Aconcágua: Um desafio ao alcance de (quase) todos!

Por Pedro Hauck

Muitos dizem que o Aconcágua é uma montanha fácil. Se for levar em consideração apenas aspectos técnicos, ela realmente é. Entretanto, levando em consideração o esforço físico e as questões emocionais, escalar o Aconcágua não é para qualquer um. Entretanto isso não significa que você não possa chegar lá.

Os brasileiros estão entre os estrangeiros que mais visitam o parque provincial do Aconcágua. Alguns deles fizeram história por lá, como Mozart Catão, que subiu ao cume com uma bicicleta, José Luis Pauletto que já foi recordista em velocidade de ascensão e por não dizer, Élcio Douglas, que fez o cume em 3 dias, sem ter ninguém ajudando na logística, sem se aclimatar, sem quase comer e ainda de camiseta.

Entretanto os brasileiros não são bem vistos entre os argentinos no Aconcágua e isso não tem nada a ver com futebol. Diferente destes experientes montanhistas citados acima, o brasileiro é conhecido por tomar estratégias erradas na montanha e não saberem se aclimatar direito, resumindo, os argentinos acham que somos "sem noção".

Claro que não são todos assim, entretanto eu mesmo recebo dezenas de emails todos os anos com pessoas com planos mirabolantes, mas sem terem ao mínimo uma experiência para realizar tal feito. Então, por mais que o Brasil tenha feito história na montanha, não banque o super herói logo de cara, essa é a dica número um.

O Aconcágua é uma montanha cara. É daquelas que é preciso pagar para entrar e isso custa mais de 486 dólares na alta temporada. Ir para Mendoza também custa dinheiro então, se você nunca foi para a altitude antes na vida, tente experimentar algo antes. Isso irá aumentar suas chances de chegar ao cume. Dica número dois.

Agora se você é um cara que já teve uma experiência antes, tem a cabeça no lugar e pretende fazer cume na montanha, terá que obedecer outras dicas que facilitará sua vida no Aconcágua. A mais importante é: Aclimate-se!

Aqui no Altamontanha.com há diversos artigos técnicos sobre o mal de altitude. São artigos técnicos que esclarecem o que é "O mal de altitude", como evitá-lo, que remédios você poderá usar para melhorar alguns sintomas se for acometido deste mal. O mais importante, no entanto, é realizar uma boa aclimatação e livrar-se dele de uma vez por todas.

Entretanto a aclimatação não é fácil. São dias de tédio e dor de cabeça dentro de uma barraca, onde nosso fator psicológico é afetado. Ter saudade de casa, da mulher e dos amigos é o que mais leva as pessoas a desistirem de fazer o cume. Isso não é por menos, pois geralmente as pessoas levam em média 16 dias para subir e descer a montanha. Então se prepare para reduzir os efeitos da saudade.

Todo este tempo na montanha significa ficar sem acesso à comida fresca. Quem acampa e caminha nos fins de semana e feriados por nossas serras verdes no Brasil, sabe como é ficar enjoado de comidas desidratadas e macarronada instantânea disponíveis nos supermercados, pois bem, com a altitude isso só piora… (Veja o que comer nas montanhas)

É impressionante como ficamos frescos em relação à alimentação em altitude. Para isso não há segredo, leve o que você gosta de comer. Felizmente hoje em dia temos disponível no mercado brasileiro as comidas liofilizadas, que são saborosas e fácil de preparar, sem falar que são super leves. Com elas é possível você levar para cima comida como batata recheada, strogonof de frango, camarão, lombo defumado e ainda comer morangos liofilizados de sobremesa! Tudo isso com o sabor original destes alimentos (saiba mais sobre o que são liofilizados).

Outra dica é em relação ao equipamento. Não necessariamente você precisará levar o mais caro, mas dê preferência ao mais confortável, para começar pelas botas. Não adiante você levar uma bota robusta para fazer o longuíssimo trekking de aproximação. Ele não será necessário e apenas deixará seu pé cheio de bolhas. Dê preferência à uma bota leve e confortável. Na altitude a coisa muda é obrigatório o uso de botas plásticas.

As barracas devem ter um espaço de avanço, onde você deixará suas botas e outros equipamentos. Este é um pequeno espaço entre sua casa e o ambiente externo. Deixe as estacas de sua barraca em casa, elas são um peso inútil na altitude. Compre cordelete de escalada e amarre em sua barraca. Na montanha, amarre estes cordeletes em outras pedras e faça um muro com elas ao redor de sua barraca, isso o protegerá do vento.

Não há segredos quanto às vestimentas. Lá funciona bem o esquema das "camadas". Use uma roupa segunda pele por abaixo de tudo, com um tecido grudado ao corpo, em seguida use uma blusa de polar e por cima dela o anorak, que te protegerá do vento. O mesmo serve para as pernas. A diferença é que geralmente eu apenas uso uma segunda pele e por cima já calça. Esqueça cuecas, elas só servirão para assar sua virilha, aliás, esqueça tomar banho! (saiba mais sobre a tecnologia dos tecidos de montanha).

Já seu saco de dormir deve ser obrigatoriamente bom. Não pense que existe barraca térmica, o que irá te manter quente lá em cima é seu saco de dormir e o isolante térmico (saiba mais).

Um outro segredo é o fogareiro. Esse papo de que não pode usar ele dentro da barraca é um mito e se você achar que isso realmente vai te matar asfixiado, então nem vá para a montanha, pois lá é impossível usar estes equipamentos em ambiente externo.

Eu recomendo fogareiros à gás, pois estes são mais limpos e não entopem com muita facilidade. Os fogareiros à benzina são bons, mas têm defeitos, eles precisam ser aquecidos e isso gera fuligem e pode queimar sua barraca, eles também entopem muito e geralmente são verdadeiros maçaricos, sendo que não há um meio termo, ou são fortíssimos, ou desligam…

Fogareiros na altitude são fundamentais, não servem somente para fazer comida, mas sim para fazer água, ou você acha que ela vai estar em estado liquido lá em cima!?

Não adianta falar de tantas dicas sem dizer o principal. De que adianta saber tanto se você não está preparado fisicamente para subir? Pois bem, o melhor treino é, nos meses que antecederem sua expedição, faça montanhismo regularmente. Ponha a mochila nas costas, ao lado de seu parceiro de montanha e vá caminhar nas serras e morros de nosso país. Fazer trilhas assim contribui para o treino especifico e também para você ficar um cara "safo", que está preparado para as piores situações, que sabe arrumar desmontar acampamento e arrumar a mochila rapidamente, que cozinha bem com poucos recursos e está acostumado em dormir na barraca e, além disso, tem psicológico para agüentar os dias de isolamento longe da civilização.

Agora se você não tem como ir para a montanha com regularidade, faça exercícios aeróbicos, corra, pedale, melhore seu condicionamento físico, isso vale muito mais do que puxar ferro, entretanto, prefira a primeira opção.

Em quase dez anos de experiência em montanhismo de altitude, fui para o Aconcágua duas vezes. Na primeira eu fui pela rota normal em estilo alpino, sem mulas e sem ninguém para ajudar, fiz cume. Na segunda eu fui da mesma forma para escalar o glaciar polacos. Acabei não chegando no cume por que as condições de gelo estavam péssimas. Então fica aí a dica final, sempre, mas sempre mesmo, respeite a condição de tempo e da montanha, isso foi uma coisa que não aprendi só no Aconcágua, mas sim nas mais de 30 montanhas que estive nos Andes durante este tempo.

Nos Andes é comum a pressão baixar à tarde e ocorrerem tormentas, por isso é recomendável acordar cedo e fazer todas as coisas pela manhã, inclusive o cume, saindo de madrugada para alcançar o topo e voltar antes das tormentas da tarde.

Leia atentamente todos os artigos técnicos (Segurança e Risco, Técnica e prática) que estão linkados à esta pequena revisão sobre o Aconcágua. Elas são dicas valiosas não só sobre esta montanha, mas como para todas de altitude, não deixe também de adquirir gratuitamente nosso guia de equipamentos para o Aconcagua.