Ötzi: O homem de gelo e sua maldição

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Em 1991, o casal alemão Helmut e Ericka Simon estavam caminhando pelos Alpes, entre a fronteira da Áustria e Itália quando encontraram um cadáver emergindo do gelo na base de um glaciar em processo de derretimento.

O ótimo estado de conservação do corpo, fez que o casal de montanhistas achasse que se tratava de algum alpinista moderno ou algum soldado falecido na primeira Guerra, que na década de 1990 já começavam a parecer com o degelo das montanhas. Porém, quando o corpo foi removido da montanha, três dias depois, a polícia e os resgatistas se deram conta de que haviam na verdade realizado um achado arqueológico. O fato de o corpo ter sido encontrado nas montanhas dos Alpes de Ötztal acabou resultando no apelido da múmia: Ötzi, ou para muitos outros o “Homem de gelo”.

Hans Kammerlander e Reinhold Messner estavam na região de Ötztal quando houve a descoberta e conferiram insitu o “Homem de Gelo” antes dele ser removido do local.

O primeiro pesquisador a ter contato com o corpo foi o arqueólogo austríaco Konrad Spindler, da Universidade de Innsbruck. Spindler, baseado na tipologia do machado encontrado com Ötzi, deu a hipótese de que o corpo, até hoje o humano mumificado mais antigo já encontrado na Europa, tivesse por volta de 4 mil anos.

Pesquisas posteriores, no entanto, deram a idade exata do achado arqueológico e também informação sobre seus últimos dias de vida. Ötzi viveu entre 3400 e 3100 antes de Cristo. Ele tinha 1,60 de altura e cerca de 50 quilos e tinha 45 anos quando morreu. Analises de pólens, grãos de poeira e a composição isotópica de seus dentes mostram que ele passou sua infância próxima à vila de Feldthurns, próximo a Bozano na região italiana do Süd Tirol. Entretanto, em sua vida adulta ele morava cerca de 50 km mais ao norte.

Local onde Ötzi foi encontrado. Fonte Johan Reinhard.

Exames no corpo de Ötzi

 

Em 2009, uma tomografia computadorizada em seu estomago relevou que ele teve duas refeições 8 horas antes de morrer, se alimentando de carne de veado, grãos, raízes e frutas. Exames feitos em seu cabelo, mostram que ele se alimentou de produtos que se encontram em locais de média altitude nos Alpes, em meio a florestas de conífera que provavelmente eram domesticadas, como trigo e legumes. O alto nível de cobre e arsênico em seu corpo evidenciou que ele trabalhava também com fundição de metais. Seu machado, por exemplo, era de cobre puro. Examinando as proporções da tíbia, fêmur e pélvis, os cientistas concluíram que Ötzi caminhava bastante e que provavelmente ele pudesse ser um pastor em locais de grandes altitudes.

Foto tirada por Helmut Simon em 1991 logo que ele encontrou Ötzi.

Quando morreu, Ötzi vestia uma capa de lã, um casaco, uma calça com cinto e sapato feitos de couro de diferentes tipos de peles, também vestia um gorro feito com pele de urso. Seu sapato era impermeável e feito com pele de urso no solado sendo perfeito para caminhar em terrenos nevados. Era tão bem feito que arqueólogos passaram a propor a hipótese de que já naquela época existisse artesões dedicados a fabricar estes artefatos.

Além das roupas, junto ao corpo foi encontrado um machado com lâmina de cobre e cabo de madeira, uma faca com lâmina de pedra e uma aljava com 14 flechas, sendo 2 quebradas e um arco. Ele ainda possuía vários fungos com propriedades antiparasitárias.

Ötzi tinha 61 tatuagens, algumas das quais eram localizadas em (ou perto de) pontos que coincidem com os atuais pontos de acupuntura, que podem ter sido feitas para tratar os sintomas de doenças de que Ötzi parece ter sofrido, como parasitas digestivos e artrose. Alguns cientistas acreditam que esses pontos indiquem uma primitiva forma de acupuntura.

Por estar apenas 60 metros dentro da Itália, o corpo de Ötzi foi trasladado de Innsbruck na Áustria para Bozano na Itália, onde hoje é a principal atração de um museu de arqueologia.

Reprodução da faca e pontas de flechas achadas com Ötzi.

Como Ötzi morreu

 

A causa da morte permaneceu incerta até 10 anos após a descoberta do corpo. Inicialmente, acreditava-se que Ötzi morreu de exposição durante uma tempestade de inverno. Mais tarde, especulou-se que Ötzi poderia ter sido vítima de um ritual de sacrifício, no entanto, em 2001, radiografias e uma tomografia computadorizada revelaram que Ötzi tinha uma ponta de flecha no ombro esquerdo quando morreu e uma pequena mancha de sangue correspondente em seu casaco.

Reconstrução de como seria a aparência de Ötzi.

A descoberta da ponta da flecha levou os pesquisadores a teorizar que Ötzi morreu de perda de sangue da ferida, o que provavelmente teria sido fatal mesmo se as técnicas médicas modernas estivessem disponíveis. Pesquisas posteriores descobriram que o cabo da flecha havia sido removido antes da morte e um exame cuidadoso do corpo encontrou hematomas e cortes nas mãos, pulsos e peito e trauma cerebral, indicativos de um golpe na cabeça. Um dos cortes foi na base do polegar, que chegava ao osso, mas não teve tempo de curar antes de sua morte. Atualmente, acredita-se que Ötzi tenha sangrado até a morte depois que a flecha quebrou a escápula e danificou os nervos e vasos sanguíneos antes de se alojar perto do pulmão.

Em 2010, foi proposto que Ötzi tivesse morrido em uma altitude muito mais baixa e fosse enterrado mais alto nas montanhas, como postulado pelo arqueólogo Alessandro Vanzetti da Universidade Sapienza de Roma De acordo com o estudo dos itens encontrados perto de Ötzi e suas localizações, é possível que o homem do gelo possa ter sido colocado acima do que foi interpretado como um monte de enterro de pedra, mas foi posteriormente movido a cada ciclo de degelo que criou uma mistura aquosa fluida, impulsionada por gravidade antes de ser congelado novamente. Enquanto o arqueobotânico Klaus Oeggl, da Universidade de Innsbruck, concorda que o processo natural descrito provavelmente levou o corpo a se mover da cordilheira que inclui a formação de pedras, ele apontou que o documento não apresentava evidências convincentes para demonstrar que as pedras dispersas constituíam uma plataforma de sepultamento. Além disso, o antropólogo biológico Albert Zink argumenta que os ossos do homem do gelo não exibem deslocamentos que resultariam de uma descida e que os coágulos de sangue intactos em sua ferida com flecha mostrariam danos se o corpo fosse movido para cima da montanha. Em ambos os casos, a teoria do enterro não contradiz a possibilidade de uma causa violenta de morte.

A Maldição de Ötzi

 

Após saber que o corpo encontrado nas montanhas era um achado arqueológico valioso, Helmut Simon pediu na justiça uma indenização em dinheiro que resultou a uma disputa judicial contra a Província de Sud Tirol. Em 1994, as autoridades italianas decidiram dar a Simon um valor simbólico pelo achado de cerca de 5 mil Euros atuais, mas ele negou e pediu em seu lugar uma indenização de 300 mil dólares. O governo italiano entrou com recurso, numa disputa judicial que durou até 2008 e que resultou numa indenização de 150 mil Euros ao casal que descobriu o corpo.

Helmut, no entanto, nunca desfrutou do dinheiro, pois faleceu em 2004 em uma condição que atiçaria qualquer roteirista de filmes de terror. Simon decidiu retornar à região onde encontrou Ötzi 13 anos depois para fazer uma caminhada. O tempo estava bom, mas de repente uma tempestade se formou rapidamente e ele morreu congelado e seu corpo foi encontrado na mesma posição da múmia.

Se não bastasse isso, a próxima vítima a morrer foi o homem que encontrou e resgatou o corpo de Helmut. Dieter Warnecke teve um ataque cardíaco no funeral de Simon.

Antes disso já havia ocorrido 3 mortes de pessoas envolvidas nas descobertas e pesquisas sobre Ötzi. A 1ª morte ocorreu em 1992, quando o médico forense Rainer Henn, que colocou os ossos de Ötzi em um saco com as próprias mãos, sofreu um acidente fatal de carro enquanto ia a uma conferência para falar sobre o ‘Homem de Gelo’.

A 2ª pessoa a morrer foi Kurt Fritz, que levou Henn até os ossos do homem encontrado. Ele morreu durante uma avalanche.

A 3ª vítima foi o homem que filmou a descoberta, ele morreu de câncer no cérebro.

A próxima vítima foi o próprio Konrad Spindler, o primeiro arqueólogo a trabalhar com Ötzi e que neste momento fazia declarações sobre a tal “maldição de Ötzi”, que já rondava a mídia. Ele morreu de esclerose múltipla.

A 7ª pessoa a morrer foi Tom Loy, o cientista que descobriu vestígios de sangue humano no ‘Homem de Gelo’. Loy morreu de uma doença no sangue, no mesmo ano em que começou a investigar o corpo de Ötzi.

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Sobre o autor

Pedro Hauck natural de Itatiba-SP, desde 2007 vive em Curitiba-PR onde se tornou um ilustre conhecido. É formado em Geografia pela Unesp Rio Claro, possui mestrado em Geografia Física pela UFPR. Atualmente é sócio da Loja AltaMontanha, uma das mais conhecidas lojas especializadas em montanhismo no Brasil. É sócio da Soul Outdoor, agência especializada em ascensão em montanhas, trekking e cursos na área de montanhismo. Ele também é guia de montanha profissional e instrutor de escalada pela AGUIPERJ, única associação de guias de escalada profissional do Brasil. Ao longo de mais de 25 anos dedicados ao montanhismo, já escalou mais 140 montanhas com mais de 4 mil metros, destas, mais da metade com 6 mil metros e um 8 mil do Himalaia. Siga ele no Instagram @pehauck

4 Comentários

  1. Giselle Valladão em

    Genteeeee, que história de filme….impressionante, mas é difícil acreditar nas mortes por maldição. Enfim….preservem os a múmia ao menos.

  2. Lembro quando em 1991 estava assistindo o noticiário na TV e informaram desse grande achado. Desde então me interesso e leio sobre o assunto. Sou professor da disciplina Introdução à Engenharia Mecânica na UnB e todo semestre faço menção à Otzi, com foco no testemunho de desenvolvimento tecnológico que ele representa. Como tarefa para os alunos proponho um questionário tocando em alguma questões. Caso possa ser divulgado aqui e alguém tenha interesse em contribuir, envio o link para o mesmo.
    https://forms.gle/WFBheNSzGPkEm7n77

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