Existe na distante região amazônica de Monte Alegre um PE que, apesar de pequeno e precário, contém duas serras com muitos acidentes singulares. Seus mirantes e grutas são interessantes e os desenhos de suas pedras são expressivos. O Parque é frontal a um grande lago de águas plácidas e envolvido por uma região simultaneamente árida e verde.
A extensão das áreas de conservação no Pará é impressionante: 1/3 de seu território. Além de muitas reservas de uso sustentável, há uma dezena e meia de parques, entre os quais o PN das Montanhas do Tumucumaque, o maior do País. Porém, há apenas dois Parques Estaduais, o da Serra dos Martírios, que foi o primeiro deles, e o de Monte Alegre, assunto desta coluna.
O acesso a Monte Alegre é por Santarém, uma cidade de bom porte na confluência do Tapajós com o Amazonas. Há uma enorme balsa que vai e volta de lá três vezes por dia até Santana do Tapará – este é o nome de um afluente do Amazonas. Após menos de 2½ hs de travessia algo monótona e barulhenta, você chegará em Monte Alegre por ônibus ou camionete, com mais 1 h para vencer do porto à vila 85 km de bom asfalto.
Apesar da aridez da serra, há muita água na região: o Maicuru, sua principal bacia, e o Gurupatuba, canal que prossegue o lago formado pelo primeiro. São um afluente só do Amazonas, cujo leito é visível dos locais elevados. Há muitos lagos às margens de Monte Alegre, que dão um lindo visual à cidade, quando olhada do alto.
Acho que as presenças da água e do arenito explicam a antiga ocupação por povos criadores de pinturas rupestres. Seu estilo, com rústicos grafismos e figuras de animais, é especial no uso pelos desenhistas primitivos das cavidades ou saliências das rochas. Esta prática dificilmente é encontrada em outros locais da Amazônia.
Depois dos indígenas primitivos, Monte Alegre foi ocupada precocemente a partir de uma missão jesuítica. Durante a colônia, a região dispunha de uma produção surpreendentemente variada: madeira, café, tijolo, cana, algodão e gado.
A Cabanagem (movimento separatista após a Independência) causou fortes prejuízos, pois a população local era então leal á Coroa. Em tempos recentes, a cidade cresceu a partir dos projetos de assentamento agrícola: tem atraído cearenses, espanhóis, japoneses e caboclos migrantes. Quando você se aproximar da vila, notará as indicações das muitas colônias à beira da estrada.
O PE de Monte Alegre foi criado em 2001, através de um interessante processo de consulta às comunidades. Grupos de trabalho procuraram definir o uso e o tamanho da futura UC. Destas reuniões resultou uma área de 3.700 ha. As terras eram todas de propriedade pública, embora existam ainda famílias residentes. Ele está inserido nos 56 mil ha da APA do Paytuna (que significa água escura).
O Parque não possui monitores, não dispõe de estrutura, não está sinalizado e é naturalmente pouco conhecido e visitado. Fica a 35 km da cidade, com uma estrada de terra com areões suspeitos que sugerem um veículo com tração.
A região de Monte Alegre ocupa o início do Planalto das Guianas, quando o relevo irá se elevar ao norte. Apresenta uma anomalia: a presença de rochas muito antigas, datadas de talvez 300-350 milhões de anos, por oposição à origem muito recente da planície aluvionar da Amazônia. Estas rochas estão dispostas num círculo de 20 km de diâmetro (ver mapa), chamado de domo, distribuindo-se por pequenas colinas e serras.
O domo teria resultado de um movimento tectônico que fraturou e cisalhou as rochas pré-existentes, há pelo menos 150 milhões de anos. A região é recoberta entretanto por formações em arenito (e algum granito), que lhe dão esse aspecto ressecado.
O domo apresenta duas falhas: ao norte, associado ao soerguimento da Serra de Itauajuri (420m), ponto culminante da região, e ao sul, relativo às Serras do Ererê (250m) e do Paytuna (200m). São estas as duas principais elevações do PEMA. A primeira está ao norte, com uma direção E-W de 4 km de extensão. A segunda fica ao sul, com uma orientação N-S ao longo de seus 3 km.
É um visual interessante, devido à presença de encostas abruptas, com fendas e paredões, e à ação da erosão, que esculpiu formas exóticas no frágil arenito. A flora é uma curiosa mistura do Cerrado com a Amazônia.
A degradação ambiental reduziu ou extinguiu parte da população de mamíferos, sendo porém encontrados animais médios como tamanduás, veados e pacas. As aves costumam ser de pequeno ou médio porte, mas a presença de lagartos, jacarés e serpentes é variada.
O arenito permitiu a existência de pequenas grutas de desabamento, algumas fechadas e outras com galerias de retorno. As mais conhecidas são a primeira, pelo seu aspecto grandioso, e a última, pela presença de antigas pinturas:
Afora estas grutas, existem três outros atrativos. O mais visitado é a Pedra do Pilão, uma torre em arenito coroada por uma grande laje, na borda da Serra do Paytuna, voltada para o lago. Esta é uma situação única, pelo formato e altura da pedra e pelo panorama dela avistado. O Lago Paytuna é mais uma das águas que flui para o Gurupatuba.
O segundo são os mirantes, alcançados por curtas trilhas verticais, sempre com amplas visões abaixo. Existe em especial a Pedra do Mirante, com visual de 360°. E o terceiro são as pinturas, seja na Serra do Ererê ou na Gruta e Painel ao lado do Pilão.
Junto com a Gruta da Capela (ou Itatupaioca), a região do Pilão é a mais visitada. Neste último caso, você não terá de percorrer mais de 4 km e subir mais de 100 m para alcançar seus atrativos. Parece fácil, mas considere que o calor é sufocante – saia cedo pois o acesso é longo e procure fazer primeiro as subidas maiores.
2 Comentários
Moro em Monte Alegre e já visitei várias vezes o Parque Estadual Monte Alegre, hoje já há uma estrutura para acolher melhor seus visitantes.
que interessante, Kleyton! Hoje deve haver ainda mais estrutura. Recomenda algum guia? Acha que vale dormir uma noite em Monte Alegre para aproveitar bem o dia? (pra quem vem de Santarém)