História do mosquetão

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O mosquetão é um dos símbolos do montanhismo no Mundo e seu nome compõe o título do principal prêmio do montanhismo brasileiro – Mosquetão de Ouro, e incrivelmente a história da criação desse produto é desconhecida no meio montanhístico.

A atividade de escalar montanhas remonta ao final do século XVI, mas com grandes diferenças em relação ao alpinismo moderno. As primeiras escaladas, como a do Mont Blanc em 1786, eram muitas vezes realizadas apenas com trekking até o cume e, embora contasse com inúmeros desafios, era realizada com o mínimo de técnica possível.

No final do século 19, diferentes grupos de montanhistas de toda a Europa começaram a praticar escaladas em suas falésias locais e em pedregulhos próximos aos grandes centros urbanos. Essas técnicas foram então transferidas para as montanhas maiores, principalmente nos Alpes, onde foram empregadas para chegar aos topos de montanhas ainda não conquistadas. E com a entrada dessas técnicas esportivas, iniciou-se uma busca por equipamentos que oferecessem um mínimo de facilidade e proteção ao alpinista.

Patente de um projeto de Mosquetão de 1897

A primeira patente de um item parecido com um mosquetão surgiu em 1868 com o registro de “oval de metal”, sendo provavelmente construído em aço, tendo então um gatilho que poderia ser aberto, sendo que nessa primeira versão, para fora. Este mosquetão “rudimentar” acabou rotulado como anzol, e não se destinava a escalar, mas provavelmente apenas para conectar uma corrente à uma corda.

Outra versão de uma patente de mosquetão surgiu em 1897, registrada como “gancho automático” e novamente era construído em aço. Este equipamento possuía dois pontos de conexão, um que podia ser acessado pelo gatilho com mola e outra, abaixo, com uma argola fechada para amarrar cordas.

No entanto, o nome do mosquetão remonta muito antes desta primeira patente, sendo derivado da frase alemã “karabinerhaken”, que significa no sentido mais literal “gancho de carabina”. As formas mais antigas desses ganchos foram usadas pelos fuzileiros de carabina alemães durante as Guerras Napoleônicas no início do século XIX. Esses fuzileiros, apelidados de carabineiros, usavam os ganchos automáticos para conectar sua bandoleira ao rifle e prender itens à bandoleira ou ao cinto, e o nome parece ter ficado.

No início do século 20, a aplicação do mosquetão havia mudado completamente, pois os alpinistas se viam limitados a se prender a uma corda e, em seguida, não haviam maneiras fáceis de passar sua corda em proteções contra quedas.

Para se entender melhor, na época, a proteção de escalada consistia basicamente em amarrar uma corda em torno de um bloco preso em uma fenda, ou em tocos de madeira e de chifres presos em fendas na rocha, sem deixar de passar essa corda pela que estava na cintura do escalador. Todo o processo ficava então muito lento.

Com o surgimento dos pitons, os escaladores precisavam de uma maneira de prender a corda ao piton de forma mais ágil e sem a necessidade de soltar a corda da cintura e sem se expor ao risco de uma queda.

Mosquetão de Rambo Herzog, no museu de Montanha de Messner

Você provavelmente assistiu aos filmes do Rambo né? Acredite ou não, John Rambo (interpretado por Sylvester Stallone) não é o Rambo original. Esse apelido pertence a um lendário alpinista alemão chamado Otto Herzog (1888 – 1964). Seu apelido, “Rambo”, é um encurtamento do termo alemão Ramponieren, que significa “bater ou bater”. Foi, aparentemente, a sua determinação e determinação na resolução de dificuldades que lhe valeram este apelido.

Voltando a história do mosquetão, “Rambo” Herzog teve a idéia de usar um “karabinerhaken” durante sua escalada por volta de 1910, quando ele viu uma brigada de incêndio de Munique usando estes clipes ovais, fabriados em aço, em seus cintos. Ele adotou a ideia, criando o primeiro mosquetão de escalada do mundo, embora as primeiras versões de sua invenção não fossem confiáveis ​​- os gatilhos eram feitos para serem facilmente abertos com uma mão, mas não ficavam bem fechados durante a subida.

Seguindo as migalhas, verificamos que no início do século passado, uma empresa com sede em Munique, na Alemanha, produziu um dos primeiros mosquetões específicos para uso em altura, para proteção em escadas pelos bombeiros – que pesava 130 gramas – os mosquetões atuais pesam menos de 20 gramas!

Pierre Allain produzindo seus mosquetões.

Mas foi por volta do início da década de 30 que finalmente foi utilizado o alumínio na fabricação dos mosquetões, através das mãos do escalador francês Pierre Allain (1909-2000), sem dúvidas um dos mais importantes nomes da história da escalada em todo o mundo.

Piere Allain não inovou apenas no mosquetão de alumínio, mas também nas sapatilhas de escalada, no uso da pluma de ganso nas jaquetas e nos sacos de dormir, nos sistemas para rapel e etc. Podemos falar que se Pierre Allain não tivesse decidido escalar quando jovem, muito provavelmente a escalada não estaria no mesmo nível atualmente.

No final da década de 1930 e no início da Segunda Guerra Mundial, muitas empresas dos Estados Unidos e da Europa passaram a fabricar versões em alumínio do “mosquetão automático clássico”, para uso em armamentos. Nesse período percebe-se um grande aumento no número de fabricantes, provavelmente empresas que tinham as ferramentas e equipamentos para fabricar um item que estava em demanda pelo governo, sendo vantajoso para várias empresas diferentes aceitaram contratos por curtos períodos de tempo.

Mosquetões de Pierre Allain

À medida que a cultura da escalada começou a se enraizar no mundo durante o período pós-guerra e início dos anos 50, os alpinistas começaram a sonhar com objetivos mais específicos, mais difíceis e técnicos, e acabaram utilizando muitas dessas ferramentas militares para conseguirem escalar as grandes rochas.

Yvon Chouinard durante escalada.

Muitas das primeiras lendas da escalada começaram com pitons e mosquetões militares. No entanto, em 1957, um alpinista americano havia decidido que havia demanda e necessidade de algumas ferramentas muito específicas para o alpinismo. Esse escalador era Yvon Chouinard, e os produtos era pitons e mosquetões fabricados em uma forja à carvão de segunda mão e vendidos no porta-malas de seu carro. porém eram produtos inovadores, mais leves e mais fortes. Esses produtos mudaram a forma da escalada em rocha no mundo permitindo as grandes escaladas de parede, como as paredes maciças do Vale de Yosemite. A empresa de Yvon Chouinard, posteriormente, foi adquirida pelos funcionários da empresa, e recebeu o nome de Black Diamond.

Ao longo dos anos setenta, oitenta e noventa foram criadas muitas variações diferentes do mosquetão. Foram testados inúmeros projetos estranhos com padrões retorcidos ou uso de alumínio oco. Atualmente, os engenheiros ainda exploram novas ligas de metal e diferentes formas para diminuir o peso e aumentar a resistência, porém ainda hoje, a grande inovação do mosquetão, e que permitiu o avanço da escalada, foi a de Allain Pierre, com a utilização de ligas de alumínio em sua produção.

É a esse francês pouco conhecido que devemos agradecer por escalarmos paredes com o rack de equipamentos pesando pouco…

Pierre Allain produzindo seus mosquetões.

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Sobre o autor

Hilton Benke é um dos idealizadores do AltaMontanha.com. Dono de uma personalidade muito forte, é hoje praticante assíduo do voo livre, principalmente da modalidade "hike and fly", que une o voo com o montanhismo. Como montanhista e escalador, gastou seu tempo galgando montanhas brasileiras e andinas, além de ter prestado alguns serviços como instrutor de escalada junto ao CPM. Deixá-lo feliz é fácil: só marcar um bom pernoite em um cume da Serra do Mar Paranaense, com um bom menu para o jantar e uma condição de tempo boa para que possa decolar com seu parapente dia seguinte e realizar uma das muitas travessias sobre a Serra do Mar.

1 comentário

  1. Antônio Gouveia em

    Percebam que na parte da etimologia vocês não usaram a palavra “mosquete”, por isso MOSQUETão. Ficou totalmente sem sentido.
    Essa etimologia também não é confirmada.
    Abraço.

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