A conquista do Pico do Meio na Serra Grande de Ortigueira

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Caixa do livro de Cume no Pico do Meio

A história começa há mais de uma década, quando iniciei minhas peregrinações pela Serra dos Agudos. Naqueles tempos fazíamos a Travessia São Jerônimo/Pico Agudo (hoje esquecida) partindo do sítio do Frater Andrez Truber e cruzando o belíssimo vale do Rio Esperança até nosso Templo Maior. Era uma travessia do balacobaco, porém desconfio que as trilhas não existam mais.

As estradas eram precárias. Chegar ao pé do P.A. (via Lambari), somente em um 4×4. O jeito era enfrentar quilômetros de caminhada, seguida por muito colonhão, samambaia e unha de gato. O prêmio pelas gotas de suor e sangue derramadas (bem como pelas roupas e mochilas rasgadas) era o visual incrível daquelas montanhas agrestes, frequentadas por poucos.

Desde meu primeiro contato com a Serra, fixei como meta percorrer todos os seus cumes. De lá para cá, estive no Agudo, Agulha de Maack, Taff, Serra Grande, Serra Chata e no último dia 30, no Pico do Meio (1.135 metros s.n.m. segundo a Carta  MI-2785-3 do IBGE). Resta o Portal.

Pois bem. Planejamos a trip na véspera. A meta era fazermos o Pico do Meio, o Portal e acampar na Serra Grande. Demos uma rápida olhada no Google Earth e decidimos ir pelo distrito de Briolândia.  Preparei areia, cimento e o tubo para o Livro,  pegamos a triton do meu pai e decidimos sair de Rolândia às 4h.

Às 3h30 meu cunhado Lucas Zerbinati já estava na porta de casa! Fiz o mate, acordei o Thomas (meu filho de 13 anos) e partimos! A viagem transcorreu bem até o Bairro dos França onde ficamos parados para abastecer até o posto abrir. Neste meio tempo descobrimos que o estepe havia sido roubado. Se o pneu rasgasse na Serra, estaríamos fodidos! Fizemos figas e seguimos em frente.

A estrada até Briolandia é tranquila. O trecho mais off-road começa após um grande reflorestamento. Engatamos 4×4 e eis que a viatura travou. Bate cabeça, problema resolvido e alcançamos o colo entre a Serra Grande e o Pico do Meio próximo às 8h. Nosso nível de cortisol já estava altíssimo.

Vara mato na crista do Pico do Meio.

Sem delongas, partimos em direção a crista da Montanha. Após transpormos um trecho de colonhão (me lembrei do Pico Agudo, no início) ingressamos em um belíssimo fragmento de mata nativa que envolve toda a parte superior da Montanha. A presença de exemplares de Peroba, Gabiroba, Canjarana, Caviúna, Ingás, Xaxim, etc. indicam que a área nunca foi desmatada.

Após uma hora de caminhada, ingressamos nos campos da parte superior da Montanha. A partir daí a coisa ficou desgastante! A vegetação é um emaranhado claustrofóbico de unha de gato, samambaias (Pteridium arachnoideum), capim gordura, lianas, arbustos e bromélias  espinhentas (Dyckias)… Cada metro percorrido nos custava um esforço descomunal… Não havia nenhum indício de presença humana por ali, fato posteriormente confirmado pela Lucrécia Guerreiro, Guia de turismo, nascida e criada na região, bisneta de colonizadores.

Serra Grande, Rio Tibagi, Pico Agudo e Serra Chata.

Enquanto recobrávamos o fôlego, decidi subir em um arbusto para nos situar. Foi aí que me deparei, ao Norte, com o visual inédito do Rio Tibagi atravessando a Serra Grande e o Pico Agudo e, ao Sul, consegui avistar (uns 300 metros acima) o Perau que antecede o Cume! Estávamos indo bem…

Quando alcançamos o Perau, identificamos uma rocha saliente, excelente ponto para instalação do Livro. Decidimos seguir um pouco mais acima até o Cume que é amplo e oferece um lindo visual do lado ocidental e sul do Pico. Trata-se de uma área coberta por vegetação virgem com altura média de 1,20 metro, salpicada de arbustos e dracenas. É o espaço ideal para futuros acampamentos!

Dali, decidimos retornar para a Pedra que havíamos escolhido para o Livro. Enquanto eu preparava a argamassa, o Thomas assinou o livro de ponta cabeça… Poderia ter arrancado a página, mas nem pensamos nisso: Estávamos mais ocupados em processar toda aquela intensidade existencial! Guardamos o Livro, assentamos o Tubo, fizemos um lanche e descansamos um pouco… Decidimos abortar o Portal e, perto das 11h, retornamos.

Por razões óbvias, a descida foi mais tranquila. Perto das 12h conhecemos a turma da Lu e do Rato (Edilson Marques Reis) que haviam cruzado Tibagi de barco para acampar na Serra Grande! Eles confirmaram que a Fazenda foi comprada pela COPEL para fins de reflorestamento mitigatório em decorrência do alagamento provocado pela Usina Mauá. A sede da propriedade já foi demolida.

Perto das 14h30 decidimos subir a Serra Grande. Às 16h já estávamos com nosso acampamento montado. Caminhamos tranquilamente pelo cume observando ângulos maravilhosos do Agudo. A noite, céu limpo, estrelas cadentes e as espirais da Via Láctea ao alcance dos olhos… Fomos dormir realizados! Às 5h30 o despertador do Thomas tocou. Ele saiu da barraca e não voltou mais… Às 6h saí para ver o alvorecer emoldurado por um mar de nuvens fodástico!

Contemplamos a paisagem, tomamos um café, desmanchamos o acampamento e às 9h nos despedimos do pessoal. Graças à Deus, o pneu não furou, a embreagem não travou e às 12h30 chegamos em Rolândia para almoçarmos com a Família em uma boa Churrascaria! Valeu, Thomas e Lucão! Missão cumprida com louvor.

O retorno para a casa depois da longa jornada.

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Sobre o autor

Advogado graduado pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), empresário e corretor de imóveis em Rolândia-PR. Casado, três filhos. Conselheiro Ambiental por dez anos e Vereador (2001-2004), autor do Código Ambiental do Município de Rolândia. Integrou o Grupo Escoteiro Guarani (46-PR) por mais de 10 anos; Montanhista e Jardineiro nas horas vagas. Apaixonado pelos Agudos do Tibagi, no Norte do Paraná.

11 Comentários

  1. Geraldo Barfknecht em

    Paulo, acompanho-o desde as primeiras jornadas na Serra Grande e no Ybiangi (que é o nome correto, do Guarani Antigo, em cartografia jesuítica de 1632) do “Agudo “( que convenhamos enche-se vários balaios com esse nome) e que bela jornada vez! Um detalhe, 1135 m, é marco geodésico colocado pelo IBGE. Ou seja, medida de alta precisão e a carta, nada mais fez, que resgatá-la. Pena, que até hoje, nãos ei a trilha, caminhos para o Morro do Taff e do Paredão, creio, o segundo é nome mais antigo. Perdoe-me, mas há mais um templo, da região N do PR, raramente comentado , mas muito visitado.Quanto ao do Meio, esse sim, creio que o Maack esteve nele e possivelmente, no no Pontão e não esteve, com certeza no topo Ybiangi, 1180 m+/- 2 m (nome assumido, pelo mapa do século XVII, veja o que escreveu o Getúlio Vogetta, após nossas conversas), ou do correto Guarani Antigo, Ibiãji. Fiquei em dúvida, Briolandia, deve ser alguma localidade alem da histórica Natingui/ N. Sra. da Incarnacion, redução do Guairá devastada em 1629.

    • Grande Irmão Geraldo, Saudações!

      Em primeiro lugar muito obrigado pelo carinho e pelas valiosas informações! Estão todas anotadas para meus futuros escritos sobre esta maravilhosa Serra Norte Paranaense. Gostaria, se possível, de ter acesso a esta Carta e documentos! Em relação ao Morro do Taff, o acesso se dá por São Jerônimo da Serra (via Terra Nova). O cume é extenso e há, inclusive, nascentes, vale e uma sede de Fazenda nesta belíssima Montanha. Deveras, trata-se de uma elevação com visuais belíssimos! Na região também vale a pena visitar os imponentes Saltos do Tamanduá. No mais, coloco-me à sua inteira disposição para o que for necessário! Fraternalmente,

      Paulo Augusto Farina

      • Caro Paulo, saudações!

        Gostaria muito de conhecer o Morro do Taff. Pelo jeito você conhece bem.
        Poderia me ajudar com dicas? Como chegar? Onde ficar? E por aí vai…

        Obrigado!

  2. Olá, Daniel!

    O Taff se localiza em São Jerônimo da Serra. O acesso é pelo Distrito de Terra Nova. O cume é bem amplo: Há nascentes, córrego, pastagens, currais e a sede de uma Fazenda. Infelizmente, não tenho mais os contatos dos proprietários. Se for passear lá, julgo prudente se anunciar na sede da propriedade. Na região, tbm vale a pena conhecer os Saltos do Tamanduá! Abraços!

  3. Reginaldo micali em

    Olá Sr farina!!
    Fomos eu Reginaldo micali e meu amigo ARi até pico caviúna pela trilha da serra gde ,chegamos lá tirando cobras nas pedras tomando sol e chegamos no tubo do livro !!
    A caneta enferrujou e o caderno tava úmido !!
    Mais tem um desbarrancamento lado lateral que sai na estrada que põde servir de trilha pro caviúna

  4. Paulo Augusto Farina em

    Grande Reginaldo, saudações!

    Fico muito feliz com esta notícia e agradeço por compartilhá-la conosco! Até onde tenho notícia, vocês são a segunda equipe a atingir a Face Norte da Serra Grande! Esta ravina que vc se refere (entre o colo do Caviúna e do Guarani) é por onde descemos para retornar à Face Sul. Pretendo repetir a Travessia e irei providenciar um invólucro zip-lock e uma caneta para o Livro do Caviúna. Fraterno Abraço e Parabéns!

  5. No pé do Morro do Taffo na região da Gabiroba, Terra Nova, Paraná meu bisavó Antônio Alves Da Silva viveu com sua família a muitos anos atrás, época que tudo era quase que inóspito.

  6. Saudações senhores…

    Meu nome é Isaías Santos, sou empresário em Curitiba, bacharel em Direito, e me permitam fazer parte da conversa.
    Fiquei muito feliz em descobrir todas essas informações trazidas pelos senhores.
    Vídeos, indicações dessas serras que é um tesouro e, deve ser protegido como a menina dos olhos por nosso estado paranaense.
    Essas serras, fazem parte da história da minha vida. Meus avós, pai, mãe, tios. nasceram e viveram nessa região.
    Foram desbravadores desde antes da segunda guerra. Não sei exato, quanto tempo antes. nem como chegaram ai. Infelizmente, sei pouco do passado deles.
    Eu nasci no cinco (ai do lado) em 1967, mas em 1977 fomos trazidos para Curitiba. Sou o mais novo de vários irmãos.
    Meus pais sofreram muito nessa região. Perderam o que tinha com o fogo que passou queimando tudo em 1963. Vivi ouvindo detalhes da história!
    Muitas pessoas morreram, inclusive vizinhos (famílias inteiras) que eram como família pra eles. Foi um tempo muito difícil, sem recursos, sem tecnologia e etc.
    Meus pais perderam cinco crianças , por doenças como infecção de garganta, triste né?
    Estive aí em 2015, e o que senti nesse lugar foi inexplicável. Uma emoção muito forte! O tempo passou, mas quase nada mudou com relação a conservação ambiental!
    Que bom , porque quero visitar muito mais vezes esse lugar. É muito sofrido chegar aí hoje. Imagina no tempo deles!
    A história deles, sempre vai queimar em meu peito. Porque eu sei o quanto meu pai gostava dessas serras!
    Obrigado por compartilharem todas essas riquezas de detalhes e imagens. Vocês agora, tem mais um seguidor aqui. Abraço a todos.
    Meu contato: @isaiasecompania

    • Grande Isaias, saudações! Agradeço por compartilhar sua história conosco! De fato, se ainda hoje, trata-se de uma região bucólica e campestre de nosso Estado, imagine antes de 1945! A Serra Grande (apesar de ser a última fronteira do Montanhismo Norte Paranaense) pelas dificuldades citadas, continua conhecida por poucos e assim permanecerá, creio, por mais alguns anos… Fraterno Abraço de Rolândia!

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