Quem disse que no Uruguai não tem escalada?

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O Uruguai é conhecido pelo bom churrasco, qualidade de vida e o relevo aplainado. Eis que do meio dos pampas e envolto pelas pradarias mistas há um ótimo lugar para a escalada: Cerro de los Cuervos.


A realização de um evento científico em Montevideo foi o convite que faltava para que eu pudesse conhecer, ou melhor, pesquisar sobre as escaladas no país visinho do sul, pois até então eu não sabia que o Uruguai tinha escaladas, mas já que eu estava indo pra lá, que mal faz?

Acabei encontrando em um site argentino informações sobre escalada no Uruguai. Nele, quase nenhuma informação, apenas a confirmação que no país tinha pedra…

Nas vésperas da viagem, devido compromissos com minhas pesquisas, pouco pude planejar. Ao comentar com amigos que ia escalar no Uruguai, enxergava nítidos sinais de interrogação e inevitáveis anedotas. Entretanto, foi somente em Minas (cidade do Uruguai), que vi que a tal escalada no país das planícies não era para vacas…

Com um nome tão peculiar (Minas, tinha que ser…) a região desta cidade abriga alguns dos poucos morros rochosos do país: Cerro Arequito e Cerro de los Cuervos, sendo que somente neste último há vias equipadas. Aliás, digno de nota, estes morros são resíduos de um antigo relevo planáltico que existiu na região e que foi arrasado por uma erosão remontante poderosa. Eles estão presentes na paisagem só porque suas rochas, o Riolito, são mais resistentes que as do entorno. Em outra oportunidade poderei discutir a gênese do relevo uruguaio, mas vamos voltar às escaladas.

O Cerro de Los Cuervos fica dentro de uma propriedade particular onde funciona um camping em que a atração é um rio alargado, de águas negras e pouco enérgicas, onde as pessoas nadam. Apesar de ser um rio, as pessoas chamam a paragem de “Laguna de los Cuervos”. A área de acampamento fica dentro de uma mata ciliar, de sub-bosque aberto muito agradável. A convivência com os banhistas é cordial e o povo uruguaio é muito educado e respeitador.

O acesso ao morro se dá atravessando uma balsa improvisada pelo dono do camping. Chegando ao outro lado não há arrependimento: As paredes ficam muito próximas à mata de encosta que são povoadas por um tipo muito curioso de árvore, os Ombues, que tem troncos ramificados de coloração clara e que formam um bosque por onde é possível caminhar entre as árvores e na sombra das copas, sem se preocupar com bambus e cipós, numa paisagem de conto de fadas onde é comum avistar blocos enormes que atiçam qualquer escalador e só não me seduziu porque a área fonte destes blocos é igualmente estupenda, bela e vertical parede que em alguns lugares chegam a ter uns 70 metros de altura.

Quando chegamos na base das vias, eu e minhas parceiras Karla, Eliza e Mayara, ficamos admirados pela beleza e verticalidade da rocha. Logo de inicio optei pela linha mais bonita, que imagino ser um 8b, que realizei em artificial (leia-se: Roubei!). Em seguida entrei em uma linha adjacente também vertical e muito alta, com lances de equilíbrio em regletes, abaolados em buraco e muito posicionamento, trinta metros de dificuldade constante em pelo menos 7b, uma linha linda pra mim, mas nem tanto para minha parceira que caiu e machucou o joelho.

Mesmo com a parceria contundida, insistimos na escalada, pois não é todo dia que vamos pro Uruguai. Fizemos mais cinco vias, todas altas, bem trabalhadas e muito belas. A coroação veio no final do dia com um 6 sup de 60 metros, de onde pude avistar o sol se por atrás das Coxilhas formando um dégradé de vermelho no céu.

Infelizmente não pude ficar mais para poder conhecer outros lugares do morro e outros morros da região. Fica então o convite à outras pessoas a conhecer as escaladas uruguaias, se encantar com a paisagem e ainda contribuir com o crescimento da atividade no país visinho, pois a região tem potencialidade de abertura de muitas linhas belas e desafiadores de escalada e de boulder.


Pedro Hauck, colunista do Altamontanha.com é também dono e editor do site Gentedemontanha e tem apoio de Botas Nômade.

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Sobre o autor

Pedro Hauck natural de Itatiba-SP, desde 2007 vive em Curitiba-PR onde se tornou um ilustre conhecido. É formado em Geografia pela Unesp Rio Claro, possui mestrado em Geografia Física pela UFPR. Atualmente é sócio da Loja AltaMontanha, uma das mais conhecidas lojas especializadas em montanhismo no Brasil. É sócio da Soul Outdoor, agência especializada em ascensão em montanhas, trekking e cursos na área de montanhismo. Ele também é guia de montanha profissional e instrutor de escalada pela AGUIPERJ, única associação de guias de escalada profissional do Brasil. Ao longo de mais de 25 anos dedicados ao montanhismo, já escalou mais 140 montanhas com mais de 4 mil metros, destas, mais da metade com 6 mil metros e um 8 mil do Himalaia. Siga ele no Instagram @pehauck

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