Vou dar nome a quem tirou os degraus no PP

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Li todos os comentários a respeito da retirada das escadas – aliás, é muita bobagem junta, mas as vezes aparecem verdadeiras pérolas do raciocínio (obrigado Alceu de Itajaí) – aqui no Altamontanha e em vários outros fóruns onde está sendo discutido. Conversei com gente do ramo como o Natan Fabrício – Presidente da Fepam, Pedro Hauck – Geógrafo, Marcelo Brotto – Eng. Florestal e Presidente do CPM, Hilton Benke – Advogado e ontem compareci a reunião semanal do CPM para ver de perto o calor da fervura – todos “Gente de Montanha”.

Então, saibam que pesquisei muito antes de falar/escrever. Mais besteiras são completamente desnecessárias neste momento. Hoje uma comitiva se dirige até o local para realmente ver quais os degraus foram retirados e avaliar a situação. Me sinto bem seguro para expressar o que realmente penso.

Escadas no Pico Paraná.

Na coluna anterior afirmei que o errado continua errado mesmo que toda a humanidade o apoie e o certo continua certo mesmo que todos o repudiem. Isto sempre será válido e escolho racionalmente entre o quente e o frio, longe de mim o conforto do morno.

– Os degraus foram instalados na trilha em duas situações bem diferentes; em 1996 o CPM, preocupado com a erosão na trilha instalou alguns degraus nas encostas mais íngremes que também serviram para aumentar a segurança destes mesmos locais. Mais recentemente o Nativo “Ronaldo Franzen” instalou muitos outros com sua fiel furadeira de impacto para “diminuir o impacto” – nas palavras dele próprio.

– Acredito na sinceridade e boas intenções dos dois agentes, mas não dá prá falar em ética. Ambos tomaram atitudes isoladas (clubes não tem direitos divinos), ao arrepio da lei e por conta própria – bem ao estilo de quem foi até lá e retirou os degraus.

– Se tratado como via, o trecho em discussão foi conquistado por Maak/Mysing/Stamm em 1940 que não viram nenhuma necessidade de grampeá-la e nem deixaram instruções para isto.

– Os padrões atuais de ética foram definidos pela Declaração de Tirol em 2002, que é de onde precisamos tirar os princípios para analisar esta situação. Intervenções deste tipo só se justificam quando há risco de degradação nos terrenos adjacentes. É exatamente esta a justificativa para instalar os degraus usada tanto pelo CPM como pelo Nativo. Sem os degraus naquela posição, os passantes procurariam as laterais e derrubariam as caratuvas que se apóiam numa fina camada de húmus. Este também é o argumento dos contrários.

Esta análise precisa ser mais abrangente porque a intenção não deve ser apenas proteger um pequeno trecho, mas a trilha como um todo. 56 anos sem e 13 anos com degraus já nos permite tirar conclusões precisas:

– Realmente os degraus salvaram algumas caratuvas e o pouco de húmus existentes sobre as rochas nas partes mais expostas da trilha. Mas estas facilidades eliminaram as poucas defesas naturais da montanha e tornaram o Pico do Paraná num local de peregrinação para multidões de aloprados. Nestes 13 anos a trilha se transformou numa valeta com mais de 60cm de profundidade (em muitos lugares), enormes barreiros, arvores centenárias tombaram com suas raízes completamente expostas, uma infinidade de clareiras e um cume devastado. Antes dos degraus apenas meia dúzia de “kamicases” acampavam no cume, agora dormem lá desde as mais variadas congregações religiosas (que sobem usando paletó e gravata) até expedições comerciais. O início da descida para o Tupipiá se transformou num bosteiro.

– O degrau preservou a pedra em que foi instalado, mas detonou todo o caminho até ela e depois dela. A contenção de encostas e a drenagem dos atoleiros realmente funcionaram na face oeste do Caratuva, mas não resistem nas encostas a leste que são muito frágeis, instáveis e estão detonadas, o Fio-de-Ligação está se esfacelando e também está vindo abaixo todo o trecho antes do A2.

– Os degraus se tornaram facilitadores desta invasão e muita gente ficaria em casa se eles não existissem, ou fariam o ataque do A1 diminuindo consideravelmente o impacto. Muitos mais se contentariam com o Caratuva que já está praticamente perdido em função das antenas e do incêndio ou o Itapiroca, ambos com acesso pela face oeste, muito mais estável e resistente. Não haveria necessidade de proibições, cotas ou vigilância, a montanha estaria aberta àqueles que fizerem por merecê-la.

– Legalmente o Dílson apenas cobra estacionamento e permissão de passagem por propriedade particular e não é responsável por nada que ocorra fora de suas terras e ainda pode impor penalidades a quem quebrar as regras. Pior que isso: a responsabilidade pela manutenção e integridade das benfeitorias é exclusiva de quem as instalou, então se algum Mané quebrar o pescoço porque um degrau se soltou a responsabilidade é daqueles que ali o colocaram numa falsa promessa de segurança.

– Quem retirou os degraus não comprometeu a segurança daqueles que ainda não passaram pelo escalão. A retirada dos degraus aconteceu sem isolar ninguém no cume, então todos que subiram depois disto estão cientes dos riscos que assumiram. Não existe penalidade para esta situação.

– Os degraus não foram doados ao Parque que legalmente não os pediu, não os aceitou e nem os registrou no patrimônio. O Parque, que inexiste fora do papel, juridicamente os desconhece e os considera como objetos abandonados – lixo. Retira-los não se configura em roubo ou vandalismo. Implantar facilidades urbanas naquele local é que deveria ser crime, se de fato já não o é.

– Errar é humano, insistir no erro é burrice. Em 1996 pareceu uma boa idéia, hoje está provado que não funciona naquela situação específica. A grita local se concentra no orgulho ferido: “Fui eu que fiz”, “Não me avisaram” e muitas variantes dessa mesma conversa com melhores ou piores argumentos. Esquecem que não estamos numa quebra de braço para saber quem vai ficar com a montanha. Todos queremos preservar a sua integridade apesar das diferenças.

– Por fim cheguei a uma conclusão sobre a autoria da ação. O sujeito é um HERÓI e deve gostar muito daquelas serras para decidir e executar seu plano, contra tudo e contra todos, contrariando amigos e muitos outros interesses nunca declarados. Amigo, lhe afirmo com convicção que a sua obra deve continuar até livrar a montanha e o país inteiro de todo o entulho acumulado nas mentes das pessoas que insistem em não ver o óbvio. Sei que é pouco, mas sempre terá o meu apoio para praticar o certo.

Crianças, vou para praia que não sou de ferro! Bom carnaval a todos.

 

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Sobre o autor

Julio Cesar Fiori é Arquiteto e Urbanista formado pela PUC-PR em 1982 e pratica montanhismo desde 1980. Autor do livro "Caminhos Coloniais da Serra do Mar", é grande conhecedor das histórias e das montanhas do Paraná.

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