Cavalos

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Faz tanto tempo, eu era um menino de quatro anos, mas a lembrança continua vívida: minha primeira vez a cavalo. Era uma égua enorme chamada Conga, que agora se aproximava do seu potro recém-nascido. Ficou nervosa querendo vê-lo e começou a relinchar. Aterrorizado, eu não sabia o que fazer em cima dela. Mas, de alguma forma, ela acabou se afastando e acalmando. Dizem que só aprendemos a cavalgar depois da primeira queda. Levou tempo para isto acontecer, já era um rapaz acostumado com os cavalos. Mas acho que quando aprendi mesmo a cavalgar foi logo daquela primeira vez.

Dentre os animais domesticados, o cavalo é aquele que talvez tenha tido a evolução mais interessante, por conjugar ao longo de milênios as adaptações em sua forma às mudanças no ambiente. Na mesma época em que apareceram os ancestrais dos cães e gatos, existiu 50 milhões de anos atrás o hyracotherium (ou eohippus), o precursor dos cavalos.

A Evolução Genética do Cavalo

Era um animal vegetariano semelhante a um cão: pescoço e pernas curtas e uma longa cauda. Tinha dedos nas patas, com almofadas plantares. A sua alimentação baseava-se em frutas e folhagem de árvores. A única modificação por milênios foi na sua dentição, cujos molares se adaptaram à moagem das plantas.

Mas, à medida em que o clima ficou mais seco e as florestas cederam espaço aos campos, estes animais cresceram (de 1½ vezes) e passaram a se apoiar em um só dedo. Surgiu então o mesohippus há 30 milhões de anos, dotado da velocidade necessária aos novos espaços abertos.

A Variação da Pata e do Molar do Cavalo

Depois, o cérebro cresceu, os molares se revestiram e fortaleceram com cristas, e os ossos e os músculos adaptaram-se à maior agilidade. Os cavalos tinham agora o dobro da altura. Novos ligamentos mantinham a falange única estável, facilitando a corrida em terrenos difíceis. Este foi o merychippus, de 15 a 10 milhões de anos atrás, que saiu das florestas para habitar definitivamente as planícies.

Surgiram várias linhas evolutivas simultaneamente há talvez 5 milhões de anos, das quais originou na América do Norte os primeiros cavalos modernos equus. Eles tinham corpos grandes e alongados, cabeças compridas, uma única falange ou casco, ossos fundidos sem qualquer rotação, ligamentos fortes e flexíveis. Cresceram para três vezes o tamanho original.

A Evolução dos Animais Ungulados

Há dois milhões de anos, emigraram para a Europa, África e Ásia. Aos poucos, perderam as listas de zebra, as grandes fossas nasais, os crânios de burro e as crinas eretas. Durante o Pleistoceno, foram extintos nas Américas onde tinham surgido, mas continuaram prosperando no resto do mundo.

A família dos cavalos inclui o asno e a zebra, cujos cruzamentos produzem híbridos estéreis. São parentes das antas e rinocerontes. Os cavalos foram domesticados nas estepes da Ucrânia e do Cazaquistão 5.5 mil anos atrás. Foram usados como montaria e como tração, seja nos trabalhos e nos transportes e, infelizmente, na alimentação. A domesticação sem dúvida causou perda de sua diversidade genética.

O Extinto Cavalo Tarpã da Tartária

As antigas manadas selvagens foram desaparecendo, por captura ou domesticação. Até meados do século XIX ainda existia a raça Tarpã, cavalo pequeno, sedutor e veloz originário do Tártaro, provável antecessor da raça Árabe. As mágicas pinturas equinas nas cavernas de Lescaux poderiam representar os ancestrais dos tarpãs. Procura-se agora recriar esta raça desaparecida, por exemplo através dos cavalos Heck, que têm uma aparência primitiva, sobretudo na pelagem.

As Raças de Antigamente

Existe ainda hoje a raça Przewalski, nome de um explorador russo que a descobriu na Mongólia nos fins do século XIX. São cavalos primitivos, pequenos e robustos.

A raça Árabe é uma das mais antigas, usada universalmente no melhoramento genético, dada sua velocidade, estrutura e resistência. Exemplos são o quarto de milha e o puro sangue inglês – neste último caso, todos surpreendentemente descendem de apenas três garanhões árabes.

A Raça Quarto de Milha, Considerada a Mais Veloz

No Brasil, os cavalos Mangalarga têm também sangue árabe (junto com outra meia dúzia de raças). Os animais Mustang cavalgados pelos índios norte-americanos não eram primitivos e sim ibéricos. Os índios Nez Percé desenvolveram a partir deles os Appaloosa, de pelagem sarapintada. Dizem que a população equina é de 75 milhões, distribuída por 100 raças e linhagens.

A Raça Shire, a Maior do Mundo

Os cavalos são animais sociais, originalmente viviam em grupos controlados por matriarcas. Elas impunham disciplina, afastando os membros rebeldes. O isolamento deixava os membros excluídos vulneráveis a predadores, até que fossem readmitidos. A genética dos cavalos dependeu basicamente das fêmeas, não dos machos.

Considere que são animais de defesa, historicamente perseguidos por predadores, por isso sua reação instintiva é o medo e a fuga. Para tal, possuem excelente propulsão, velocidade, resistência e agilidade.

Anatomia do Cavalo: Ossos e Músculos

Apresentam grande variação de tamanho, desde alturas de 80 a 170 cm e pesos de 200 a 600 kg. As pelagens têm uma incrível diversidade, do zaino e rosilho ao alazão e do palomino e tordilho ao baio. Apesar disto, são curiosamente semelhantes em sua forma física, com corpos poderosos e elegantes.

Acho que o tamanho impede que sua expressiva linguagem corporal seja percebida. Comunicam-se pelos movimentos do focinho, orelhas, cabeça e patas – e pelos sons como suspiros, roncos, resfolegos e relinchos. São cordiais, assustados, brincalhões, emotivos e leais.

Os Cavalos de Fogo de Jorge de Lima

Os sentidos dos cavalos são intensos e diversos. São talvez os mamíferos com os maiores olhos – sua altura e separação permitem uma visão de quase 360° e um longo alcance. A acuidade é menor do que a nossa, exceto no escuro. Suas grandes orelhas movem-se variada e separadamente, garantindo excelente orientação.

O olfato é aguçado, com alcance e nitidez. Assim como com os cães, ele parece comandar o paladar. O tato é amplo, distribuído por todo o corpo. Dizem que a parte mais sensível do cavalo é o focinho – de fato, muitas das doenças se manifestam por ele, como a pulmoeira. Cavalos são afetados por anemias, gripes, tosses e cólicas.

Comparação entre as Idades do Cavalo e do Homem

Não vivem muito – de 25 a 40 (ou normalmente 30) anos. Mas fico pensando na égua Conga com que esta coluna começou. Eu já era adulto e cavalgava sua neta, a potranca Valsa – a linhagem tinha nomes de dança. Ela herdara muito de sua aparência. Conga não viveu tanto, mas sobreviveu na sua descendência. Como os ancestrais dos tarpãs, imortalizados nas paredes das cavernas.

O Melhor Cavalo é o Nosso

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Sobre o autor

Nasci no Rio, vivo em São Paulo, mas meu lugar é em Minas. Fui casado algumas vezes e quase nunca fiquei solteiro. Meus três filhos vieram do primeiro casamento. Estudei engenharia e depois administração, e percebi que nenhuma delas seria o meu destino. Mas esta segunda carreira trouxe boa recompensa, então não a abandonei. Até que um dia, resultado do acaso e da curiosidade, encontrei na natureza a minha vocação. E, nela, de início principalmente as montanhas. Hoje, elas são acompanhadas por um grande interesse pelos ambientes naturais. Então, acho que me transformei naquela figura antiga e genérica do naturalista.

1 comentário

  1. Os cavalos são animais únicos.
    Têm a potência, os músculos, a velocidade, a força, mas , a despeito disso,
    têm também toda uma história de humildade e servidão.
    E como se tudo isso não bastasse, restam aqueles olhos lânguidos, grandes e bondosos…

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