Paramontanhismo na Serra do Mar paranaense com Rafael Wojcik

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Todo montanhista “forjado” ma serra do mar paranaense olha com muito respeito a imponência do conjunto de montanhas da Serra do Ibitiraquire onde estão montanhas como o Caratuva, Itapiroca, Pico Paraná, Ferraria e outras. Este conjunto de montanhas constituí um grande desafio para montanhistas de primeira viagem e é considerado uma caminhada “considerável” para montanhistas mais experientes, já que para acessar seus cumes não caminha-se menos que 2 horas em média.

Desde que iniciei no mundo do parapente tinha a idéia de aprimorar-me para decolar de montanhas, mas com base na boa formação que recebi eu sabia que não bastava fazer um curso e sair voando em qualquer montanha por aí. Voei por cerca de 4 anos em rampas do sul de minas e de Atibaia em São Paulo, mas sempre em companhia de outros amigos voadores com mais experiência que eu e em locais onde o acesso é fácil tanto para decolagem como para o resgate no pouso. Voltando a Curitiba eu sabia que não haviam muitas rampas boas com características semelhantes as que eu estava acostumado a voar, inicialmente comecei a voar no Morro da Palha em Campo Magro já que lá as condições eram mais próximas do que eu estava acostumado. Fiz alguns vôos e aos poucos fui conhecendo os pilotos paranaenses e mais informações sobre o vôo no Morro do Anhangava. Este morropara mim é muito familiar, já que como muitos foi onde comecei 18 anos atrás no montanhismo e escalada, porém voar ali era totalmente novo para mim. Meu equipamento pesava 18 quilos e por mais que sua caminhada até o cume não leve mais que uma hora não me animava a subir com todo aquele peso nas costas.
 
Depois de fazer alguns vôos no Palha estava querendo mais e decidi tomar coragem para carregar aquele mochilão de 18 kg Anhangava acima. Como sou uma pessoa que gosta de otimizar o tempo disponível decidi que sempre que fosse voar eu iria escalar antes, desta forma eu não precisava subir diretamente ao cume com todo aquele peso e de quebra poderia praticar meu outro esporte favorito que é a escalada em rocha. Nas duas primeiras tentativas subi com o parapente nas costas, mas decidi descer sem voar, uma vez que as condições não eram favoráveis, até que então no dia 03/03/2013 decolei pela primeira vez do Morro do Anhangava. Para mim a sensação era muito especial, pois eu estava voando acima do lugar que me formou como montanhista e agora tinha o privilégio de contemplá-lo de diversos ângulos que até então nunca tivera a oportunidade de conhecer.
 
Depois deste vôo vieram outros no Anhangava, decolei do Morro da Samambaia que é vizinho a ele, decolei de uma laje de pedra bem acima do Campo das Panelas, troquei minha selete(cadeirinha para vôo) por uma mais leve, inclusive em um dos vôos escalei uma via com o equipamento de vôo nas costas para chegar ao cume (tudo é treino), enfim, já estava familiarizado com o lugar.
 
Como sempre queremos realizar mais sonhos, dois grandes ícones de sonhos relacionados ao voo flutuavam em minha mente, eram o vôo no Conjunto Marumbi e o vôo no Pico Paraná, mas voar requer paciência e planejamento metereológico e se tratando da Serra do Mar Paranaense este planejamento nem sempre funciona. Decolar do Conjunto Marumbi requer uma autorização especial do parque, uma caminhada bem pesada, além das condições ideais para vôo e um pessoal disposto para acompanhar na empreitada. Já o Pico Paraná requer uma caminhada mais pesada ainda, motivo que por si só já desanima se você pensa em realizar sozinho uma idéia dessas e no vôo livre uma parceria faz muita diferença, inclusive é fundamental para a segurança, pois se acontecer algo com você seu parceiro tem condições de acionar um resgate. Então um dia recebo o contato de Gil Piekars, montanhista e piloto de parapente com vasta experiência nos dois esportes me sugerindo voarmos no Camapuã ou no Caratuva. Imediatamente me subiu um frio na barriga, um misto de receio por nunca ter voando por aquelas bandas e de euforia em saber que estava diante de uma excelente oportunidade de fazer um vôo onde no mínimo poderia ver o Pico Paraná do alto e de perto. Aceitei o convite imediatamente e tratamos de ficar monitorando as previsões de vento, pressão atmosférica e tudo aquilo que nos daria mais segurança em realizar aquele vôo.
 
No dia do vôo saímos cedinho de Curitiba com céu azul e muito animados com o que viria pela frente, éramos eu, Gil Piekars e Henrique Ribas, este último faria o resgate do Carro caso voássemos em direção ao litoral. Para Henrique era tudo novo, o montanhismo, o vôo, o lugar… Iniciamos nossa caminhada na Fazenda Pico Paraná cerca de 8:45 chegando ao cume do Caratuva as 11:20 hr. O cenário era perfeito, o vendo já soprava do quadrante noroeste que era ideal para a decolagem, mas ainda era preciso esperar, pois as correntes térmicas que nos levam para cima começam a ficar mais intensas após as 13:00 hr. Inicialmente nos preocupamos com nuvens baixas que vinham do sudeste encobrindo todo litoral. Se estas nuvens permanecessem não conseguiríamos ver o pouso em Antonina até cruzá-las. Como eu disse anteriormente vôo é paciência e permanecemos esperando até que estas nuvens começaram a dissipar-se, independente disso tínhamos estipulado um horário limite para decolagem que era as 13:30, pois em vôo de montanha você tem que contar com o tempo de retorno caminhando caso o vôo não seja possível, mas as nuvens dissiparam e chegara a hora de iniciar os preparativos para a decolagem.
 
Normalmente rampas de vôo livre são bem limpas de terra, de grama ou em uma laje de pedra, mas em montanha você tem que decolar de onde for possível dentro de uma segurança. Avaliamos de onde vinha o vento, escolhemos um local onde as Caratuvas eram mais baixas e abrimos nossos parapentes. O parapente possuí muitas linhas e para enroscar estas linhas naquelas Caratuvas era muito fácil, a conseqüência disto é que quando puxamos o parapente para decolar ele fica enroscado e temos que abortar a decolagem. Tentei deixas as linhas o mais livre possível daquelas plantas e dei uma pequena inflada em meu parapente para que as linhas ficassem tencionadas, desta forma seria mais difícil que as linhas ficassem enroscadas. A condição estava perfeita, vento moderado, térmicas se formando, tudo pronto. Olhei para o Gil que estava a meu lado se arrumando e tomei a decisão, era a hora de decolar! Quando o parapente veio até o alto de minha cabeça escutei o OK do Gil me confirmando que o parapente estava perfeito com todas as linhas livres e então me lancei para o vazio, tudo isso acontece em alguns segundos e deve ser muito bem dominado pelo piloto.
 
Logo de cara encontrei uma corrente de ar quente que foi me levando para cima, ao mesmo tempo foi surgindo atrás do Caratuva o imponente Pico Paraná e quando você entra em uma térmica deve tomar rapidamente a decisão de começar a fazer giros de 360º dentro dela para aproveitar ao máximo a corrente de ar ascendente, fazer isto em um lugar cuja paisagem já é muito familiar é uma coisa, outra é fazer onde para todo lado que você olha tem uma novidade que você não quer deixar de ver e isto te faz perder a concentração no vôo, mas decidi concentrar-me e mandar para cima. Eu mantia uma altura média de 300 metros acima do Caratuva, pude voar até o Itapiroca, o Taipa, o Ferraria onde deu para ver sua imponente parede leste, enfim era um vôo fantástico. Com aquela altura eu já poderia passar para o outro lado da montanha e seguir para Antonina passando ao lado do Ibitirati, mas resolvi esperar o Gil que estava tendo problemas com linhas enroscadas nas Caratuvas. Então depois de algumas tentativas ele decolou com segurança, fizemos um sobrevôo juntos ali pelo Caratuva até que ele ganhou altura e me informou pelo rádio que estava indo para Antonina, neste momento eu estava girando em uma térmica “enchendo o tanque” até o máximo de altura que ela me levasse, subi 500 metros acima do Caratuva, estava a 2.251 metros acima do nível do mar, já via o Pico Paraná mais baixo que eu, foi quando comuniquei Gil que estaria logo atrás dele. É impossível descrever a sensação do PP literalmente abaixo de seus pés com toda aquela magnitude. Lembro-me de pensar naquele momento que tudo velera a pena, o esforço da caminhada, o lento mais correto aprendizado de voar, a grana que se gasta neste tipo de esporte, era uma sensação muito boa, uma satisfação imensa em estar ali. A única imagem triste era ver que uma grande parte do Pico Paraná e de sua face leste completamente destruída pela queimada provavelmente provocada por alguém irresponsável que não tem idéia das conseqüências devastadoras que uma simples fogueira em um ambiente seco pode provocar. 
 
Agora em direção a Antonina o vento nos “empurrava” então passamos pelo conjunto do Pico Paraná rapidinho a cerca de 40 km/h, a partir daí não tivemos mais correntes de ar ascendentes, foi um vôo liso e suavemente descendente sem nenhuma turbulência onde podia-se “deitar” na selete e curtir a paisagem. Voamos em direção a uma lanchonete que existe as margens da PR-340 junto ao rio Cacatu. Pousamos, fizemos um bom lanche e ainda conseguimos uma carona com o senhor que é proprietário daquela lanchonete. Como a sorte naquele dia estava ao nosso lado chegamos apenas 5 minutos antes do ônibus para Curitiba partir findando nosso dia de montanhista e pilotos.
 
Este foi um típico vôo do tipo paramontanhismo que ainda é pouco praticado no Brasil, mas com a chegada dos equipamentos mais leves e compactos esperamos que mais voadores e montanhistas comecem a praticar esta modalidade tão maravilhosa.
 

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Sobre o autor

Texto publicado pela própria redação do Portal.

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