percebo q os coqueirais sumiram pra dar lugar a uma extensa planície de restinga q se alterna com mangue, onde logo surge uma ´estrada de chão´ q segue paralela à orla, beirando a praia. Claro q agora continuo pela estrada, principalmente pela dificuldade de andar pela areia fofa.

E assim o percurso é ate + fácil, de um lado a praia estreita, e do outro um mangue c/ coqueiros, 6km depois alcanço outra pequena vila, Poças, onde um cemitério interditado já me dá uma luz da simplicidade da vila, era tão rústico q os ´túmulos´ eram ornados c/ telhas e bromélias no lugar de cruzes. A vila órbita ao largo da estrada de chão, c/ casas simples, coloridas e modestas, algumas ate são palhoças de pau-a-pique. Percebo q não há mta infra p/ turistas, e q os locais são quase todos pescadores, pois ta td mundo arrumando ou consertando redes ou canoas na rua. Seguindo a estrada, paro pra beber minha 1ª cervejinha numa cantininha s/ movimento algum, as 10hrs. Enquanto aprecio a bela vista do mar, a praia estreita s/ banhistas, converso rapidamente c/ um caseiro q, pra variar, acha q vendo bijus (novamente!) É incrível como custa a eles compreenderem alguém andar mochilado dias a fio apenas pelo prazer de faze-lo. Alem disso, conta q Poças recebe este nome devido aos inúmeros recifes na água, q na maré baixa formam poças, mas q é justamente pela presença de pedras em abundancia q os turistas evitam banho ali. A praia era de fato estreita e inclinada, e o máximo q se podia fazer mesmo era tomar sol.

Deixo Poças ainda pela estradinha de terra e areia, q agora segue sinuosa adentrando num vasto coqueiral, q me agracia com sua sombra diante do sol e calor dos infernos q começa a fazer. Nesta estradinha há muitos caranguejos atropelados, e nas clareiras de restinga diviso vários cactos q emergem discretos da areia. Chego em Siribinha 7km após, c/ sol a pino. Hora de descansar, claro! É aqui tb onde a estradinha termina, pois adiante esta a foz do enorme Rio Itapicuru, q acompanha tanto Poças qto Siribinha atrás das mesmas num extenso manguezal. O vilarejo, originalmente uma vila de pescadores esta assentado nas pequenas dunas q se espremem entre o rio e a praia, é bem maior q Poças, tem mais infra e é + simpático. Um palco médio acomodado no fim da estrada indicava q ali deviam ocorrer shows de verão.

Num quiosque utilizo a ducha pra amenizar o calor matinal! Dali à praia é um passo, após algumas casas, onde turistas desfrutam da razoável faixa de areia claríssima – entre coqueiros, amendoeiras e mandacarus – q contrasta com o azul intenso do mar. Em seguida coleto informações sobre barco pra atravessar o rio ate q negocio c/ um cara q leva banhistas a passeio rio adentro. Ele diz q me pega assim q voltar, ótimo. C/ tempo pra descanso aproveito pra almoçar numa casa adaptada pra restaurante, onde detono um PF de mariscos q tava uma delicia! Afinal, preciso de comida mesmo, algo ´pra dá + sustança´.

Por volta de meio-dia, me dirijo às docas atrás da cidade, de frente para um gde, denso e extenso manguezal, aqui chamado de ´pantanal bahiano´ e embarco na lancha do cara c/ quem combinara anteriormente. A viagem continua pelas águas mansas do enorme Rio Itapicuru ainda 1km ate a foz, acompanhado por faixas de dunas de ambos os lados. Muito bonito. À esquerda, é possível ver a trilha q segue duna adentro e leva, através dos coqueirais, à atração do local, um tal de ´Cavalo Russo´, um lago de água doce de um afluente do rio ao pé de uma duna.

10min de viagem ate a foz, o cara encosta na outra margem do rio onde salto bem disposto. Mochila nas costas e pé na areia novamente, a praia é enorme e interminável! Larga, plana e firme, não oferece problema algum pra caminhar. A diferença é q a areia é claríssima, quase-branca e naquele horário de sol a pino a faixa branca sem-fim chega a ofuscar a vista!! Como sempre, a praia é deserta, sem nenhuma alma viva ate onde a vista se perde, seja ao norte, seja pro lado, onde dunas brancas começam a ser + freqüentes e maiores, chegando a engolir parcialmente os coqueirais e as cercas q ora nos acompanham! E assim, percorro os 10km q me separam do próximo povoado.

As 14:15hrs e bem cansado, chego finalmente em Costa Azul. À primeira vista não se vê nada em meio as dunas, apenas um punhado de quiosques bem simples e rústicos a beira-mar. A minúscula vila esta logo atrás, escondida em meio as dunas e coqueiros. Claro q me dirijo a um quiosque pra relaxar (e beber 1 gelada) e, após uma chuveirada básica, encosto ali mesmo e descanso o restante da tarde, ao som de um reggae c/ forró da barraca ao lado, q dispõe ate de rede pros fregueses. Aqui não há muitos turistas, o q se reflete na escassa infra, parece q esta linda praia é freqüentada + pelos habitantes q por turistas, o q é uma pena. Ou quiçá não.

A vila é um ovo, algumas travessas de areião, casas simples, etc.. Antes do pôr-do-sol levanto a&nbsp, bunda do bar e busco um lugar decente pra acampar. À esquerda da vila e atrás das dunas há um descampado de restinga rala, perto dos coqueirais e do lado de um campinho de futebol, é ali mesmo! É domingo e os armazéns e padarias já estão fechados, o q me obriga a racionar o q já disponho pra comer, isto é, suco, pão e meu ultimo miojo.

Ao anoitecer, já quase mimindo, ouço alguém me chamando na porta da barraca. Ai, ai, ai.. só falta estar em local proibido e estarem me enxotando dali. Mas, pra minha surpresa, era um local me oferecendo hospedagem na casa dele!!?? Isso comprova definitivamente a gentileza e hospitalidade do povo simples dali, sempre disposto a dar uma mão a forasteiros. Meio ate q s/ jeito, recuso a generosa oferta, pois já estava bem instalado ali e na verdade estava cansado, nem um pouco afim de levantar pra deslocar a barraca. Mas mesmo assim agradeço o cara. Assim, o resto da noite foi tranqüila, mesmo o burburinho q vinha dos quiosques não durou muito e logo a vila entrou num silencio profundo, rompido apenas pelas arrebentações do mar ao lado. E sob um céu pontilhado de estrelas apaguei antes das 20hrs. Dormi muito bem, e precisava muito disso, pois o dia sgte seria o + puxado de todos.
&nbsp,
&nbsp,
8º DIA – ÊTA, ÊTA, ÊTA.. ENFIM, MANGUE&nbsp, SECO!!! – Levantei antes do amanhecer por razões obvias, as 5hrs. Seriam quase 30km ate o destino final, de um pique só, e não queria andar sob o sol forte do meio dia. Belisquei alguma coisa e coloquei td na mochila, enquanto uma leve brisa soprava do mar e céu ganhava a claridade do dia.

Subi a duna pra ganhar novamente a praia à meus pés, e lá vou eu pra minha pernada final, deixando Costa Azul&nbsp, – q ainda dorme – pra atrás. Olhando pra frente, eu via uma faixa larga de areia clara q se perdia no horizonte, acompanhada de um coqueiral tb sem fim. O chão é duro, não há dificuldade alguma em caminhar. À minha direita, lentamente, o sol desponta no mar, dando à alvorada uma coloração vermelho-alaranjado q se esparrama pelas poucas nuvens ao leste.

O tempo vai passando e a paisagem permanece imutável, apenas o sol esta + forte, tostando o lado direito do meu rosto, ao mesmo tempo em q deixa mais evidente a claridade da areia, de tão branca q é. Agora as extensas faixas de coqueirais vão se alternando com enormes e amplas planícies de restinga rasteira, onde dá pra enxergar quilômetros à oeste e pequenos morrotes cobertos de vegetação. Olhando adiante, parece q não avancei nada e aquela ponta no extremo norte parece inalcançável.

Apesar da bela paisagem, a solidão e a caminhada vão se tornando tediosa e busco alternativas pra torná-la tolerável, seja tampando buracos de siris, contando conchas, cantando alto ou andando de costas. Aqui paro pra descansar num banco de areia e beber alguma coisa. Mais adiante haviam uns poucos pescadores, q com suas linhas ao mar pareciam estar ´empinando´ pipa. O sol&nbsp, forte me obriga a colocar meu turbante improvisado do dia anterior, e felizmente corre uma brisa q ameniza o calor refletido da areia.

As 9:30 e c/ + da metade do caminho percorrido, já consigo ver ao longe a ponta cada vez + próxima. Pra minha felicidade já consigo distinguir o brilho do farol de Mangue Seco, mas ainda muito distante. As faixas de planície foram deixadas pra trás, agora é uma enorme praia alva e um coqueiral em meio a dunas q me acompanham ate o fim. Num trecho da praia, perto dos coqueirais, vejo uma pequena construção de palha bem rústica e é lá q vou descansar e me proteger do sol. Chegando vejo q era um quiosque abandonado, e infelizmente não tinha nenhum isoporzinho básico, pois minha água já está nos finalmentes.

Bem, a proximidade de meu destino (e de cervejinha gelada!) já é motivação pra colocar pé na areia novamente e lá vou eu pela bela praia, cuja claridade naquele horário chega a ofuscar a vista! Aos poucos, as dunas tornam-se maiores e logo elas passam literalmente a engolir os coqueirais! A praia é muito bonita e deserta, mas aos poucos vejo marcas de buggie e de cavalos, sinal q to quase lá.

As 11hrs e c/ sol de rachar já devo estar&nbsp, perto. As famosas e enormes dunas alvas já me acompanham por um bom tempo, e consigo ver gente caminhando pela orla, ao longe. Cheguei meia hora depois, e já bem cansado,&nbsp, percebo q bem + adiante, aquela ponta q vira entra numa enseada. Claro q não sigo pela praia e corto caminho em meio as belas dunas, nas quais pode-se andar quase-bem não fosse a areia clara e fina. O engraçado é q as dunas soterraram td a tal ponto q vc anda com a copa dos coqueiros a mostra, no chão, sendo possível pegar um coco apenas esticando o braço, se quisesse. Olhando a sudoeste vejo alguns buggies percorrendo as brancas dunas, q contrastam lindamente com o azul do mar! Aqui descanso brevemente sob a sombra de um coqueiro apenas pra curtir o visual, q de tão bonito serviu de cenário pra Tieta (o livro e filme).

Em pouco tempo chego na praia principal de Mangue Seco, uma pequena enseadinha (logo após a ponta), onde logo depois há um gde mangue q precede o Rio Real, o maior rio de toda travessia e q faz jus ao nome q tem. É imenso em largura e comprimento. Na verdade Mangue Seco fica isolada numa enorme península e aqui só se chega de barco, atravessando o rio. Vou pros quiosques e barraquinhas – todos c/ rede – comemorar minha chegada, sem duvida! Há poucos turistas o q é ótimo.

Enquanto mando ver 2 brejas geladas pra abrandar o calor, converso c/ a atendente, q devia estar entediada por não haver nenhum freguês ali. Cada morador dali tem uma historia pra te contar sobre o filme (e livro) de Jorge Amado, Tieta, cuja vila inspirou seu autor! A sola de meus pés sentiam a longa caminhada daquele dia, estavam ate levemente esfolados..Pergunto por chuveiro e nada, não havia. Mas havia um ´poço´&nbsp, bem do lado, q consistia num cano de pvc enfiado na areia no qual havia outro cano dentro puxado por uma corda. Tirei água dali mesmo pra molhar a cabeça e bebericar, embora o gosto fosse + ferruginoso de todos..

Fiquei um bom tempo descansando, o local é muito convidativo, mas meu cronograma tava estourando. Poderia ter pernoitado ali, havia muito espaço entre as dunas, mas resolvi arredar pé dali. A travessia havia sido concluída c/ sucesso! Sob sol escaldante, deixo a praia por uma estrada de areia q tava muito quente em direção à vila, uns 500m dali, espremida entre as dunas/restinga e o Rio Real. Do lado do rio, muito mangue..seco, claro! Uma preocupação evidente da vila, pequenina c/ praça, igreja e pouca infra, é o avanço das dunas de um lado e aumento da barra do rio noutro. É bom vir pra cá o qto antes então, pois se não for o turismo desordenado, provavelmente será a própria natureza q se encarregará de soterrar esta bela e simpática vila.

&nbsp,
A VOLTA – Na vila, vários barcos, botes e lanchas flutuam ancorados na beira do enorme rio. São 13:30hrs e felizmente há um barco saindo pra Pontal, na outra margem, já em Sergipe. O q se segue é uma maratona de distancias percorrida quase q seqüencialmente pra chegar a Salvador. Após a viagem de 20min ate Pontal, consigo carona numa perua q me leva, sacolejante, através de uma estrada poeirenta no meio do nada (salvo os engenhos desativados e vilas como Terra Caída e Indaiaroba), pra depois tomar o asfalto ate Regência, perto de Aracaju. Lá, a espera me dá tempo suficiente pra tomar banho numa pousada e me ´enfiarem´, as 15:30, no único lugar vago do busão de passagem pra Salvador, onde cheguei as 19hrs, após retornar pela estrada q eu acompanhara paralelamente durante aqueles 8 dias seguidos.

Enfim, a ´Costa dos Coqueiros´ é isso ai, um punhado de praias selvagens e virgens, protegidas por dunas q&nbsp, parecem montanhas, intermináveis coqueirais, com uma lagoazinha aqui e uma barra de rio acolá. Por sorte, a construção da Linha Verde não atropelou c/ progresso este lugar paradisíaco, repleto de recantos q disputam entre si o titulo de mais bonito. Um lugar cheio de raridades, onde ainda em muitas praias o único movimento é o vaivém das tartarugas e comunidades perdidas no tempo. Agora, conhecer o litoral norte da Bahia pela estrada ou pela praia? Bem, a escolha é sua.

Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 7º e 8º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 5º e 6º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 3º e 4º dias
Costa dos Coqueiros – De Arembepe à Mangue Seco – 1º e 2º dias

Texto e fotos de Jorge Soto
http://www.brasilvertical.com.br/l_trek.html

Compartilhar

Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

Deixe seu comentário