Os Animais Conscientes

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A desconsideração dos animais como seres conscientes e sua exploração como meios de produção ou pesquisa é uma das terríveis práticas da vida atual. O texto a seguir é grandemente uma colagem adaptada de algumas passagens do historiador Yuval Harari, autor de Sapiens e de Homo Deus, dois livros perturbadores.

Com as revoluções agrícola e industrial, os animais de criação deixaram de ser vistos como criaturas vivas capazes de sentir dor e sofrimento e passaram a ser tratadas como coisas mecânicas.

A fim de converter bois, cavalos e camelos em animais de carga obedientes, seus instintos naturais e laços sociais tiveram de ser destruídos, sua agressão e sexualidade, contidas e sua liberdade de movimentação, restringida.

Tabela de Conversão Alimentar Avícola (Fonte: www.engormix.com.br)

Na pecuária, o confinamento, a castração, o corte ou perfuração do focinho, o abate ou separação precoce das crias foram práticas usadas para este fim.

Galinhas poedeiras, por exemplo, têm um mundo complexo de impulsos e necessidades. Elas sentem desejos intensos de explorar seu ambiente, procurar alimento, construir ninhos e cuidar da aparência.

Mas a indústria muitas vezes as confina dentro de gaiolas minúsculas e não raro espremem quatro delas numa única célula. Recebem comida suficiente, mas são incapazes de reivindicar um território ou construir um ninho. A gaiola é tão pequena que não conseguem nem mesmo abrir as asas ou ficar eretas.

O Confinamento Industrial das Galinhas (Fonte: www.eucomosim.com)

As suas crias consideradas imperfeitas são retiradas numa esteira e asfixiadas em câmaras de gás, jogadas em trituradores ou simplesmente no lixo, onde morrem esmagadas.

Na exploração de gansos e patos, estes são imobilizados em celas mínimas, para evitar qualquer movimento. Um cano força sua alimentação através do pescoço. Nele é bombeada uma mistura de milho, gordura e sal. Um anel é então colocado no pescoço para evitar que as aves regurgitem.

Ganso Alimentado para a Produção de Patê (Fonte: diariodebiologia.com)

Após um mês de dieta equivalente num humano a 12 kg diários, o fígado torna-se gigantesco e fica pronto para extração. A tortura finalmente termina com a morte dos animais para a produção de patê.

Nos laboratórios de pesquisa, cobaias são forçadas a inalar produtos químicos, têm seus dentes e ossos extraídos, são sujeitas à radiação, têm as peles removidas e os genes manipulados, são dissecadas vivas, torturadas e mortas. As vítimas preferidas são ratos e coelhos, cães e gatos, cabras e macacos.

Pesquisa bem-sucedida em gato (Fonte: abusodeanimais.blogspot.com.br)

Os porcos estão entre os mamíferos mais inteligentes e curiosos, com fortes impulsos para socializar, brincar e explorar o entorno. Foi a evolução que os fez assim.

Para poder sobreviver em ambiente selvagem, javalis precisavam percorrer vastos territórios, familiarizar-se com seu meio e acautelar-se contra predadores. Tinham também de comunicar-se e cooperar com seus companheiros, formando grupos comandados por matriarcas velhas e experientes.

Os porcos, descendentes dos javalis, herdaram sua inteligência, curiosidade e aptidão social. Mas as fazendas industriais adotam a prática de confinar porcas lactantes dentro de celas tão pequenas que elas são incapazes de se virar, muito menos caminhar ou procurar alimento.

Criação Confinada de Suínos (Fonte: ruralpecuaria.com.br)

As porcas são assim mantidas dias e noites por quatro semanas depois de parir. Sua prole é então retirada para engorda e elas voltam a ser inseminadas para a próxima safra de leitões.

Porcas costumam demonstrar frustração aguda, alternada com extremo desespero. Uma porca típica suportará até dez ciclos desses, até ser abatida.

Muitas vacas leiteiras passam a vida dentro de um pequeno cercado, pisando, sentando e dormindo sobre o próprio excremento. Recebem alimento e medicamento de um conjunto de máquinas e são ordenhadas por outro conjunto delas.

Ordenha Mecânica de Vacas (Fonte: www.yellowpages.com.au)

A vaca é tratada como pouco mais do que uma boca que consome matérias primas e um úbere que produz uma mercadoria. Tratá-las como máquinas tende a lhes causar desconforto físico, estresse social e frustração emocional.

Numa fazenda industrial, imediatamente após o nascimento, o bezerro é separado da mãe e trancado numa jaula minúscula, onde passa o resto da vida.

Curva de Ganho de Peso Bovino (Fonte: www.cpt.com.br)

Nunca sai de lá, não pode brincar ou caminhar, de modo que seus músculos não se desenvolvem – causa de uma carne macia e suculenta. A primeira vez que o bezerro tem uma chance de caminhar e tocar outros animais é a caminho do matadouro.

A evolução implantou nos bezerros – e nos demais mamíferos sociais – um intenso desejo de brincar e estar junto da mãe. O que acontece se um fazendeiro separa a bezerra da mãe, a coloca numa jaula, a alimenta e depois a fecunda com o sêmen de um touro?

Objetivamente, a bezerra já não precisa do vínculo com a mãe, nem de companheiros de brincadeira, para poder sobreviver e reproduzir. Mas, subjetivamente, ainda sente um intenso impulso de estar com sua mãe e de brincar com outros bezerros.

A Tristeza do Bezerro Desmamado (Fonte: www.milkpoint.com.br)

Se esses desejos não forem atendidos, a bezerra sofrerá demais. O que há de trágico na agricultura industrial é que ela só se ocupa das necessidades objetivas dos animais, mas negligencia as subjetivas.

Uma necessidade formada pela evolução natural nos animais continuará a ser sentida subjetivamente, mesmo quando não mais necessária para a sobrevivência nas fazendas industriais.

Alimentação de Ovelhas Confinadas (Fonte: Divulgação)

Foi somente meio século atrás que a importância central das necessidades emocionais dos animais foi reconhecida. Numa série de famosos e cruéis experimentos, bebês macacos foram separados das mães e isolados em jaulas.

Quando lhes era oferecida a opção entre um manequim de metal com uma garrafa de leite, imitando a mãe, e outro de pano macio sem o leite, os macacos se agarravam à mãe de pano macio.

A Preferência do Macaco pela Mãe de Pano (Fonte: www.brasilpost.com.br)

Assim, a necessidade de ligações emocionais era tão forte que os macaquinhos abandonavam o boneco de metal com alimento e se voltavam para o único objeto que parecia capaz de atender àquela necessidade.

Os mamíferos não podem viver apenas de alimento. Eles precisam igualmente de ligações emocionais. No caso, como as mães de pano nunca correspondiam à sua afeição, os macaquinhos contraíram problemas sociais e psicológicos e ao crescer se tornaram adultos neuróticos e antissociais.

Hoje, milhões de animais de fazenda são sujeitos às mesmas condições dos macacos do experimento, quando as crias são separadas das mães para viverem em isolamento. Eles existem como parte de uma linha de montagem mecanizada.

O Fim da História (Fonte: www.veganos.com.br)

Assim, os animais são degradados da condição de seres conscientes que merecem respeito, à posição inferior de mera propriedade produtiva dos homens.

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Sobre o autor

Nasci no Rio, vivo em São Paulo, mas meu lugar é em Minas. Fui casado algumas vezes e quase nunca fiquei solteiro. Meus três filhos vieram do primeiro casamento. Estudei engenharia e depois administração, e percebi que nenhuma delas seria o meu destino. Mas esta segunda carreira trouxe boa recompensa, então não a abandonei. Até que um dia, resultado do acaso e da curiosidade, encontrei na natureza a minha vocação. E, nela, de início principalmente as montanhas. Hoje, elas são acompanhadas por um grande interesse pelos ambientes naturais. Então, acho que me transformei naquela figura antiga e genérica do naturalista.

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