Encontro de Parques e Montanha pode ser o começo do fim do proibicionismo nas montanhas

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No primeiro dia do 2º Encontro de Parques de Montanhas, evento dentro da Semana Brasileira de Montanhismo, diversos gestores de parques e dirigentes de Entidades que administram o esporte afirmaram uma agenda comum de acabar com restrições à prática de montanhismo em parques nacionais.

 

Todos sabem que o maior problema do montanhismo brasileiro é ter acesso às montanhas. Em nosso processo de crescimento econômico, muitas vezes pautado no crescimento a qualquer custo, as paisagens naturais foram substituídas por cidades, pastagens, e plantações. As montanhas, por suas características de relevo, ficaram na maioria das vezes fora desta história e em tempos recentes passaram a ser valorizadas pela manutenção de sua originalidade e beleza estética. Principalmente após a década de 1990, diversos parques foram criados em montanhas com um intuito maior de promover a preservação do que permitir o uso público. Neste contexto, diversos roteiros consagrados do montanhismo foram proibidos.
 
Com o fechamento de trilhas, travessias e locais de escalada, os montanhistas foram com tempo marginalizados e tratados como criminosos ambientais. Graças, no entanto, ao trabalho de algumas pessoas engajadas, os montanhistas foram tomando consciência que sua atividade não era tão perniciosa ao meio ambiente e que eles teriam sim o direito ao acesso e à prática desportiva em ambientes naturais.
 
A consciência já faz parte da nova geração e a principal justificativa para a realização desta semana de montanhismo foi de discutir e resolver os problemas de acesso. Eis que esta missão está sendo mais fácil que o imaginado.
 
Na abertura do Encontro de Parques de Montanha algumas frases se tornaram lemas, tais como: “Não se preserva o que não se conhece”. Uma referencia que para a missão dos parques derem certo é necessário que eles tenham um uso público, que na palavra de Pedro da Cunha Menezes: “Sem eufemismos, uso público é turismo”.
 
Menezes proferiu uma palestra inspirada, falando, entre diversas coisas, que as áreas intangíveis dos parques eram indesejáveis e que elas ao invés de proteger, servem na verdade para acobertar a ação dos verdadeiros destruidores da natureza. O diretor do ICMbio, além de criticar este tipo de zoneamento dos parques, que sempre tendem a proibir o acesso à áreas montanhosas, também deu a notícia de uma portaria da instituição ambiental que proibirá a obrigação de contratação de guias dentro das Unidades de Conservação, uma demanda antiga de montanhistas.
 
Outra fala inspirada e importante foi do atual diretor do INEA André Ilha, que colocou o montanhista como um amigo da conservação e da existência dos parques. De acordo com Ilha, as políticas restritivas dos parques culminaram somente em desagregar o conservacionismo e dar força ao verdadeiro criminoso ambiental, o madeireiro, palmiteiro, caçador e especulador imobiliário, entre outros. André Ilha comparou o fim das restrições ao montanhismo com a política de Dom João VI, que em 1808 abriu os portos do Brasil às nações amigas, acabando com o monopólio de comércio com Portugal e resultando na independência do Brasil mais tarde e à um grande avanço do país. Para André Ilha, um parque fechado significa um parque que não pode ser apreciado, um lugar que não criará laços emotivos com a população e que fenecerá sob interesses obscuros. 
 
O presidente da FEMERJ, Delson de Queiroz, complementou as ideias dos diretores dos órgãos ambientais, mostrando que o montanhismo é muito além de um esporte, é uma cultura onde a conservação das montanhas faz parte de sua ética e de seu interesse, ou seja, pediu o fim do fogo amigo entre gestores de parques e montanhistas, mostrando que o acesso é algo necessário.
 
Finalizando, o representante da ONG ACCESS Fund, voltada à resolver questões de acesso nos Estados Unidos, Brady Robison mostrou a experiência de sua entidade na solução de problemas no parque de Yosemite na Califórnia, onde assim como no Brasil há visitantes problemáticos e problemas ambientais, mas mesmo assim não há neste parque áreas intangíveis e a escalada pode ser realizada livremente.
 
Esteban Degregori, do Acesso Argentino também falou de suas experiências no Parque Los Glaciares, onde fica El Chaltén. O interessante destas experiências é que nestes país, os parques foram feitos para a população ter acesso à natureza, poder acampar e fazer esportes, enquanto no Brasil, até pouco tempo atrás, os parques eram limitados a apenas proteger a natureza, separando-a do homem.
 
No Encontro de Parques de Montanha está havendo maciça participação de gestores de Unidades de Conservação, desde aqueles que simpatizam com o montanhismo até aqueles que restringem totalmente.  Os fundamentos filosóficos já foram lançados e amanhã espera-se que na plenária final seja assinado um documento com políticas para um futuro melhor, com mais verde e com respeito às tradições do montanhismo tradicional. Por que não existe montanhismo sem montanhas.
 
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Texto publicado pela própria redação do Portal.

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