A História do Himalaismo Brasileiro – Parte VIII

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Oitava parte do especial sobre o histórico das expedições brasileiras às maiores montanhas do mundo…

::Leia o especial sobre a História do Brasil no Himalaia desde o começo.

:: Leia a sétima parte do Especial Brasil no Himalaia.

Texto: Rodrigo Granzotto Peron

Explicação Inicial

Desde 2001 todo ano tivemos alguma expedição brasileira ao Everest (tradição mantida por Rodrigo Raineri em 2008). Diversas vezes, como em 2002, 2004, 2005, 2006 e 2007, ocorreram várias expedições simultâneas. Toda vez que esse fato tiver ocorrido, irei colocar cada expedição num capítulo à parte, para poder tratá-las de forma mais adequada.

Em 1991, por exceção, as duas participações brasileiras no Everest foram relatadas num mesmo capítulo, mas esse tratamento teve sua razão de ser, já que ambas estavam intimamente ligadas. Thomaz Brandolin organizou sua equipe, da qual Niclevicz tentou fazer parte, mas foi rejeitado (Everest, O Diário de Uma Vitória, p. 42). No afã de ser o primeiro brasileiro no ápice do mundo e de evitar que outros culminassem antes, Waldemar conseguiu ser encaixado de última hora em expedição francesa. Como se nota, as duas participações nacionais eram para ser uma só, mas resultaram em duas aventuras distintas, uma em cada lado da montanha. Por estarem tão ligadas é que as coloquei em um tópico só.

Capítulo 23 – EVEREST 2002 (8.850m)

Paulo Coelho e Helena Coelho, na já tradicional para eles rota normal tibetana, foram fazer uma das atividades que mais curtem: desfrutar o Everest. Chegaram na montanha no dia 20 de abril e montaram os acampamentos normais para o Flanco Tibetano.

Tiveram problemas sérios no dia 16 de maio, quando a barraca no acampamento 2 foi carregada por fortes ventos, deixando-os desamparados e sem vários itens importantes. Repetiu-se o problema no dia 23, com destruição total de outra barraca colocada no mesmo local. Desta vez, contudo, os brasileiros estavam prevenidos e levaram junto com eles a barraca que estava no colo norte, e assim puderam se abrigar nas subidas e descidas do processo de aclimatação e dos ataques ao cume.

No dia 25 de maio de 2002, em sua investida ao cume tiveram que parar a 8.400 metros, devido ao frio extremo. No dia seguinte as previsões meteorológicas eram sombrias, com vários dias pela frente de nevasca e temperaturas em queda. Em face desse cenário desanimador voltaram para casa no dia 29.

Nesta investida atingiram a maior altitude que o casal alcançou em todos os tempos. Também foi o recorde de altitude brasileiro sem oxigênio engarradado no Everest até então (esse recorde somente foi batido em 2006, por Vitor Negrete).

Capítulo 24 – EVEREST (8.850m) &, LHOTSE (8.511m) 2002

2002 foi declarado pela ONU como Ano Internacional das Montanhas.

Para comemorar a ocasião, Waldemar Niclevicz, de novo na companhia de seu parceiro de cordada Irivan Gustavo Burda, forjaram uma expedição double header para o Everest e o Lhotse.

O primeiro destino foi o Chomolungma, pela rota padrão nepalesa, no período pós-monção, correspodente ao outono do Nepal, no segundo semestre.

Além da dupla tradicional, reforçavam o time Marcelo Santos, o “Bonga” (que já tinha participado da bem sucedida expedição ao Trango), Paulo Souza, o “Máfia”, e Alir Wellner. Quatro escaladores sherpas (um deles cozinheiro) davam apoio à equipe.

A expedição foi permeada de pequenos incidentes. Bonga teve problemas dentários, e necessitou de tratamento, Wellner apresentou problemas gastro-intestinais.

Mas o evento mais grave deu-se no dia 2 de outubro de 2002, quando Irivan, Niclevicz e os sherpas Mingma Nuru e Mingma Tshering estavam rumando para a conquista, utilizando oxigênio suplementar. Por volta dos 8.200 metros estourou uma avalanche que pegou Nuru e Burda e os arrastou encosta abaixo, por cerca de 150 metros. Conseguiram parar antes de desabarem no abismo. Mas esse evento foi uma espécie de “aviso” que, aliado aos fortes ventos e a temperaturas gélidas (segundo relatos de Niclevicz, -30ºC dentro das barracas), demoveu o time de tentar o cume. O ponto máximo atingido foi 8.250 metros. Dois dias depois, voltaram suas atenções para o gigante vizinho: o Lhotse.

Superado o susto, partiram em busca do Lhotse, quarta montanha mais elevada do mundo, desvirginada em 1956 pelos suíços Ernst Reiss e Fritz Luchsinger, pela rota tradicional na face oeste. Até o início deste ano apenas 326 cumes foram registrados, quase todos pela rota padrão. As únicas pessoas que subiram por via diferente o fizeram pela perigosa e tecnicamente difícil face sul, em 1990, forjando a rota iuguslava (de Tomo Cesen) e a rota russa (de Serguey Bershov e Vladimir Karataev).

Para trocar o Everest pelo Lhotse os brasileiros precisaram unicamente olhar para o lado direito da rota, já que as duas montanhas compartilham todos os acampamentos. Do último campo, no colo sul, o alpinista decide se vai para a esquerda (Everest) ou direita (Lhotse).

Irivan e Waldemar, no dia 5 de outubro de 2002, acordaram cedo e foram buscar o cume do Lhotse. Seguiam a trilha que ia sendo aberta por expedição sul-coreana liderada por Lee Se-Jung, e que botou no cimo quatro sul-coreanos e dois sherpas. Por volta das 9:30h os brasileiros estavam no cume, tendo utilizado oxigênio suplementar na escalada, cerca de uma hora após a conquista dos coreanos. Waldemar Niclevicz, em seu site pessoal, descreve a chegada ao cume: “Subimos esses últimos 40 metros, que pareciam não terminar nunca, e levamos um susto imenso, ao perceber o quanto agudo é o cume, realmente um pico suspenso entre o céu e a terra, onde cabem apenas duas pessoas, bem apertadinhas. Precipícios por todos os lados. Paredes verticais despencando no vazio. A vista deslumbrante por todos os lados. Montanhas e mais montanhas”.

Para Irivan o Lhotse representou o primeiro cume de 8.000 metros. Já para Waldemar, o seu sexto cume 8.000 diferente, enriquecendo o currículo. Para o Brasil, a primeira escalada do Lhotse. Para a América do Sul, a segunda subida, apenas atrás do argentino Tomas Heinrich, que havia culminado em 1998.

Capítulo 25 – ISLAND PEAK 2003 (6.189m)

O paulista Carlos Alberto Tramontina, jornalista e repórter da Rede Globo de televisão há 30 anos, sem qualquer experiência prévia em montanhismo, resolveu em 2003 ir ao Himalaya para tentar o Imja Tse, mundialmente conhecido como Island Peak. Em entrevista concedida ao site da Sá Editora, em 2004, comentou: “Eu nunca tinha dormido numa barraca! Sempre fiquei em hotéis, com ar condicionado, lençol cheirosinho…”

A montanha escolhida não apresenta grandes dificuldades técnicas e é escalada como preparação para o Everest (a primeira ascensão, em 1953, foi para aclimatar para o Chomolungma, que seria conquistado logo em seguida). Fica ela entre o Glacial Lhotse e o Glacial Lhotse Shar, como prolongamento sul do Lhotse Shar (8.400m). Os que chegam ao seu cume são brindados com linda visão da parede sul do Nuptse e do Lhotse (à esquerda) e do Shartse (à direita).

Após trekking pelo Nepal, na companhia de diversos outros brasileiros, Tramontina se juntou a Manoel Morgado, José Hélio Beraldi, e aos sherpas Bhai e Sonam, e foi tentar a sorte no Imja Tse no final de março. A rota de subida foi a tradicional, pela face sudeste por meio da aresta sudoeste, com acampamento-base a 5.000 metros e um campo de altitude a 5.600 metros.

Na madrugada de ataque ao cume, com a temperatura a -12ºC e um vento constante, acharam que seria imprudência prosseguir e resolveram dar por finda a aventura e retornar em segurança para o Brasil. Uma aventura e tanto para alguém inexperiente em termos de alpinismo, contada por Carlos Tramontina em detalhes no livro A Morada dos Deuses.

Capítulo 26 – EVEREST 2003 (8.850m)

Paulo Coelho e Helena Coelho novamente foram ao Everest, na rota padrão tibetana, sem oxigênio suplementar. O primeiro dia no acampamento-base foi 19 de abril, com montagem do acampamento-base avançado a 24 de abril e o campo 1 a 30 de abril.

Uma forte tempestade no dia 11 de maio arrasou a barraca do campo 1, levando embora todas as roupas, equipamentos, fogareiro, comidas e utensílios. Essa catástrofe, aliada aos fortes ventos e ao clima instável, fizeram o casal desistir de mais essa empreitada, após 40 dias na montanha. O ponto máximo atingido foi 7.600m, no dia 29 de maio.
:: Continua..

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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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