Esta expedição foi realizada de forma totalmente independente, nada de guias e agências, da forma que sempre fizemos, totalmente por conta.
Para conseguir esta independência, foi preciso ir para a Bolívia de carro, pois não adianta chegar de avião em La Paz e ter que pagar para alguém te levar até a montanha, aliás, este gasto é o maior em expedições andinas. Foi a segunda vez que eu fui de carro para a Bolívia e a minha quarta para os Andes. Cada vez mais eu confirmo que esta é a melhor maneira de ir para lá, sem falar que não há excesso de peso na bagagem e é muito mais barato.
Meu carro não é lá o mais apropriado para enfrentar as estradas de terra bolivianas, embora hoje em dia elas estejam muito melhores de quando fui pra lá pela primeira vez em 2001, sendo que as “BR´S” bolivianas estão todas sendo asfaltadas e estão ficando ótimas! O problema são aqueles trechos que ainda são de terra…
Sem entrar no mérito das perrengues rodoviárias, demoramos cerca de 4 dias pra chegar em La Paz. Apesar da lentidão de ir por via terrestre e de ter chegado a 4600 metros de altitude no meio da estrada, para depois descer até 3600 até a capital boliviana, isso não nos livrou de sofrer com os problemas do “Soroche”, o mal da altura.
Para piorar, eu saí do Brasil com uma gripe forte e na altitude ela ficou ainda pior. Tive que ir até Coroico, a 1800 metros, para me recuperar.
Sentindo-me melhor, fomos até a região da Lagoa de Zongo, na base do Huayna Potosi, a 4600 metros, para dar inicio à aclimatação. Foram três noites nesta altitude e depois mais duas no refúgio Chacaltaya, onde ficava a única estação de ski boliviana, vítima do degelo da montanha, à 5300 metros de altitude, onde hoje serve apenas como local para admirar a paisagem e ajudar na aclimatação dos andinistas.
Passado este período chato de aclimatação, saímos da região de La Paz e nos dirigimos à Villa Sajama, na Cordilheira Ocidental, na fronteira com o Chile. Lá fica o Sajama (6547 metros), a montanha mais alta da Bolívia e os Payachatas, os vulcões gêmeos composto pelo Parinacota (6300) e Pomerape (6200 metros).
Como eu já tinha escalado o Parinacota em 2007 (não tendo muitas boas lembranças do vento de lá!), acabei ficando no vilarejo enquanto Maximo e Hilton foram para a montanha. Eles pegaram o mesmo vento insuportável que eu peguei. Contando que ainda não estavam super aclimatados, acabaram não fazendo cume. Pior do que isso é que o Maximo voltou de lá com gripe.
Acabamos por ter que dar um pulo em La Paz, onde o Hilton pegou o avião pra voltar pra Curitiba e o Maximo se recuperou da gripe em altitudes “menores”.
De volta à altitude, nos encontramos com dois brasileiros muito figuras, os catarinenses Diogo e Gabriel, que foram até lá de Fiat Uno!!! Fomos com eles até o Sajama, nossa primeira montanha da viagem.
Foi a terceira vez que eu fui para a Cordilheira Ocidental boliviana e nesta oportunidade eu confirmei que este não é um lugar muito agradável para se escalar, isso por conta dos ventos fortíssimos e incessantes e também da secura insuperável.
Passamos 3 noites à 5700 metros de altitude, no acampamento alto da montanha, esperando o tempo melhorar. Neste período, 14 pessoas subiram até lá e desistiram de fazer ataque, dentre eles até mesmo nossos colegas catarinenses que precisaram voltar para o trabalho no Brasil.
Acabamos subindo na primeira janela de tempo sem vento. Na madrugada não enxergávamos as estrelas no céu, ao amanhecer percebemos os motivos: Nuvens de tempestade!
Mesmo com o tempo ruim não desistimos e por volta dos 6100 metros de altitude adentramos as nuvens e ficamos à mercê dos ventos brancos, do frio extremo e sem nenhuma visibilidade. Eu quase congelei minhas mãos, mas chegamos ao cume, que é plano e grande. Não fomos até o centro deste cume por conta dos ventos e frio extremo.
Infelizmente não tivemos a visão bonita que esperava ter lá de cima, a visão oposta que tive quando escalei os dois Payachatas, entretanto enquanto eu descia, algumas janelas se abriram e eu pude ver a altura daquela montanha e os quase 2500 metros que separavam o cume até o altiplano.
Descemos da montanha no mesmo dia e no seguinte já voltamos para La Paz. Na estrada, vimos a força da tempestade que nos assolou no cume, pois o altiplano estava totalmente branco, não parecia em nada com aquela paisagem seca que vimos na ida à montanha.
Descansamos em La Paz e em três dias já estávamos indo para o Illimani, de 6462 metros, a segunda montanha mais alta da Bolívia e, na minha opinião, a mais bonita!
A estrada para chegar no Illimani não é boa como a do Sajama. Foram cerca de 50 Km de estrada de terra muito precária e perigosa. Acabamos chegando no vilarejo que dá acesso à montanha no fim da tarde e fizemos a aproximação até o campo base de noite, na maior tranqüilidade, tendo as luzes de La Paz e El Alto sempre no horizonte com pano de fundo da caminhada.
No dia seguinte subimos até o acampamento alto da montanha. São mil metros de subida, com trechos de trepa pedra, misturando neve, gelo e rocha, com precipícios enormes ao lado. Tá certo que estes trechos não chegam nem sequer à um 3° grau de escalada, mas com mochila cargueira nas costas é preciso ter cuidado.
No acampamento alto nos deparamos com mais dez montanhistas que traçavam estratégias para subir até o cume. A nevasca que havíamos pego no cume do Sajama havia impedido a rota no Illimani. Teríamos que abrir a rota no meio da neve, o que é trabalho exaustivo.
Para tanto, combinamos com os outros montanhistas de ir revezando na frente, o que seria algo demorado. Por conta disso teríamos que sair às 2 da manhã. Como eu e o Maximo não somos muito adeptos à escalar de madrugada, acabamos nos atrasando e fomos os últimos à sair, uma hora mais tarde do combinado.
Mesmo atrasados, fomos rapidamente passando todos os montanhistas e chegamos na parte que ainda não haviam pegadas abertas, antes de todos os outros. Fomos na frente (bem na frente) de todos que estavam ali. Sem saber por onde ir e ainda no escuro, fomos interpretando o caminho e ao amanhecer já estávamos perto do cume. Acabamos sendo alcançados por um andinista do Chile, o Carlos e nós três fizemos o cume juntos, observando as nuvens serem levadas embora da altura, numa das cenas mais lindas e geladas que eu vi em minha vida!
Foram apenas 6 horas entre a hora que saímos do acampamento e voltamos para ele, passando pelo cume, é claro. Nada mal para quem teve que subir sem ver a rota e ainda ter que amassar neve…