A Serra do Ramalho não tem realmente uma grande importância geográfica: não é nem alta nem longa e, embora não seja isolada, não serve de conexão entre outras extensões serranas. Mas você verá abaixo que é uma formação num certo sentido bem especial.
A Serra do Ramalho fica no sul da Bahia, não longe de sua divisa com Minas. Ela é aproximadamente intermediária entre o Espigão Mestre a oeste e o Espinhaço da Chapada Diamantina a leste, deles distando 200-250 km. Você pode ler sobre o Espinhaço na coluna anterior; o Espigão Mestre será proximamente abordado.
Entretanto, não é formada pelo quartzito do primeiro ou pelo arenito do segundo, pois é uma surpreendente formação calcária sedimentar. Resultou da invasão em períodos remotos pelas águas do oceano, que depositaram em sua região as carapaças e esqueletos de animais marinhos. Esse material foi compactado e cimentado sob pressão, ocorrendo a gradual expulsão do líquido e formação da rocha.
Não é uma serra elevada, suas altitudes variando de 650 a 800m, por oposição ao piso de 500m do planalto sobre o qual se apoia. O aclive é suave, ou seja, o Ramalho não apresenta paredes ou penhascos rochosos. Pertence à região semiárida do médio São Francisco, situando-se entre dois de seus importantes afluentes: o Corrente a norte e o Carinhanha a sul. Estende-se de forma um tanto curvilínea de SW para NE, por menos de 100 km.
Sua vegetação é áspera, com árvores do cerrado como a aroeira, o pau d´arco e a braúna, e presença de matas de caatinga e de campos gramados. Entretanto, a existência do solo calcário favorece a formação das interessantes matas secas de barrigudas. A cobertura nativa foi fortemente afetada pelo corte de madeira e pela formação de pastagens. Existem lajedos e grutas calcárias, ainda pouco explorados.
Você pode percorrer os campos e encostas da serra, pois o relevo ameno permitiu sua ocupação. Mas você notará algo inusitado: a presença de gado europeu de leite, ao invés do zebu usual de nossas extensões tropicais. A explicação decorre da peculiar ocupação deste território.
Essa região fértil foi desapropriada pelo Governo, para assentamento em 300 mil ha de colonos desalojados pela construção da Represa de Sobradinho ao norte. Um sistema de agrovilas agrícolas foi então planejado, com lotes familiares de 20 ha à volta de pequenos núcleos urbanos, cada qual com seus equipamentos comunitários básicos.
Mas a agricultura fracassou, devido à concentração das chuvas, sendo em seguida substituída pela pecuária. A pequena dimensão dos lotes não favoreceu a criação de gado de corte, que necessita de grandes extensões, passando a acolher o criatório de gado de leite.
Na realidade, este sistema de agrovilas foi sendo ampliado para receber outros colonos nordestinos. Existem hoje cerca de 20 agrovilas, tendo uma delas originado a sede do município, e 40 comunidades no total, num raro exemplo de colonização bem sucedida. O conhecido Projeto Jaíba de agricultura familiar, com a canalização das águas do São Francisco no norte de Minas, é da mesma época – mas só realmente funcionou quarenta anos depois.
Vale lembrar que, bem antes da colonização, o Ramalho foi invadido pelos índios pankaru, oriundos de Pernambuco. Eles não tinham nenhuma relação com os indígenas originais. Após uma história conturbada, estão hoje pacificamente assentados na reserva de Vargem Grande.
A região da Serra do Ramalho é um tanto árida e pobre, embora tenha uma beleza bucólica, com suas pequenas propriedades rigorosamente divididas e cercadas. Não é naturalmente populosa, o maior centro urbano sendo a cidade de porte médio de Bom Jesus da Lapa, cuja gruta à beira do São Francisco é local de peregrinação.
As principais reservas naturais estão ao sul do Ramalho: o PE da Terra Ronca em Goiás, os PNs Grande Serrão Veredas e Cavernas do Peruaçu em Minas e o PE Serra de Montes Altos na Bahia. Entretanto, relacionam-se com outros sistemas serranos que não o suave Ramalho. Assim, o pequeno território do Ramalho se afirma apenas por sua natureza gentil e por sua ocupação peculiar.
2 Comentários
Bela reportagem e fidedigna a este lugar fantástico. A Serra do Ramalho é também u m notável sítio espeleológico, com dezenas de cavernas ainda em estudo e com muita informação científica a ser gerada. Merecia ser uma unidade de conservação. Veja um pouco nessa matéria https://agenciasertao.com/2019/05/08/geologos-descobrem-fosseis-de-29-animais-em-cavernas-de-serra-do-ramalho/
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