A trajetória do Espinhaço está agora chegando aos limites do norte de Minas. Antes de deixar o Estado, ele atravessa um grande espigão, onde foi criado um Parque ainda em desenvolvimento, com movimentados campos rupestres e infinitos campos gerais, cercados por muita água bonita.
Serra Nova é o nome de um antigo vilarejo de apenas 300 pessoas, que você conhecerá meio isolado numa colina. Fica no sopé da parede de um dos mais novos parques de Minas. É uma vila curiosa, com construções tanto novas como velhas, e que parece cercada por uma estranha expectativa – ela deve mudar muito no futuro, quando o parque que leva seu nome se tornar conhecido.
Depois de criado, o PE da Serra Nova foi ampliado para 50.000 ha, abrangendo os municípios mineiros de Rio Pardo, Porteirinha e Serranópolis (veja o mapa anexo). Estas são vilas medianas, que convivem com as asperezas e os espaços do Espinhaço.
O PESN tem um formato retangular no sentido N-S, a orientação básica do Espinhaço. Com comprimento de quase 60 km, apresenta no seu bordo interior ou oeste de Porteirinha uma impressionante parede. Nela o quartzito exibe uma feição mais homogênea ou menos fraturada. Já no lado leste de Rio Pardo de Minas, ele mostra encostas mais verdes e suaves. Sua largura é modesta, menos de 9 km na média. A altitude deve ser próxima de 1.050m.
A paisagem predominante são os campos rupestres. Normalmente, suas plantas apresentam adaptações ao ambiente árido, com folhas espessas e troncos lenhosos. Neles o endemismo tende a ser elevado. Há hoje a tendência de considerar os campos rupestres como um novo bioma, como por exemplo o cerrado.
Mas há também no PESN regiões mais florestadas, com matas, cerrados e caatingas, especialmente quando surgem grotas ou nascentes. A fauna é a usual do Espinhaço. O Parque pertence às bacias do São Francisco a oeste e ao Pardo e Jequitinhonha a leste.
O curso mais interessante talvez seja o Rio Mosquito, que corre para o Pardo, o maior rio da região. Este é caudaloso e piscoso, começando em Montezuma e encontrando o mar em Canavieiras após 565 km. Ele é um rio rural em Minas e urbano na Bahia. Curiosamente, sua foz fica a menos de 15 km ao norte da do Jequitinhonha. Suas águas avançam mar a dentro, dando ao ambiente uma estranha coloração parda.
Acho que o único momento em que fez frio naquele fim de semana de agosto aconteceu às seis da manhã. Foi quando encontrei, num posto de gasolina em Porteirinha, as demais pessoas que tinham sido convidadas ou que se convidaram (como foi o meu caso) para atravessar o PESN. Partimos de ônibus no início da manhã do sábado e retornamos no fim da tarde do domingo.
E foi uma esplêndida travessia: depois de boa estrada desde Porteirinha, chegamos na parede da serra por onde jorram suas mais famosas quedas, as Cachoeiras do Serrado, com 100 m de altura. São sete as cachoeiras, precipitando-se sucessivamente rio abaixo. Com toda a sua extensão e seu desenho irregular, a parede mostra um aspecto dramático.
Mas nosso objetivo era galgar a serra e logo começamos a subir uma trilha íngreme e nítida no meio do cerrado, embora com piso variável, com pedras de tamanhos, posições, cores e formatos díspares. Pois assim é a natureza diversa das rochas do Espinhaço, que parecem sobreviventes de uma catástrofe.
Com duas fortes subidas sucessivas somando um ganho de talvez 600m, alcançamos os campos rupestres, decorados por uma vegetação expressiva e assentados sobre a mais branca das areias. Eram um antigo local de garimpo, ainda com presença de pequenos cristais de quartzo numa colina.
Dalí atravessamos uma ravina rochosa, com suas paredes inclinadas acompanhando a trilha por ambos os lados. Era uma passagem, desses lugares onde não paramos, mas foi para mim a mais bela visão de toda a caminhada, como se fosse um portal mágico.
Pois era de fato um portal: abriu-se para os altos dos Gerais de Santana, a 1.300m, com um panorama dos amplos campos de gramíneas à frente. Agora era o momento de descer longamente à esquerda, até a Graminha, excelente local de acampamento, ao lado de um poço e próximo a uma cachoeira.
Foram ao todo 15 km de caminhada, inicialmente a leste para penetrar na serra, e depois a sul, para percorrê-la. Se você quiser atravessar o Parque para o outro lado, basta prosseguir por mais 12 km no rumo leste, descendo os Gerais até a portaria de Rio Pardo. Foi aqui que ele começou e logo falarei deste local.
Mas nosso destino era outro, seguimos agora por 12 km de uma estrada aberta para combater o fogo, passamos pelas formações rochosas e isoladas das Duas Torres, até chegarmos à ponte molhada do Rio Mosquito.
Caminhamos então no sentido do vale do Rio Mosquito, até chegar à Cachoeira das Sete Quedas. Ela é uma sucessão de cascatas intercaladas com poços, onde o ímpeto das águas repousa sucessivamente em doces remansos. No último deles, avistamos logo acima os paredões da Cidade de Pedra, esculpidos pelo tempo no quartzito.
A partir daí, iniciamos a longa descida na direção oeste pelo vale do Mosquito, que aos poucos vai adentrando as paredes do Cânion do Talhado. Ele é assim chamado pelo corte que parece tê-lo formado. Os paredões são fraturados, desiguais e incrustados de vegetação.
Percorridos 2/3 da garganta, foi o momento de encontrar o Poço da Sereia, uma piscina natural limitada pelas rochas do cânion, cujas águas puras e geladas convidam a um mergulho inesquecível.
Então, depois de 10 km de trilha, encontramos a saída da garganta, onde o ônibus da volta nos esperava. Ao percorrer a estradinha de Serranópolis, a bela e uniforme cor acinzentada de parede da serra brilhava com a luz do poente, realçada pela pirâmide do Pico do Senharol.
Se você deixar Porteirinha no rumo norte de Mato Verde, descortinará as elevações onde está o PE Caminho dos Gerais, que é o último dos parques mineiros. Siga agora para leste e alcançará Rio Pardo de Minas depois de 80 km.
Você estará contornando o Espinhaço pelo alto, com o PESN sempre à sua direita. Depois de Rio Pardo, chegará ao vilarejo de Serra Nova onde o Parque começou e onde existe a sua única estrutura – uma pequena portaria e dois alojamentos.
Se você descesse a leste desde o acampamento da Graminha, chegaria exatamente aqui, por uma rampa pedregosa no cerrado. Mas meu objetivo não era subir, e sim conhecer a queda d´água, chamada de Pedra do Jacaré. É uma delicada formação no Rio Suçuarana, com seu pequeno poço cristalino.
Existe nas proximidades do PESN o Escorrega, com uma sucessão de piscinas ao longo do Córrego da Velha. Ela culmina rio acima com uma rampa, que a água tornou perfeitamente lisa e que permite ótimas descidas até o poço logo abaixo.
O Parque é razoavelmente visitado. A razão é a atração exercida pelas cachoeiras e piscinas dos dois lados da serra, com bons acessos por terra. Preferiria, porém, que no futuro ele fosse mesmo conhecido pelas notáveis trilhas no seu interior.
A seguir, viaje por duas novas áreas – contendo um parque pequeno e acanhado, e uma possível nova reserva que abraça uma serra abrupta, com o ponto culminante de toda a região.
2 Comentários
Quem foi o louco que tirou a cor das fotos?
Assassinou a paisagem.
Um verdadeiro crime.
Espero que consertem
João Bosco
Provavelmente são chapas fotográficas retirada no século passado. Hoje em dia não há mais está técnica de tirar fotos.