O Parque Estadual Mata São Francisco

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Distante cerca de 65km de Londrina e de nome que homenageia o coronel patrono da estação ferroviária local, a cidade de Cornélio Procópio passaria despercebida pra mim não fosse um pequeno detalhe natureba. É lá que se encontra uma pouco conhecida área de preservação ambiental, o “Parque Estadual Mata São Francisco”, formada pelo pouco de Mata Atlântica que restou na região. Ilhado em meio a plantações de soja, trigo e café, o parque é também cortado pelo Ribeirão Araras, importante manancial da região. E foi percorrendo uma tranquila trilha no miolo desta unidade de conservação que se tem uma vaga ideia não apenas de como era o Norte do Paraná quando os primeiros colonizadores chegaram à região; se tem uma boa noção da precária situação dos parques nesse estado.

Após viagem de cerca de pouco mais de uma hora, saltei na rodoviária de Cornélio Procópio por volta das 10:45hr. O busão q partira de Londrina fazia uma breve parada na minúscula rodô pra depois prosseguir jornada rumo Santa Mariana e, finalmente, Ourinhos. No entanto, a minha jornada começava já dali mesmo ao descer td rua principal de modo a alcançar a saída do município. Em tempo, Cornélio Procópio é uma pacata cidade q nasceu as margens da “Estrada de Ferro São Paulo-Paraná”, e q atualmente vive do comércio e da agricultura, seguindo a sina da maioria das cidades do Terceiro Planalto Parananense.
 
Uma vez no asfalto da BR-369, apropriadamente chamada de “Rodovia dos Cereais”, bastou tocar por ela sentido São Paulo, isto é, nordeste. A internet e até portais de Cornélio informam q o parque dista apenas 4km do centro, mas eu contabilizei mais de 6km de chinelada da cidade até a entrada do meu destino. Caminhada tediosa, diga-se de passagem, q singra plantios, cultivos e vastas extensões de lavouras. Panorama basicamente horizontal quebrado as vezes pela presença dum parque de exposições, um aeroporto, um posto policial, o portal de Cornélio, um enorme silo solitário e um posto de gasolina ao longo do trajeto. Da cidade não há sinalização pro parque (esta só surge apenas 500m antes da entrada!), mas a medida q se avança pelo asfalto é possível avistar uma enorme mancha verde que destoa da tonalidade ocre q domina a paisagem da região. Aquele fragmento ilhado é a Mata Estadual São Francisco.
 
Após andar um tanto q pareceu não ter fim, eis q pouco antes do meio-dia piso na entrada do P.E. Mata São Francisco. Como era dia da semana um incrédulo funcionário saiu da guarita de entrada e foi ver quem eu era, além de pedir pra assinar o livro de visitantes, q provavelmente deve ser nulo nos dias úteis. Após me dar as orientações básicas pra passear ali dentro desejou boa caminhada, pra depois dar continuidade ao seu almoço. “Viu, e não sai da trilha! Fica sempre nela senão você vai se perder!”, finalizou. Em tempo, o parque é enorme (tem uma área de 832 hectares) mas apenas o trecho restrito à vereda é permitido. Ir além ou se enfiar mata adentro é permitido apenas a grupos de pesquisa. 
 
Aqui vai um breve histórico do parque, como curiosidade. Desde 1997 pertencente ao governo do Paraná, a Mata São Francisco foi comprada de uma família que era proprietária das terras pela Cia Energética de São Paulo (CESP), na época responsável pela construção das hidrelétricas Canoas 1 e Canoas 2, no Rio Paranapanema, na divisa SP-PR. A CESP comprou e doou ao governo do Paraná como compensação ambiental devido ao alagamento de terras. Com a mobilização de ambientalistas e outros setores da sociedade, a São Francisco permaneceu em pé tornando-se parque estadual e unidade de conservação. Atualmente o lugar conta com estrutura mínima pra receber grupos de visitantes, sala de recepção e vídeo (pra educação ambiental), casa do guarda-parque e dos pesquisadores, sanitários, um quiosque, churrasqueiras e playground.
 
Voltando a visita, me pirulitei em direção pra tal trilha q, resumidamente, mergulha no fundo de vale dum gde afluente do córrego Araras, totalizando menos de 2kms num circuito em formato de “ferradura”. No caminho, sou observado pelo olhar atento dumas corujinhas no meio do caminho, assim como me despertam atenção as simpáticas placas de conscientização ambiental, q fazem referencias à bicharada presente no parque. Alguns exemplares vistosos de vegetação arbustiva e outros de flores locais contrastam com suculentos pés-de-mamão repletos do fruto, elevando-se no meio disso tudo.
 
Uma vez no frescor da mata fresca a paisagem muda totalmente. A vereda se alarga e se estreita, mas é óbvia o tempo todo, bem batida. É preciso cautela pois qdo o chão não ta bem forrado de folhas ou com raízes salientes, o piso se mostra bem escorregadio por conta dum musgo esverdeado bem comum aqui. Mas conforme avanço, sempre descendo de forma quase imperceptível, a vegetação em volta vai aos poucos abafa o som do asfalto pra então dar lugar unicamente ao som da mata. Passarinhos, rugidos de bugios e macaco-prego são comuns. Vale salientar q a Floresta Estacional Semidecidual daqui é bem diferente da Mata Atlântica q estou habituado. Ao invés de exuberante, úmida e flexível a vegetação daqui mostra-se mais espessa, agreste e seca, como q habituada ao clima do Terceiro Planalto Paranaense. Exemplares de cipós espinhentos, guaritá, coração de cegro, cedro, figueira e marfim estão presentes a td momento.
 
Assim, após serpentear um bom tanto da picada, cruzar enormes túneis de croquejantes bambuzais e finalizar num trecho onde a declividade aperta, desemboco num rustico pontilhão de madeira. O Córrego Araras marulha logo abaixo, pra depois seguir seu curso fora dos limites do parque e desaguar no Córrego Laranjinha, alguns kms a leste, além de Sta Mariana. Daqui a picada dá uma volta e retorna por outra ponte, pra novamente subir de encontro ao pto inicial. Contudo, neste fundo de vale é q se encontram os verdadeiros gigantes do parque, na forma de majestosos perobas-rosas exibindo raízes e troncos descomunais. A copa do arvoredo impede totalmente a entrada de luz, tornando o ambiente bem mais  fresco q os demais, onde a única trilha sonora reinante é a do marulhar do córrego, bem próximo dali.
 
A volta se deu por uma vereda com as mesmas características q a anterior, mas q apresentava mais trechos erodidos e muitas arvores tombadas, onde desvios providenciais possibilitavam dar continuidade a pernada. Outra coisa, era difícil parar pra descansar por conta duns mosquitinhos bem chatos, uma espécie de borrachudinho q não te deixa em paz. O último trecho tb é composto por enormes arvores, onde algumas (devidamente serradas) formam assentos naturebas pro andarilho menos condicionado. Resumidamente, o lugar me pareceu semelhante ao PE Ibiporã, porém agradavelmente bem mais rústico.
 
Antes de partir tive uma rápida conversa com o senhor da guarita (q não quis se identificar), q traçou um panorama geral do parque e reflete a situação geral das unidades de conservação no PR. Contou que naquele enorme lugar trabalham apenas 7 pessoas, sendo o guarda-parque o único concursado, q inclusive reside ali; o resto são funcionários de limpeza e vigilantes terceirizados. Relatou dos problemas com caçadores, e q a escassez de recursos fez com q reduzissem os dias de visitação, faltando até dinheiro pro diesel da roçadeiras. Finalizou afirmando q em torno de 300 pessoas por mês visitam o parque, principalmente grupos de estudantes ou famílias q fazem churrasco nos finais de semana. “A lanchonete ta fechada pq não compensa mantê-la aberta! O visitante tem q trazer seu próprio lanche!”, emendou. E eu doido pra comprar algo pra molhar a goela…
 
Me despedi do prestativo senhor e, consequentemente, do PE Mata São Francisco. Olhando por sobre o ombro, impossível não guardar a impressionante imagem da muralha verde do parque contrastando com o tom dourado dos plantios, logo ao lado. Uma linha divisória imaginaria separava os limites da natureza e do homem! E assim comecei minha longa chinelada de volta, onde a esperança de carona era nula. Mas devagar e quase parando consegui chegar em Cornélio Procópio por volta das 15hr, onde encostei num boteco onde finalmente bebemorei a empreitada, enqto aguardava o busão pra voltar pra Londrina.
 
Cornélio Procópio tem outros atrativos como o Mirante Cristo Rei, cartão postal da cidade, além do Bosque Municipal Manoel Júlio de Almeida, uma versão miniaturizada da São Francisco com jeitão de praça, cuja infra lhe garante uso como área de lazer. Contudo, o mesmo parece não ocorrer com o P E Mata São Francisco q, assim como boa parte das unidades de conservação de Londrina, passa por dificuldades devido a escassez de recursos. O parque funciona de quarta a domingo apenas pra não pagar integralmente seus já poucos funcionários. E aqui posso finalizar da mesma forma do texto que redigi sobre o PE Ibiporã, afirmando q a “contenção de despesas” do atual governo estadual é tanta q contraria até um dos principais objetivos duma unidade de conservação: o lazer dos próprios procopenses. Apesar das dificuldades, os funcionários fazem das tripas coração pra manter o lugar operando de forma decente e digna, permitindo q este rara unidade de conservação ainda reluza como um oásis verde no Norte Pioneiro do Estado do Paraná.
 
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Sobre o autor

Jorge Soto é mochileiro, trilheiro e montanhista desde 1993. Natural de Santiago, Chile, reside atualmente em São Paulo. Designer e ilustrador por profissão, ele adora trilhar por lugares inusitados bem próximos da urbe e disponibilizar as informações á comunidade outdoor.

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