Cerro Torre é uma montanha espetacular, sua verticalidade impressiona e suas formas quase simétricas e harmoniosas a enaltecem. Situada nos campos de gelo do sul da Patagônia, na América do Sul, se encontra em uma região disputada pela Argentina e pelo Chile, localizada a oeste do Cerro Fitz Roy (também conhecido como Cerro Chaltén). Esta montanha faz parte de um conjunto de quatro montanhas, sendo ela a mais elevada de todas (Torre Egger, Punta Herron, e Cerro Stanhardt).
O Cerro Torre também foi inspiração para o filme Scream of Stone (em português se traduziu o filme como No Coração da Montanha) de 1991, dirigido por Werner Herzog.
Primeiras tentativas – 1950
Desde 1936 circulavam entre os escaladores europeus fotos e descrições do Cerro Torre (3.102 m). Alberto María de Agostini descreveu o cerro: “Formidáveis paredes de granito talhadas verticalmente sobre o glaciar”. e outra frase que mostra a impressão que causou esta montanha é de Lionel Terray (primeiro escalador junto a Guido Magnone do Cerro Fitz Roy), que disse “Enfim existe um cerro pelo qual vale a pena arriscar a vida”. Estas descrições, mais a ideia que foi se formando de que era uma montanha impossível de escalar, desataram na Europa ambições de escalar-lo.
Cesarino Fava, italiano residente na Argentina, foi um dos poucos escaladores, além dos integrantes da expedição francesa ao cerro Fitz Roy de 1952, que havia visto o Cerro Torre e suas grandes paredes.
Fava perdeu todos os dedos de seus pés em 1950 durante um resgate no Aconcágua Assim mesmo, Cesarino, impressionado pela beleza e magnitude da montanha, ansiava por escalá-la. Necessitava de um companheiro e a seus ouvidos havia chegado a fama de “A aranha dos Dolomitas” (apelido pelo qual se conhecia Maestri na Itália), a quem sem conhecer, considerou como o mais indicado para realizar a tentativa de escalar o Torre. Cesarino enviou uma carta para este endereço “A aranha dos Dolomitas”. Trento, Itália. Esta chegou nas mãos de Cesare Maestri, que começou a organizar uma expedição para a Patagônia a mando de Bruno Detassis.
Na comunidade italiana, a ascensão dos franceses do cerro Fitz Roy havia despertado grande interesse pela Patagônia. Por isto também, Walter Bonatti e Carlo Mauri planejavam tentar a escalada ao Cerro Torre, casualmente, na mesma temporada.
O grupo das Dolomitas (do qual fazia parte Maestri), e o grupo “Ragni di Lecco” (Bonatti, Mauri), e mesmo vivendo na mesma região, mantiveram uma rivalidade durante anos.
A expedição de Bonatti foi apoiada economicamente pelo Club Alpino Italiano e por Folcon Doro D´Altan, um endinheirado italiano que vivia em Buenos Aires.
Depois de estudar o Cerro Torre, Bonatti e Mauri decidiram que a rota mais fácil deveria ser pela face oeste, exposta ao vento mas com possibilidade de escalar em gelo. A cordada, mais um pequeno grupo de apoio, voou até a Patagônia no fim do ano 1957. Em poucos dias fizeram a longa aproximação até a face oeste pelo Gelo Continental e cavaram uma confortável cova de gelo. Durante o mês seguinte fixaram 600 metros de corda e chegaram ao colo entre o Cerro Torre e o Cerro Adela. Logo em 2 de Fevereiro de 1958, subiram pelas cordas fixas e escalaram outros 120 metros. mais acima do colo.
Bonatti experimentou esta rota e definiu como um dos lugares mais difíceis que já havia escalado em toda sua vida. Segundo suas palavras “O gelo era muito vertical e em algumas partes até negativo”. A rota se tornava muito difícil para eles e no entanto faltavam 600m até o cume, e por isso desceram de volta ao colo e deste até o glaciar.
Com a esperança de voltar outro ano, nomearam o colo como ´Colo da Esperança´.
Dias depois fariam uma travessia de norte a sul pelo Cordón Adela, fazendo a primeira ascensão dos cerros Adela Norte, Central e Sul, e a segunda ascensão aos cerros Doblado e Grande.
Porém a montanha pela qual vieram para a Patagônia não havia sido escalada, segundo Bonatti, nunca seria.
Carlo Mauri descreveu assim o Cerro Torre: “O cume da montanha parece um gigantesco cone que foi recoberto com gelo e depois pressionado para baixo fazendo com que o gelo se expandisse mais e mais sobre as bordas do cone, porém neste processo de expansão foi congelado para sempre. A medida que o vento oeste agrega mais neve à estrutura, esta começa a se torcer pela força e se torna um labirinto de gelo para cima e para baixo, até que a gravidade atue e blocos de gelo do tamanho de casas se despedacem mais abaixo nas lisas paredes da montanha“.
Pelo leste e ao mesmo tempo, se encontrava já instalada na região a expedição liderada por Bruno Detassis. Estava composta por Cesare Maestri, Catullo Detassis, Mario Stérnico, Luciano Eccher e o ítalo-argentino Cesarino Fava. Com orçamento mais limitado, viajaram de barco para a Argentina (não de avião como a outra expedição). Seu acampamento estava perto da Laguna Torre. Apenas Detassis viu pela primeira vez o Cerro Torre e o declarou “montanha impossível”, proibindo a sua equipe de escalá-lo, dizendo: “o Torre é impossível de escalar e não quero que ninguém arrisque sua vida para tentar”.
O único momento em que as duas expedições se viram foi quando de ambos os lados e no mesmo dia escalaram o Cerro Adela. Maestri espiou Bonatti e Mauri perto do cume mas foi incapaz de alcança-los. Quando chegou encontrou marcas de urina na neve, tomando isto como uma ofensa pessoal.
As duas expedições voltaram à Europa derrotadas. Para Maestri as coisas não terminariam por aí, sua história com o Cerro Torre recém começava. Em seu livro autobiográfico “Arrampicare e il mio mestiere” (Escalar é meu ofício) narra esta tentativa de 1957. As palavras são belas e mostram o conflito que havia gerado em Maestri esta belíssima montanha. O homem vencido que se vê impotente sem poder atuar. O Cerro Torre e sua ambição de escalá-lo.
Se antes que estas expedições que tentaram escalá-lo era considerado como inescalável, se tornou mais ainda quando os melhores escaladores do momento voltaram derrotados por ela. O nome ´Cerro Torre´ e o mito de ´montanha impossível´ corriam por todos os círculos de escaladores da Europa. Começava assim a corrida para conquistá-lo.
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:: A conquista do Cerro Torre – parte II