Escalando em Andradas – Parte I

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As várias encostas rochosas existentes na região de Andradas transformam o local num verdadeiro paraíso para os amantes da escalada em montanha.

A região de Andradas, no sul de Minas, é realmente um local espetacular para quem gosta de uma boa escalada, onde é possível escalar desde vias com até 250 metros de altura ou pequenas vias esportivas, que traduzem as dificuldades do granito em seus pequenos regletes.

Era quarta feira, véspera de um dos muitos feriados que tivemos ao longo do mês de abril de 2009. A idéia surgiu devido a visita do amigo e também colunista Maximo Kaush e também, graças a teimosa previsão de chuva para a região do Pico do Marumbi, o que impediria qualquer escalada mais interessante naquelas montanhas.

O Pedro, que só confirmou sua ida aos 58 do segundo tempo,  acabou nos dando uma substancial carona, além de que, como já conhecia um pouco o local, nos possibilitou escalar durante os cinco dias em que nos hospedamos no excelente Abrigo do Pantano (sem o acento mesmo), de propriedade do sempre prestativo Jacaré.

Chegamos já na quarta feira à noite no local. Na quinta, não tão cedo quanto queríamos, decidimos iniciar nossa escalada no conhecido Morro do Elefante, pela via 5.15.

Apesar do nome sugestivo, a via é apenas um 5º graus com lance máximo de Vsup, e aproximadamente 200 metros de comprimento. Nossa escolha foi para evitarmos uma via de graduação muito alta, uma vez que não conhecíamos nem a rocha e nem àquelas montanhas.

E, após terminarmos nossa escalada, tivemos a certeza de que fizemos uma boa escolha. A via é excelente, numa linha muito bem pensada pelos conquistadores, onde se inicia numa grande laca, totalmente protegida por móveis, passa por uma parede com uma inclinação um pouco menor e finaliza em um Vsup muito interessante, de regletes, aonde chegasse num pequeno trecho de costão que nos leva ao topo do Morro. O rapel foi tranqüilo e a linha da via oferece a possibilidade do rapel com apenas uma corda. No retorno ao carro, após correr por um longo trecho, conseguimos escapar da chuva, que quase nos alcançou!

Na sexta feira, acompanhados do Jacaré, escalamos no Morro do Boi. Desta vez nos dividimos em duas equipes: Pedro e Maximo escalaram a “Supreme a Cubana”, um 6º VIsup, segundo o celga, de tirar o fôlego, enquanto eu e o Jacaré escalamos a “Irmãos Rocha”, 6sup VIIa, que conforme meu companheiro e as aranhas existentes no diedro em negativo do início da via, estava a muito sem uma repetição.

Combinamos que o Jacaré guiaria as duas primeiras cordadas, cabendo a mim, as restantes. A primeira cordada é toda protegida em móvel, numa linda linha ligeiramente abaixo do diedro em negativo (veja foto), possibilitando lances em fenda, oposição e regletes.

A segunda cordada, conforme o croqui, nos reservava o crux em 7a da via logo no início, e num lance que, no caso de queda, forçaria a corda a um fator 2. Mas com toda a calma do mundo, o Jacaré guiou o lance e prosseguiu novamente pelo diedro em negativo, onde quase em seu final, passou por um pequeno tetinho, chegando a 2ª parada.

Coube a mim guiar a terceira cordada. Olhei o croqui, dizia VIsup, porém a cara do Jacaré não escondia que o tramo exigiria um pouco mais. Iniciei com uma pequena transversal a esquerda, uma proteção num camalot 2 e cheguei a uma linha bem vertical, com chapas espaçadas de 4 em 4 metros.

Prossegui com a escalada, costurei a primeira chapa, subi um pouco mais e percebi que a minha impressão da cara do Jacaré estava correta. Perguntei a ele se ele lembrava-se dos lances a seguir e este me disse que não, que algumas agarras haviam quebrado, o que acabou mudando um pouco o grau da cordada. Mentalmente xinguei o Jacaré por não ter me avisado antes, desci um pouco o lance, até ao ponto que fosse possível o Jacaré travar a corda e analisei melhor a linha via. Feito isso, consegui transpor essa passada, mas o crux não acabava aí.

Já na próxima proteção, pedi ao Jacaré que travasse novamente para que eu pudesse observar o trecho. Agora parecia ainda mais difícil, e levai algum tempo até encontrar visualmente um reglete de lado, cerca de 3 metros acima e, que a meu ver, seria um bom ponto para que eu conseguisse costurar. Mas, como nem tudo que é pensado na teoria é igual a prática, no momento que cheguei ao reglete, este ainda estava longe da próxima chapeleta.

Pensei novamente comigo mesmo: “Não vou cair!” E tentei o próximo lance, meio que no escuro, onde subi os 30 cm que me faltavam para a segurança da próxima chapa. Não tive dúvidas e pedi mais uma vez que o Jacaré retesasse a corda.
O lance seguinte pareceu mais fácil e logo depois, uma pequena barriga na parede evitava que eu avistasse as próximas passadas.

Segui com a escalada, protegi em mais duas chapa, agora sem parar para pensar, e numa pequena travessia a direita, cerca de 3 metros da última costura, um pequeno cristal que servia de apoio para meu pé direito quebrou, me levando a queda.

Ô cristal FDP pensei na mesma hora em que gritava “QUEDA” ao Jacaré. Logo retornei ao lance e percebi depois que, cerca de 50 cm acima do ponto em que o cristal rompeu, uma linha de regletes trazia muito mais tranqüilidade para a escalada.

A próxima cordada já era mais tranqüila, sendo no geral um 4ºsup, mas com duas passadas de 5º. O único problema é que literalmente não havia proteções. Foi uma no início da enfiada, mais para o psicológico, com um camalot 0,75, onde ainda ouvi o Jacaré gritar: “Não coloca muito na direita senão é capaz de quebrar a laca inteira!” E outra no final, numa fenda aberta, com camalot 2.

A partir daí era um costão de IV sup, em mais duas cordadas, sem proteção alguma pelo caminho, e logo chegamos ao topo. De longe conseguíamos ouvir o Pedro e o Maximo, que ainda escalavam a via escolhida por eles. Não demorou muito, e ambos chegaram ao topo, para que pudéssemos descer unindo as duas cordas.

Sábado foi o dia para escalarmos na Pedra do Pantano. Pedro e Maximo tentaram entrar numa via chamada Insônia, em A2, num grande teto, mas a vegetação que tomou conta de parte da linha acabou com a esperança dos dois. Aí entraram na Tendências Sociofóbicas, um 7a muito exposto e em móvel.

Eu e o Jacaré resolvemos escalar algumas das vias esportivas do Morro. O destaque desse dia foi a via Nini Van Pren, um (segundo o croqui é 5º grau) que sinceramente, sugiro a mudança de nome para ‘Quinto dos Infernos’! Conforme o pessoal comentou, muitas das agarras da via quebraram-se, transformando-a num 7ª doído…

Os detalhes eu conto na próxima coluna!

:: Escalando em Andradas, Parte II.

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Sobre o autor

Hilton Benke é um dos idealizadores do AltaMontanha.com. Dono de uma personalidade muito forte, é hoje praticante assíduo do voo livre, principalmente da modalidade "hike and fly", que une o voo com o montanhismo. Como montanhista e escalador, gastou seu tempo galgando montanhas brasileiras e andinas, além de ter prestado alguns serviços como instrutor de escalada junto ao CPM. Deixá-lo feliz é fácil: só marcar um bom pernoite em um cume da Serra do Mar Paranaense, com um bom menu para o jantar e uma condição de tempo boa para que possa decolar com seu parapente dia seguinte e realizar uma das muitas travessias sobre a Serra do Mar.

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