Origens e evolução da Serra do Mar

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A Serra do Mar chama muito a atenção de curiosos e montanhistas sobre sua forma. Muitos a chamam de “a cordilheira brasileira”, devido sua característica de ser uma prolongada formação montanhosa que acompanha a costa do Atlântico desde o norte de Santa Catarina ao Rio de Janeiro, onde ela se alinha com a Serra da Mantiqueira que se prolonga até o Espírito Santo.

Serra do Mar do Paraná. Foto Pedro Hauck.

Entretanto é certo chamar a nossa Serra do Mar de cordilheira? Qual teria sido a origem de nossa serra, como ela se formou?

Você também pode acompanhar este artigo através do vídeo:

Na Geomorfologia que é a disciplina que estuda as formas terrestres o termo cordilheira não pode ser utilizado para qualquer cadeia montanhosa, pois necessariamente ela está relacionada com causas genéticas, ou seja, só é uma cordilheira uma cadeia de montanhas soerguida por convergência, isso quer dizer pelo encontro de duas placas tectônicas.

Desta maneira podemos chamar de cordilheira a cadeia de montanhas dos Andes, Alpes, Himalaia. Mas e o caso brasileiro?

Para discutir estas questões temos que inevitavelmente cair em certos fundamentos conceituais das geociências, mas fique calmo! Pretendo neste artigo elucidar estas questões que tanto intrigam nós, montanhistas, com uma linguagem simplificada sem deixar, é claro, de ater-se ao que as pesquisas científicas já produziram sobre esta desafiadora temática.

Escalas de Tempo

O primeiro conceito que causa muita confusão entre as pessoas é a questão das escalas de tempo. Pois tratando-se da evolução de uma paisagem, onde os elementos que à compõem tem cada um, sua própria história com eles têm idades diferentes, mas que em um determinado momento se interagiram e deram origem à um sistema geoecológico. Há uma sobreposição destas escalas.

A Serra do Mar é um belo exemplo desta confusão conceitual. Quando por exemplo estamos falando de um elemento que são as rochas (Geologia) e o relevo (Geomorfologia) e vegetação (bom isso dá um artigo à parte!).

Granito amarelado – Autor: Divulgação

As rochas que afloram na Serra do Mar são generalizadamente ígneas (do grego relativo ao ao fogo) plutônicas (resfriadas em sub-superfície) como os granitos, que são rochas antigas que compões um arcabouço crustal dos continentes.

Muitas pessoas, cometendo um lamentável equivoco, associam os granitos com vulcanismo, como se este tipo de rocha tivessem sido oriundas de vulcões atualmente inativos que “expeliram” o granito.

De maneira algum podemos fazer tal associação. Fazendo uma breve revisão sobre a origem dos granitos percebemos que uma coisa nada tem a ver com outra. Na verdade o granito é uma rocha intrusiva, formada a milhares de metros abaixo da superfície durante um evento de encontro de placas tectônicas do passado.

Os granitos estão relacionados a corpos ígneos, os chamados batólitos, que são corpos plutônicos de grande dimensão e forma irregular. Solidificados, eles formam os granitos, que são rochas são compostas 60-50 % de felspatos, , 25-30% de quartzo e o restante, 25-10% de outros minerais variados, como micas, anfibólios, piroxênios e outros menos importantes. Os variados tipos de granitos se diferenciam enquanto as diferentes concentrações de cada mineral.

Perfil da terra onde se observa diversos corpos ígneos, como Batólito, Lacólito e na superfície atividade vulcânica. A figura acima mostra o que é um batólito e sua relação com vulcanismo. As rochas da Serra do Serra do Mar estiveram numa profundidade de mais de 15 km (muitas vezes até 30 Km) abaixo da superfície, o que significa que o corpo vulcânico que existiu à época da formação do granito foi completamente erodido, daí a confusão entre “Granito e Vulcânismo!”. Fonte: Sobregeologia.com.br

Só para se ter uma ideia da confusão entre escalas de tempo, os granitos que estão aflorando na Serra do Mar são muito antigos, são todos do proterozoico, ou seja tem mais de 600 milhões de anos, em um evento chamado de Orogenia Neoproterozóica Brasiliano Pan – Africano. Estes antigos continentes que se chocaram neste evento se colaram após um intervalo de tempo. Deste evento temos apenas presente na paisagem a rocha, que é um dos resultados deste orógeno colisional, e falhamentos e mega lineamentos que foram exumados e hoje exercem um controle forte no relevo da atual Serra do Mar.

Como estamos falando em escala de tempo, não podemos deixar passar despercebido que a escala de tempo de formação do Granito, ou seja, a rocha, compreende uma escala muito maior e mais antiga que é a escala Geológica que compreende milhares e bilhões de anos. Observe a tabela abaixo e perceba como o tempo geológico é infinitamente maior que o tempo da vida humana.

Veja a escalada de tempo e perceba como alguns elementos da paisagem tem idades diferentes na Serra do Mar: A rocha é do Proterozóico, o relevo é, em partes, do Terciário, mas foi grandemente ressalientado no Quaternário e a vegetação, praticamente holocênica. Fonte britanica.

Gnaisse que forma a Pedra do Santuário em Pedra Bela-SP. O gnaisse é a rocha da Pedra do Baú e do Pão de Açúcar. Foto Pedro Hauck.

Observe que quanto mais recente, mais subdivisões têm a história geológica, isso por que restaram poucos vestígios das épocas mais antigas do planeta Terra, pois quanto mais tempo, mais a rocha sofreu erosão, isso sem falar que a vida é muito recente e ela (fósseis) é essencial para a datação das rochas. Para se ter uma ideia, alguns granitos foram resfriados a mais de 30 quilômetros abaixo da terra e hoje afloram na Serra do Mar a mais de 1800 metros de altitude, imaginem quanta erosão não houve para que isso acontecesse, quanto tempo isto demandou e que esta rocha teve que ser soerguida cerca de 32 quilômetros.

Muitos granitos não resistiram todo este ciclo e tempo, alguns quando foram finalmente exumados chegaram à superfície não mais como granitos, mas sim como outra rocha de constituição química diferente, os chamados gnaisse, que são antigos granitos que sofreram metamorfismo, ou seja, com muita pressão e altas temperaturas a rocha primária sofreu recristalização e/ou deformação em estado sólido, alterando basicamente a estrutura cristalina e promovendo reações metamórficas que podem ou não resultar em novos minerais para se tornar uma outra rocha. Um exemplo clássico de um corpo de gnaisse é o Pão de Açúcar.

Outras escalas de tempo

Se podemos falar em uma escala de origem e transformação das rochas, a escala Geológica, podemos também falar de uma escala de origem e transformação do relevo, a escala Geomorfológica ou Fisiográfica.

Levando em consideração que quando foram originadas as rochas existia todo um sistema de relevo que já foi completamente erodido, o tempo Fisiográfico começa a partir de quando a feição de relevo presente hoje na paisagem surgiu.

Não podemos situar no tempo quando existiu uma transição entre uma idade geológica e uma fisiográfica propriamente dita, entretanto podemos generalizar que isto ocorreu ao fim da Era Mesozoica e começo do Cenozoico (veja a tabela geológica acima) a aproximadamente 60 milhões de anos atrás.

Esta colocação rebate uma outra afirmação que erroneamente aprendemos na escola, a de que o relevo no Brasil é antigo ao contrário dos Andes onde ele seria recente. Este é mais um erro causado pela confusão das escalas de tempo. Como vimos, antigas são somente as rochas, os Andes e a Serra do Mar começaram a evoluir mais ou menos na mesma época, são cronocontemporâneos. Entretanto, aqui temos os vovôs granitos que de sua erosão surgiram rochas sedimentares que preencheram a Bacia do Paraná onde a rocha mais recente é do Cretáceo. Nos Andes, cada vez que um vulcão entra em erupção surge uma rocha novinha em folha!

A tectônica de placas e suas conseqüências

A Crosta terrestre e como é a divisão da terra por dentro.

A crosta terrestre é fragmentada em cerca de uma dúzia de placas tectônicas que se movem por razões não muito conhecidas, fruto da expansão do assoalho de alguns oceanos como conseqüência das correntes de convecção, cujo funcionamento é complexo e foge do objetivo deste artigo.

As placas tectônicas podem ser tanto continentais quanto oceânicas, de acordo com as rochas que as compõem, o que não significa dizer que uma tem que estar submersa e outra não. Em geral as placas continentais têm seu arcabouço geológico formado por granitos e as placas oceânicas por basaltos.

Ao longo do tempo geológico as placas se moveram, colidindo-se e separando-se diversas vezes. De uma maneira geral existe uma tendência em escala geológica de se formar mega continentes, como o Gondwana, que se desfragmentam em outros menores. Têm-se aí o surgimento de novos mares e oceanos e uma mudança contínua da circulação da atmosfera e do clima terrestre.

História dos continentes.

O que nos importa para compreender a origem de nossa Serra do Mar é compreender o resultado do movimento das placas, quando elas se encontram ou se afastam. Também é importante compreendermos que quando isso ocorre há mudanças climáticas e não é loucura imaginar que onde moramos já foi um dia uma geleira, um deserto e até um mar (caso daqui da Bacia do Paraná).

Quando as placas se movimentam uma em direção à outra e se colidem, a placa mais densa (placa oceânica) mergulha sob a menos densa (placa continental). É a convergência de placas que dá origem à cordilheiras montanhosas. Muitas montanhas famosas têm sua gênese conhecida.

O Aconcágua, por exemplo, é um “cavalgamento” de duas placas, há outras montanhas em que houve um soerguimento desigual de uma placa, levantando um lado e submergindo um outro. Outras ainda são o resultado do dobramento de rochas mais brandas e outras são simplesmente vulcões em sua forma clássica e perfeita ou deformado por explosões.

Vídeo que mostra como foi a colisão entre a Índia e a Eurásia que deu origem ao Himalaia. Neste caso ocorre uma colisão entre placas continentais.

O choque provoca dobramentos, deformações e ruptura das rochas (falhas) e o atrito entre as duas placas em direções opostos provoca a fusão das rochas e aumento da pressão, dando origem a vulcões. Observe nas figuras abaixo o resultado da colisão entre placas em diversos ambientes (continente – oceano; oceano – oceano). (Fonte: Para entender a Terra (Press et al., 2006) Bookman – 4a ed.). 

Regiões de borda convergente entre placas oceânicas e continentais em dois momentos. Este tipo de convergência é o que ocorre nos Andes. Observe que no primeiro momento há ocorrência de vulcanismo. No segundo momento ocorre uma segunda colisão de um arco de ilhas com o continente, dando origem ao cavalgamento de placas, dobramentos e falhas. Na superfície há a ocorrência de extensos altiplanos, como o boliviano e a Puna do Atacama.

Regiões de borda convergente entre placas oceânicas. Observe que neste tipo de colisão há a evolução de um arco vulcânico e como consequência a origem de arquipélagos. Este tipo de orogênese é o que ocorre atualmente no Japão. 

Se em uma extremidade há colisão, em outra necessariamente há uma abertura. Chamamos este ambiente de abertura de ambiente de divergência de placas. Um exemplo de divergência foi o que aconteceu no Gondwana, que separada se tornou América do Sul e África. Vejamos como foi esta evolução na figura abaixo:

Divergência entre dois continentes. Fonte Grupo Neotectônica UFPR.

Observe na figura acima que no no local da fissura (Rift), há extravasamento de magma (lava). Dando origem a um tipo de vulcanismo fissural. Este é o vulcanismo que ocorre atualmente na Islândia.

Na Bacia do Paraná no Brasil, houve um evento significativo de vulcanismo fissural durante o Mesozoico, era que engloba o Triássico, Jurássico e Cretáceo, a época dos Dinossauros para quem está menos habituado (ver tabela de escala geológica acima). Este vulcanismo está relacionado com tectonismo e mais especificamente com a desfragmentação do último supercontinente Gondwana.

Quando duas placas se separam, ou seja, se divergem, a fissura formada pela separação é o local por onde o magma ascenderá formando um vulcão fissural, que não tem a formação de um cone. Este magma extravasado tem características distintas do magma de vulcão de convergência, que é original da fusão entre o atrito das placas. No Vulcão de fissura, o magma é originado na astenosfera e tem uma composição básica, por isso ele é menos viscoso e escorrendo com facilidade não ocorrendo riscos de explosão por ter “entupido” os dutos vulcânicos.

Esquema de como é um vulcão fissural. Observe que o magma escorre pela superfície e se solidifica sem formar um edifício vulcânico como nos Andes.

Hoje este tipo de vulcanismo ocorre no meio dos oceanos e a maioria destes vulcões estão submersos, embora muitos afloram na superfície formando ilhas, como é o caso da Islândia (observe o vídeo acima com a atividade vulcânica do Holuhraun na Islândia).

No passado, no entanto, este tipo de vulcanismo ocorreu no Brasil, o maior evento de vulcanismo fissural ocorreu na bacia do Paraná, evento este que deu origem à formação Serra Geral, composta de Basaltos (quando a lava é resfriada em superfície) e Diabásios (resfriada em subsuperfície).

A rocha das Cataratas do Iguaçu é o Basalto. Rocha vulcânica evoluída da separação da América do Sul e África.Foto Pedro Hauck.

O vulcanismo fissural da bacia do Paraná foi um dos mais volumosos do Planeta, com uma área superior a 1.200.000 km². Em certos locais, os derrames sucessivos de lava possuem centenas até milhares de metros de espessura.

Na Serra do Mar é comum encontrar alinhamentos de Diabásios, são os chamados “Diques”. Eles são falhas, ou fissuras, por onde subiram as lavas no passado. Como foram resfriadas dentro destes “dutos” formaram Diabásios. O interessante é achar estes “Diques” aflorando a mais de 1500 ou 2000 metros acima do nível do mar. Ou seja, todo o basalto derramado deste vulcanismo não está mais lá, foi erodido…

Um dique de diabásio (rocha negra) no meio de um granito (rocha clara). Serra da Prata – PR. O diabásio era o “duto” por onde se extravasou magma durante um evento de vulcanismo fissural. Foto Pedro Hauck.

Canyon Fortaleza – RS. A rocha que aparece nos paredões são basaltos. Observa-se que há diversos degraus. Cada um deles é um derrame. Foto Pedro Hauck.

Noções sobre erosão e intemperismo

Erosão é a destruição das rochas e das formas de relevo que tendem ao nivelamento. Muitas vezes as pessoas confundem o termo com intemperismo, ou como preferem alguns, meteorização. A diferença é que o intemperismo existe a destruição do relevo por processos tanto mecânicos, químicos e biológicos que transformam, ou seja, decompõem a rocha.

Na linguagem científica fala-se em morfogênese para processos de erosão e pedogênese para processos de intemperismo, que resulta na formação de solos. De uma maneira superficial, obviamente, o fator que vai determinar a ocorrência de um ou outro processo é a presença de água, daí a importância do clima na evolução do relevo.

Perfil esquemático da evolução de um pediplano. Fonte Walter Casseti.

Em ambientes secos há o predomínio de morfogênese. A erosão mecânica destrói as rochas e as vertentes recuam de forma paralela. O material erodido é depositado nos setores mais rebaixados do relevo, formando os chamados pedimentos que quando se juntam formam um relevo aplainado, o chamado pediplano. Neste processo o solo é removido deixando aflorado a rocha mais resistente à erosão. São comuns em meio a pediplanícies a existência de grandes corpos rochosos que resistiram à erosão, os chamados “Inselbergs” muito comuns no Nordeste, como na região de Quixadá no Ceará e Milagres- Itatins na Bahia.

Inselbergs no município de Pancas ES.

Ás vezes afloram corpos menores de formas curiosas empilhadas umas às outras, formando o relevo de caos de blocos, muito apreciados por quem escala boulderes. A pouco tempo atrás foi rodado na Índia, o filme “Pilgrimage” do Chris Sharma onde os escaladores se divertem numa fantástica formação de caos de blocos. No Brasil ela também ocorre no Nordeste e são comuns e muito escaladas em Valinhos no interior de São Paulo.

Evolução do relevo de caos de blocos de acordo com Twidale (1976).

Boulderes na Serra dos Cocais, Valinhos SP. Foto Pedro Hauck.

Evolução de boulder em subsuperfície no Paraná. Foto Pedro Hauck.

Em ambientes úmidos há o favorecimento da pedogênese, dando origem à solos profundos. Os canais de água entalham o relevo, deixando-o inteiramente dissecado. Ao passar do tempo em condição de estabilidade de clima, os rios aprofundam seu canal, dando origem aos “mares de morros” muito comuns no sudeste brasileiro.

Vale do Paraíba, típica região de Mares de Morros (anteriormente florestados). Foto Pedro Hauck.

Quando existe alternância de longos períodos de climas secos e úmidos, há a possibilidade de formação de superfícies erosão. Que são elementos de relevo de uma antiga paisagem desestruturada.Essas superfícies são muito comuns no Brasil. Isto por que aqui houve períodos de formação de pediplanos seguidos por períodos de formação de mares de morros, Ao fim dos períodos secos, no clima úmido houve dissecações das antigas superfícies, rebaixando o relevo que ao retorno de um clima seco, no novo nível de base, passava a atuar novamente o fenômeno de aplainamento e ser ali passava a ser o limite do novo aplainamento.

Produzia-se então o escalonamentos de superfícies. O esquema a seguir ilustra bem a evolução das superfícies e paleo-superfícies de erosão.

Evolução e destruição das superfícies de acordo com Bigarella (2007).

 Mas afinal, e a Serra do Mar….

Agora que fizemos uma revisão dos conceitos mais importantes, vamos para a prática.
Na Serra do Mar observamos vários elementos que citamos acima. Na Geologia verificamos a presença de rochas antigas, como o granito, compondo a maioria das montanhas. Entre estes granitos achamos muitas vezes diques de diabásio de idade muito mais recente e uma ausência de basaltos que deveriam estar numa posição estratigráfica superior.

Na Serra, observamos vários picos rochosos que se destacam na paisagem. São antigos Inselbergs. É interessante também notar que por quase toda sua extensão a Serra do Mar corta regiões de relevo bastante ondulado e colinoso, os mares de morros.

Estas informações conjugadas nos dá uma dica sobre a origem e evolução da Serra do Mar.

A Serra dos Órgãos é parte da Serra do Mar no Rio de Janeiro. Foto Pedro Hauck.

Se por um lado afloram rochas antigas de origem vulcânica de tipo convergente, significa dizer que na região onde hoje é Serra do Mar existiu uma cordilheira de montanhas do tipo Andina. O continente desta paleo-cordilheira já não existe mais, foi inteiramente erodido ao ponto de somente sua “raiz” estar presente na paisagem, os granitos que são o arcabouço geológico de nosso continente atual. Estas rochas estiveram durante dois bilhões e meio de anos inumados no interior de antigos continentes e foram aos poucos sendo soerguidas enquanto as camadas de rochas superiores foram sendo removidas.

Orogênese Brasiliana entre 890 e 490 MA. Em laranja, antigos continentes, em lilás, rochas carbonáticas e em azul claro, antigos mares. A evolução das rochas da Serra do Mar se deu, em parte, na colisão entre vários continentes e a evolução de plútons em azul e verde, de onde originou-se os granitos.

A Serra do Mar começou a se desenhar com a evolução do último continente Gondwana, no final do Paleozóico durante o Permiano. Nesta época, a região onde hoje é a Serra do Mar não estava numa latitude maior, próximo ao pólo sul. Era uma região montanhosa e existiam muitas geleiras das quais algumas rochas são correlativas à este período, como os varvitos de Itu.

Os varvitos são ritmitos depositados em fundo de um grande lago que existiu na região. Sua deposição demonstra um ambiente glacial onde existia uma alternância entre uma época de degelo, onde a energia necessária para transportar sedimentos era menor e outra época de congelamentos onde o gelo assumia o papel de transportar sedimentos grosseiros e mais pesados. Quando alguém observa um ritmito, vê que na época de sedimentação de clima quente existem argilas e siltes, materiais granulométrios mais finos. Na época fria, com gelo, existem areias e seixos que se encaixam na discordância das camadas.

Esquema de um verão hipotético na evolução dos Varvitos de Itu. Org. Mário Assine

O Arenito do Morro do Cuscuzeiro é o chamado Arenito Botucatu do Jurássico. Foto Pedro Hauck.

No Mesozoico, a região onde é a Serra do Mar foi um grande deserto, talvez o maior que já existiu na Terra. Deste período é correlativo o arenito Botucatu, famoso por ser uma rocha porosa que hoje armazena água, formando o famoso aquífero guarani. O Botucatu tem estratificação cruzada, que mostra que foi depositado por vento em ambiente seco e dunar. Nesta época, a região onde hoje é a Serra do Mar estava no meio do continente Gondwana que estava se desfragmentando.

A separação da África com a América do Sul provocou os derrames de lava básicos de basaltos. Este vulcanismo durou milhares de anos ao ponto de haver seções estratigráficas onde se verificam camadas de basalto, depois de arenitos e novamente basaltos, ou seja, mostra que houveram fases sucessivas de vulcanismo e sedimentação.

Arenito (parte baixa da foto), intercaladas com basalto (parte alta). Serra do Corvo Branco SC. Foto Pedro Hauck.

Ao fim do Cretáceo, o recém formado continente sul-americano estava arrasado pela erosão devido o clima seco que se instaurou durante o Mesozoico. A partir desta época houve uma maior estabilidade climática e a tanto a vida começou a se adaptar, dando origem à Domínios de Paisagem, com uma estrutura ecológica mais equilibrada. Entretanto, algumas feições de relevo foram herdadas do antigo continente.

Como falei anteriormente, a região onde hoje está a Serra do Mar era o interior do Gondwana, uma região que tinha seu nível de base numa altitude mais elevada, ou seja, seu interior era um planalto. Este antigo continente foi “rachado ao meio” e cada novo continente levou uma parte deste antigo relevo gondwânico.

Se você observar o relevo e as drenagens em um mapa do Brasil, irá ver certas coisas curiosas, como a própria bacia do Paraná que é uma bacia anterior à origem da América do Sul. Nesta bacia existem inúmeros rios que nascem muito próximos ao mar, como o Tietê, Iguaçu, Paranapanema e correm em direção oposta, percorrendo milhares de quilômetros para somente em Buenos Aires chegarem ao oceano. O divisor de águas entre esta bacia e o mar é justamente a nossa serra. Mas então o que isso tem a ver com sua evolução?

Drenagens da região de São Paulo, observe o cotovelo formado pelo rio Paraíba do sul e também que os rios que deságuam no mar são muito pequenos. Por Aziz Ab´Sáber.

A bacia do Paraná está intimamente relacionada com a evolução da Serra do Mar. Os sedimentos que formam a bacia têm como sua área fonte o antigo planalto gondwânico que era a “proto Serra do Mar”. Foram mais ou menos 400 milhões de anos de embaciamento e sedimentação. Para se ter uma ideia do tamanho do pacote de rochas que se formaram, existem no centro da bacia mais de 100 quilômetros de rochas sedimentares para se chegar até o arcabouço da bacia, os granitos.

Corte vertical da bacia do Paraná do Rio Grande do Sul até o Mato Grosso. Observem a profundida das rochas sedimentares e também como o assoalho é bastante falhado, assim como a formação Serra Geral penetrou entre as camadas..

Peraí, falamos novamente em Granitos! O que tem a ver os Granitos que estão na base da bacia do Paraná e os Granitos que formam as montanhas da Serra do Mar? Esta é uma questão fundamental.

O peso das rochas sedimentares da bacia do Paraná provocou o soerguimento de suas bordas, um fenômeno chamado de “compensação isostática”. Ao ponto que elas iam sendo levantadas, os climas mais secos que imperavam durante o período respondiam pela destruição das rochas. As rochas mais recentes foram todas removidas, formando bacias sedimentares mais novas e expondo as rochas mais antigas, dando origem a então Serra do Mar.

Bloco diagrama da bacia do Paraná de acordo com Ab´Sáber. Pode-se observar nitidamente um soerguimento das bordas.

Estudos de caso: Como evoluiu a Serra do Mar no Paraná

No estado do Paraná, se fizermos um transecto de leste para o oeste, verificamos que saindo do litoral, a Serra do Mar é uma grande barreira que se ergue até os 1870 metros de altitude em seu cume mais elevado, o Pico Paraná. Ela não é apenas um degrau entre o litoral e o primeiro planalto, pois do lado ocidental da Serra, há um desnível que, saindo dos cumes perde altura, alcança o primeiro planalto, que fica numa altitude média de 800 a 900 metros, onde fica Curitiba.

Perfil geológico e geomorfológico do Paraná. Fonte Mineropar.

Mais a oeste no Estado, ergue-se uma nova barreira orográfica que se levanta até 1200 metros de altitude, a Serrinha de São Luis do Purunã. Se em sua vertente leste a serrinha é uma escarpa, à oeste ela é levemente inclinada, indo perder altitude gradativamente até que na região de Guarapuava há outra quebra no relevo, onde termina o segundo planalto com a elevação de uma escarpa que se sobressai cerca de 400 metros, chegando aos 1300 metros de altitude na Serra da Esperança, onde começa o terceiro planalto que ao exemplo do segundo, vai perdendo altitude até chegar aos 200 metros que é a cota altimétrica do rio Paraná no Estado.

Escarpa da Esperança em Guarapuava PR. A rocha é basalto e arenito. Foto Pedro Hauck.

Litológicamente é muito interessante o escalonamento deste relevo. Na Serra do Mar, aparece aflorando os granitos de mais de 2,5 bilhões de anos, na Serrinha de São Luis do Purunã, afloram os arenitos da Formação Furnas do Devoniano com 400 milhões de anos de idade e na escarpa de Guarapuava, afloram os basaltos da Formação Serra Geral de 140 milhões de anos.

Estes dados se encaixam perfeitamente na Teoria da compensação isostática que soergueu o relevo das bordas da Bacia do Paraná e produziu o relevo de “Cuestas”, ao exemplo das escarpas do Primeiro para o Segundo e do Segundo para o Terceiro Planalto.

Este soerguimento do relevo não atuou sozinho na esculturação da superfície do estado. Houve durante o Terciário a sucessão de climas secos prolongados que resultou na abertura de novas bacias e sobre elas mais tarde existiu a sedimentação de novos materiais, como é o caso da Bacia de Curitiba, onde existe a Formação Guabirotuba que tem menos de 2 milhões de anos.

Escarpa de São Luiz do Purunã.

Um paleocanal em meio à formação Guabirotuba. Foto Pedro Hauck.

Esta evolução se deve aos fenômenos erosivos o qual já recapitulamos. Nos primórdios da América do Sul, não existia a compartimentação dos planaltos paranaenses, tão pouco uma Serra do Mar aos moldes atuais. O recém formado continente vinha sofrendo uma intensa erosão desde o fim do Cretáceo e esta erosão aplainou quase por completo o relevo, formando uma superfície chamada Purunã. É correlativo à esta fase as formações sedimentárias cretáceas do Grupo Bauru, a qual compreende os arenitos da formação Caiuá comuns no norte e oeste do Estado.

Após este período de desintegração resistásica, um novo clima, mais úmido, se instaurou, mudando completamente a dinâmica da paisagem.As drenagens incidiram seus canais. Houve favorecimento da formação de solos e o relevo sofreu um amorreamento. Entretanto isso não durou até a atualidade.

Quando novamente um clima árido se instaurou, a erosão mecânica foi responsável pela remoção dos solos. O Material removido (pedimentos) foi transportado para os canais e a coalescência destes materiais deu origem à um relevo aplainado e mais rebaixado.

No meio deste plaino seco, existiam morros que se destacavam na paisagem com suas rochas expostas que devido à resistência litológica não foram erodidos, os chamados “Inselbergs”. Esta segunda superfície chama-se “Superfície Iguaçu”.

Este processo foi responsável para a abertura da depressão entre a Serra do Mar e a Serrinha de São Luis do Purunã, ou seja, o primeiro planalto, onde está Curitiba.

A Superfície Iguaçu foi novamente dissecada em outro clima úmido posterior que veio a se instaurar. Após o período de pedogênese, outro clima seco, já no final do Terciário, pediplanou o relevo criando a superfície Curitiba. Os Pedimentos da Formação Guabirotuba são correlativos à esta fase de erosão e hoje, nosso clima úmido atual é responsável pela dissecação desta última superfície onde se encontra a cidade da Curitiba.

Perfil esquemático de como evoluiu a região de Curitiba. 1) Fim do Cretáceo: Após 60 milhões de anos de semi-aridez, o relevo encontra-se arrasado pela erosão e totalmente aplainada, porém com alguns Inselbergs salientes. 2) No Mioceno, um novo clima mais úmido se instaura e há o entalhamento do paleo rio Iguaçu. O novo nível de base. Neste momento há influencia de tectonismo na abertura da bacia de Curitiba. 3) A partir do Mioceno, um novo clima semi-árido se instaura e ocorre novo período erosivo com recuo paralelo das vertentes e pedimentação, formando a Fm. Guabirotuba na bacia de Curitiba e Alexandra no litoral. 4) Momento atual. Organização P. Hauck (2017)

O Morro do Anhangava, a superfície Purunã é a ombreira à esquerda da foto, num lugar conhecido como “rampa da asa delta”

O Morro do Anhangava é um exemplo clássico para ilustrar essa evolução. Durante as fases áridas ele era um Inselberg. Houve ele se encontra mais suavizado, mas ainda se destaca na paisagem. Em suas vertentes, pode-se notar , uma”ombreira” que é uma superfície fóssil preservada, no caso, a Superfície Purunã.

O Bairro da Borda do Campo, vizinho ao morro, está assentado sobre a superfície Iguaçu. Que está nitidamente mais elevado que Curitiba, que é avistada desde o Anhangava, onde nota-se visivelmente uma diferença topográfica.Durante estes processos de erosão, houve conjuntamente processos de soerguimento do relevo.

Um exemplo é o Morro do Getúlio, indo para o Pico Paraná. Lá, numa cota altimétrica de 1300 metros encontra-se preservada a Superfície Purunã. Entretanto, a 1500 metros há uma outra superfície e não se trata de uma mais antiga, mas sim a mesma superfície, porém deformada. É possível que o evento que deformou o Morro do Getúlio, tenha também soerguido o Morro do Itapiroca, Caratuva e Ferraria, que são alguns dos mais altos da Serra do Mar Paranaense.

Paleosuperfícies de erosão na Serra do Mar. Nas fotos abaixo as mesmas em foto. (por Pedro Hauck 2017).

Em verde, diques de diabásio com orientação NW e em preto lineamentos estruturais do brasiliano na Serra do Mar para Paraná. Foto de André Bonacin.

Fica claro que quanto mais estes corpos eram soerguidos, mais fortes eram a ações de erosão que eles sofriam, basta ver o próprio conjunto do Pico Paraná e do Marumbi. Ambos têm vários cumes que são divididos por diques de Diabásio (ver foto acima), onde a erosão foi mais intensa devido uma resistência litológica diferencial, onde o material mais brando (diabásio) foi removido e o material mais resistente sobreviveu.

A erosão diferencial também foi responsável pelo surgimento do vale do Ribeira, na divisa do Paraná com São Paulo. Se formos observar no mapa da região, o Primeiro Planalto é dividido no meio por duas bacias de drenagens, uma do rio Iguaçu, que deságua no Paraná em Foz do Iguaçu na divisa com o Paraguai e Argentina e outra pelo rio Açungui, que deságua no Ribeira e logo no Mar.

O Rio Ribeira é um rio mais recente que surgiu depois do rompimento do continente Gonduana. Ele rapidamente entalhou seu canal de forma expressiva, com grande desnível e como seu nível de base é o nível do mar, muitos rios do planalto foram capturados por ele. É por isso que no vale do Ribeira afloram rochas muito mais antigas que o Arenito Furnas, como os calcários que forma as cavernas do PETAR, essa rochas são de uma época anterior à bacia do Paraná.

Da Mesma forma que o Rio Ribeira recuou a Serra do Mar, ela em toda sua extensão teve suas vertentes recuadas algumas dezenas de quilômetros.

Serra do Mar em São Paulo

Serra do Mar em São Paulo.

Em sua parte sul, a Serra do Mar em São Paulo é a escarpa que delimita o Planalto do vale do Ribeira e ela tem localmente o nome de Serra do Paranapiacaba. Sua evolução se deu com a abertura do rio Ribeira já no período Terciário e desde então ela vem recuando lentamente nos diversos períodos secos que houveram e aplainaram o relevo imprimindo as “ombreiras” em suas vertentes que foram suavizadas depois pelos climas mais úmidos, como o atual.
Na região da capital, há uma mudança da compartimentação. Pois saindo de leste a oeste, há a grande barreira da Serra do Mar, depois encontramos a bacia de São Paulo. Mais para o interior, atravessamos mares de morros cristalinos e na região de Valinhos, o relevo perde altura para em Campinas começar as rochas sedimentares da Bacia do Paraná e uma grande depressão marginal que se entende até um pouco depois de Rio Claro, onde se ergue as “Cuestas” da Serra de Santana, São Pedro, Botucatu, Itaqueri, etc.
Assim como no Paraná. O soerguimento da Serra do Mar e da “Cuesta” se deu por causa da compensação isostática em relação ao peso das rochas sedimentares da Bacia do Paraná que levantou as bordas.

O Morro do Cuscuzeiro, testemunho do recuo paralelo das vertentes no passado

Perfil do relevo no Estado de São Paulo.

Nos períodos secos do terciário, houve pediplanação e recuo paralelo das vertentes, tendo a abertura do Depressão Periférica onde fica Campinas, Americana. Neste processo, alguns locais mais resistentes não foram erodidos e ficaram preservados na paisagem, como é o caso do Morro do Cuscuzeiro que é um testemunho geológico da erosão.Na vertente leste da Serra do Mar, houve recuo da vertente e pela resistência litológica, não foi erodido um vulcão existente no litoral e que mais tarde veio a constituir a Ilha de São Sebastião. A escarpa da Serra do Mar entre São Paulo e Santos, encontra-se limitada à um sistema de falhas.

Na região do Vale do Paraíba, o tectonismo epirogenético soergueu a Serra do Mar e a Serra da Mantiqueira. Se você for observar bem, na região de São José dos Campos, o Rio Paraíba não corre no meio do vale, o que mostra que ali, o vale não foi esculpido pelo rio, mas sim pelo tectonismo, que fez que o rio se encaixasse naquele local.

Perfil geotectônico do vale do Paraíba (NEGRÃO et. al. 2015)

Quando houve o soerguimento das Serras da Mantiqueira e Bocaina, a placa onde está o vale do Paraíba sofreu uma acomodação e isso acarretou toda uma mudança na rede de drenagem regional. Chama-se de Horst o bloco que soergueu positivamente e Gráben o bloco que se acomodou.

Imagem do Google onde observamos o Gráben do Paraíba e o Horst da Mantiqueira.

Se você for olhar bem as nascentes do Rio Paraíba, verá que ele nasce em dois lugares na Serra da Bocaina, formando o rio Paraibuna e Paraitinga que correm em direção sudoeste até chegar perto de Jacareí. Lá eles se unem para formar o Paraíba que faz um cotovelo de 180° e voltam para o norte.

Os rios Paraibuna e Paraitinga já foram a nascente do Rio Tietê, mas quando houve a acomodação do Gráben do , Rio Paraíba, eles foram capturados e então a nascente mais distante do Tietê passou a ser em Salesópolis onde é hoje.

Nesta época, a região de São José e Taubaté, era um lago, onde inclusive existia vida pré-histórica de animais gigantes. Neste lago foi depositado sedimentos que se tornou a famosa formação Tremembé, que em Tupi quer dizer “alagadiço”.

Se formos acompanhar o rio Paraíba, as toponímias das cidades e lugares contam um pouco sua história, como Tremembé, que é um lugar onde o rio é bastante calmo e pantanoso, depois, passamos para Cachoeira Paulista, que é o lugar onde houve a ruptura do páleo lago e o relevo é mais irregular. O rio é encachoeirado até no Estado do Rio de Janeiro, onde encontramos “Barra Mansa”, onde ele perde energia e passa a ficar meandrante.

A Pedra do Bau era um antigo Inselberg na época da formação da superfície sul-americana. Hoje ele está ressalientado devido o soerguimento que atuou na Serra da Mantiqueira

As principais montanhas paulistas foram formadas por estes já citados eventos epirogenéticos. O planalto de Campo de Jordão é um exemplo. Ele já foi considerado uma superfície muito antiga, da época do Gondwana. Mais tarde perceberam que na realidade é uma superfície da mesma época daquela do Morro do Getúlio no Paraná, mas que foi soerguida a cotas altimétricas maiores, até 1800 metros de altitude. Alguns picos que se sobressaem à esta altitude, como é a Pedra do Baú, eram na época Inselbergs que sobreviveram toda este período de erosão.

Serra do Mar no Rio de Janeiro

O relevo no Rio de Janeiro já foi muito interpretado como sendo original de erosão por climas glaciais. Tal engano se deve a ao Frances Louis de Agassiz que veio ao Brasil à convite de Dom Pedro II. Agassiz interpretou a baia de Guanabara como sendo resultado da erosão do derretimento de uma geleira.

Tal afirmação, mesmo que ainda aceita por gente mal informada, está completamente fora da realidade, uma vez que a última vez que houve glaciação com geleiras no Rio de Janeiro foi durante o Permiano, mais de 250 milhões de anos atrás, sendo que todas as feições de relevo desta época já foram destruídos.

No Rio de Janeiro houve o mesmo evento de soerguimento de Horsts e acomodação de Grábens, que é no caso a baixada fluminense e a Serra dos Orgãos.

O Gráben da Guanabara.

O Gráben da Guanabara formou-se nos primórdios do Terciário, assim como o soerguimento da Serra do Mar que localmente se chama “Serra das Araras”. O recuo erosivo da escarpa da Serra do Mar, desde então, fez que esta se desfizesse em morros isolados mais resistentes que veio a se constituir nos Maciços litorâneos, a Serra da Carioca e mais afastados a Ilha Grande e Sepetiba, além de outros morros costeiros.

Durante as glaciações do Pleistoceno, o mar recuou centenas de metros e pelo Gráben da Guanabara formou-se um sistema de drenagem que escoava por um rio onde hoje fica a baia. Com o avanço do nível do mar ao fim da glaciação, as águas marinhas invadiram o continente e erodiram a foz desde antigo rio, formando a baia da Guanabara aos moldes atuais. Foram igualmente inundadas as baías de Sepetiba e Ilha Grande, orladas pelas escarpas da Serra do Mar, assim como o canal de São Sebastião.

A Serra dos Órgãos, assim como o maciço da Tijuca, são blocos falhados , Horsts. Estes maciços são constituídos de rochas cristalinas granitos e gnaisse, que é o granito metamorfizado. Estes maciços sofreram desnudação durante as épocas de aridez no Terciário e por isso evoluíram muitos Inselbergs, como o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Pedra do Sino, etc. Assim como no Paraná, existe na região inúmeros diques de Diabásio relativos com o vulcanismo da Formação Serra Geral. Localmente estes Diabásio sofreram incisão e foram ponto de partida para o entalhamento de erosão. Isto é nitidamente observado entre o Pão de Açúcar e o Morro da Urca.

Geologia da Serra dos Órgão. Observa-se no perfil as falhas normais.

A Serra dos Órgão vista do mirante do Soberbo em Teresópolis. Foto Pedro Hauck.

Conclusões

A Serra do Mar tem uma história fisiográfica muito longa onde se observa a conjugação de vários eventos paleoclimáticos em sua evolução que ocorreram concomitante com fenômenos epirogenéticos, mas que nada tem a ver com convergência entre duas placas Tectônicas, embora suas rochas tenham surgido durante sucessivos eventos como este em paleo-continentes em idades geológicas remontadas.

Embora não podemos chamar a Serra do Mar de uma “cordilheira” devido aos fatores genéticos que a Geomorfologia atribui à esta feição de relevo. Podemos chamar de “montanhas” as maiores elevações que compõem a Serra, o que desmistifica a afirmação de que no Brasil não existem montanhas.

Embora muita gente ache que o Brasil é um país só de praia, a Serra do mar desmistifica este preconceito. Uma vez que o núcleo de expansão da civilização brasileira se deu a partir das cidades que se situam às margens desta grande Serra e que hoje são os lugares mais importantes economicamente da América Latina. É por causa destes fatores que o Brasil, mesmo sem ter montanhas nevadas, tem montanhistas de ótimo nível e conquistas nas montanhas mais longínquas do mundo. Quase todos estes escaladores tem algo em comum, eles deram seus primeiros passos montanhísticos na Serra do Mar.

Para saber mais:

AB´SÁBER, A. N. Ritmo da epirogênese pós-cretácica e setores das superfícies neogênicas em São Paulo. Geomorfologia, São Paulo, IG-USP, nº 13, 1969(a).
AB´SÁBER, A. N. A depressão periférica paulista: um setor das áreas de circundesnudação pós-cretácica na bacia do Paraná. Geomorfologia, São Paulo, IG-USP, nº 151969(b).
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NEGRAO, André Pires et al . Mapa geológico do cenozoico da região da bacia de Volta Redonda (RJ, segmento central do Rifte Continental do Sudeste do Brasil): identificação de novos grabens e ocorrências descontínuas, e caracterização de estágios tectonossedimentares. Braz. J. Geol.,  São Paulo ,  v. 45, n. 2, p. 273-291,  June  2015 .   Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2317-48892015000200273&lng=en&nrm=iso>. access on  06  Dec.  2019.

 

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Sobre o autor

Pedro Hauck natural de Itatiba-SP, desde 2007 vive em Curitiba-PR onde se tornou um ilustre conhecido. É formado em Geografia pela Unesp Rio Claro, possui mestrado em Geografia Física pela UFPR. Atualmente é sócio da Loja AltaMontanha, uma das mais conhecidas lojas especializadas em montanhismo no Brasil. É sócio da Soul Outdoor, agência especializada em ascensão em montanhas, trekking e cursos na área de montanhismo. Ele também é guia de montanha profissional e instrutor de escalada pela AGUIPERJ, única associação de guias de escalada profissional do Brasil. Ao longo de mais de 25 anos dedicados ao montanhismo, já escalou mais 140 montanhas com mais de 4 mil metros, destas, mais da metade com 6 mil metros e um 8 mil do Himalaia. Siga ele no Instagram @pehauck

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