Na primeira vez em que estive nos altos do Papagaio, o acesso era outro, pelo hoje proibido Retiro dos Pedros. Tinha pela primeira vez chegado em Aiuruoca, o vilarejo mineiro próximo à Serra, quando ocorria uma manifestação contrária à contaminação dos rios pelo mercúrio dos mineradores. Foi esta a ocasião em que conheci Badoglio, um senhor amante da natureza muito respeitado na cidade.
Nossa ida foi gloriosa. Subimos a serra no velho jipe de Badoglio, junto com uma provisão de porco assado e conhaque Cointreau. Claro que já fomos nos alimentando na subida e nem sei como pudemos caminhar tão bem a seguir. Era inverno, o tempo estava ótimo, mas tínhamos saído tarde.
Meu filho pequeno me acompanhava, até que seu tênis estourou. Tive de levá-lo nas costas – mas não foi por longo tempo, pois logo a seguir discernimos o vulto escuro do veículo. O retorno foi divertido e, no dia seguinte, seguimos para o PN de Itatiaia, à busca do Agulhas. A ascensão foi novamente ótima e fotografamos Badoglio no cume, junto com o cruzeiro que então existia.
Nem recordo quanto tempo se passou depois disso. Eu havia me separado de minha esposa, assídua e entusiasmada companheira de caminhadas. Deixei de sentir aquela ânsia pela natureza que me acompanhara por tantos anos. Até que resolvi voltar ao Papagaio junto com minha nova esposa, era a primeira montanha depois de muito tempo. Já agora o acesso era pela encosta da Mata do Fogão, longo e cansativo. O dia estava feio e frio.
Chegamos por fim a um campo recoberto de arbustos de poejos. A partir dali, já estaríamos na crista da serra, onde alternaríamos trechos de mata e de rocha, numa sucessão maravilhosa, até contornar a corcova final da montanha. Mas eu estava simplesmente aborrecido, naquela névoa gelada. Pensei que não devia ter vindo, que deveria retornar, mas decidi esperar exatos ¼ de hora.
Pois foi no último minuto que o vento abriu afinal uma janela de azul no céu. Concluí que era um sinal de que deveria retomar minha relação com a natureza, abandonada há tantos meses. Foi naquele percurso que avistei as misteriosas pirâmides dos Três Irmãos. Eu depois as procurei por anos e, ao enfim achá-las, fiz delas assunto de uma das primeiras colunas desta série (e de outra, logo antes desta).
Retornei depois a Aiuruoca e pensei em visitar Badoglio, de cuja casa me lembrava. Subi a escada e lá estava ele, quase igual ao que fora. Comentamos sobre os tempos passados, perguntei sobre o Agulhas e, para minha surpresa, abriu de pronto uma gaveta onde estavam aquelas fotos do cume. Ele as guardara, junto com um artigo na primeira página do jornal local, por todos aqueles anos – bem junto de sua mão, de seu coração.