Quantas montanhas com mais de 2 mil metros há em Roraima?

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O Estado de Roraima, localizado no extremo Norte do Brasil, é uma região com uma paisagem singular. Mesmo estando no contexto da bacia amazônica, sua porção norte está inserido no domínio da Gran Sabana, uma paisagem com conexões florísticas com o cerrado onde se destacam formas de relevo montanhosas chamadas localmente de tepuys, que são feições de relevo positivas que se elevam de planícies e apresentam topos alongados e vertentes abruptas, como se fossem “mesas”.

Tepuy é apenas uma designação local para tais formas topográficas. No resto do Brasil este tipo de relevo é chamado de Chapada, na Espanha de Meseta, e nos Estados Unidos de “Table Mountain”. A forma da topografia, no entanto, não influencia no conceito geomorfológico de montanha, que é relativo à sua proeminência e não se ela tem forma de mesa, de pico ou agulha.

No conceito tradicional da Geomorfologia, que é a ciência do relevo, uma montanha precisa ter uma proeminência, ou seja, uma distância topográfica entre um colo e um cume, superior a 300 metros. Este conceito, usado no mundo inteiro, é um tanto quanto injusto para montanhas de baixa altitude, onde 300 metros é um desnível muito grande. Ao mesmo tempo, estes 300 metros são muito pouco para montanhas muito altas e desta forma percebemos que o critério clássico não é o melhor para a maior parte do mundo!

Afim de permitir um critério mais coerente para todas as montanhas do mundo, foi criado o Índice de Dominância, um critério que mede a porcentagem de dominância entre uma elevação e sua vizinha. De acordo com este índice, uma montanha é aquela que tem destaque topográfico superior a 7%. Veja no artigo abaixo como se calcula este índice.

O que faz uma montanha ser uma montanha? O índice de Dominância

Quais são as montanhas com mais de 2 mil metros de Roraima?

 

Monte Roraima 2810 metros

O Monte Roraima.

Com quase 3 mil metros de altitude, o Roraima é uma montanha famosa no mundo inteiro por causa do romance “O Mundo Perdido” de Arthur Conan Doyle que retrata aventuras nesta mítica montanha.

Por pouco que o Brasil ficou sem sua parte no Monte Roraima. A região era selvagem e desconhecida até meados do século XIX, quando começou as tratativas de delimitar as fronteiras entre Brasil, Venezuela e a Guiana, que na época era colônia da Inglaterra.

O critério escolhido para a divisão foi o das águas. Desta maneira, toda a terra drenada por rios que desaguam no Orenoco pertenceria para à Venezuela, a bacia do Essequibo, pertenceria à Guiana e os rios que drenam para o Amazonas, ao Brasil. Assim, com a descoberta das nascentes do rio Cotingo no Monte Roraima, o Brasil passou a dividir a montanhas com as demais nações.

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É muito comum vermos montanhas como fronteiras naturais entre países. A própria montanha mais alta do planeta, o Everest, é um exemplo. Só que o Roraima não é uma montanha normal. Seu cume tem 90 quilômetros quadrados e sem satélites ou aviões na época para fazer medições era impossível delimitar qual seria o ponto mais alto do Tepuy, que acabou ficando 100% dentro da Venezuela.

O Marco das Três Fronteiras, que é o ponto de convergência entre Brasil, Venezuela e Guiana, foi instalado em 1924 numa altitude de 2734,1 metros, que é a altitude que consta no Anuário Estatístico do IBGE que coloca o Roraima como a sétima montanha mais alta do país. Porém, o Roraima tem 2810 metros, que é a altitude da Pedra Maverick. Como a fronteira não passa pelo cume?

De qualquer forma, levei o cume verdadeiro do Roraima como referência e descobri que o colo mais alto entre ele e o Neblina, na extensa linha que divide os rios que drenam para o Orenoco e o Amazonas no limite norte do país está a 500 metros de altitude, o que confere uma proeminência de 2310 metros para o Roraima e uma dominância de 82,20%.

Pedro Hauck no marco das 3 fronteiras no Monte Roraima.

A Pedra Maverick se destacando desde o planalto do cume do Monte Roraima. Foto Pedro Hauck.

De fato, de acordo com as regras diplomáticas, seria difícil delimitar o território que cabe a cada país no cume do Roraima, pois naqueles 90 quilômetros quadrados existe uma bacia endorréica, ou seja, rios que desaguam em sumidouros no meio da montanha e não drenam para nenhuma bacia específica. Fora isso, o que vemos na realidade é que a Venezuela não respeitou o tratado com a Guiana e ela ficou com a cabeceira do rio Kako, que drena para o Essequibo. Veja a imagem abaixo de como são as fronteiras e como ela deveria ser:

Fronteiras no cume do Monte Roraima. Em roxo, como ela é e em amarelo, como ela deveria ser.

Roraiminha 2400 metros

 

O incrível Roraiminha, uma montanha de 2400 metros ignorada pelo IBGE.

Ao Leste do Roraima fica o Wei Assipu, também chamado de Roraiminha, que é um tepuy menor que tem 2400 metros de altitude.

O Roraiminha tem uma forma muito impressionante, com paredões por todos os lados e diferente do Roraima, seu acesso se dá por floresta e não por campos. Por este motivo, é muito difícil de chegar e escalar o Roraiminha e não tenho informação se isso já foi feito.

Apesar da elevada altitude, o Roraiminha foi simplesmente ignorado pelo IBGE e não consta no Anuário estatístico. Ele tem 460 metros de proeminência, sendo que a maior parte disso é de paredes verticais. Sua dominância é de 19,16%. Uma montanha em qualquer conceito!

 

Pico 2330RR

 

Este é o nome temporário que utilizo neste trabalho para denominar uma montanha localizada na fronteira do Brasil com a Guiana poucos quilômetros a Leste do Roraiminha. Tal montanha é um tepuy desgastado com paredes inclinadas, porém com bastante vegetação, que chega a 2330 metros de altitude. Ele possui uma proeminência de 740 metros e dominância de 31,75%. Portanto uma montanha de elevada altitude para padrões nacionais desconhecida e sem nome.

 

Maringma Tepuy 2147

 

O Maringma Tepuy.

Pela mesma linha de divisa entre Brasil e Guiana, a poucos quilômetros de distancia do Pico 2330RR, fica o Maringma Tepuy, uma montanha com formato clássico de chapada, com cume semi plano e paredes verticais abruptas que é separado do cume vizinho por um colo a 1350 metros de altitude, que confere uma proeminência de 757 metros e dominância de 37,12%. Outra montanha alta e destacada na paisagem totalmente desconhecida.

Localização do Roraiminha, Pico 2330RR e Maringma na fronteira com a Guiana.

Não é montanha:

 

Arabapo Norte.

 

O Tepuy do Arabapo possui dois cumes. O Sul, que pertence à Venezuela, tem 2370 metros e o Norte que pertence ao Brasil tem 2220. O colo que os separa e que também é a linha de fronteira está na cota altimétrica de 2090 metros, dando uma proeminência de 130 metros e dominância de 5,85%, insuficiente para ser considerada uma montanha independente. Infelizmente o Arabapo Sul é inteiramente venezuelano e por esta razão não pode ser incluído na lista de montanhas brasileiras, já que ele é inteiramente drenado pelo rio Arabapó, afluente do Orenoco através do rio Caroni.

Arabapo Norte e Arabapo Sul. Infelizmente o Brasil ficou com o morro e a Venezuela com a montanha.

Talvez seja mais um 2 mil roraimense

 

Serra da Mocidade

 

Serra da Mocidade. Fonte peronico.com.br/

Na porção centro ocidental do Estado de Roraima há uma singular região montanhosa que se elava da baixada fluvial do Rio Branco e atinge uma altitude medida pelo projeto SRTM de 1937 metros.

Esta montanha, com nome de Serra da Mocidade, é um maciço desconhecido, isolado e de difícil acesso no meio da floresta amazônica. Por estar no contexto florestal, onde há muita evapotranspiração das árvores e nuvens, o sinal de satélite sofre refração e por isso nestas regiões é sempre bom duvidar das altitudes obtidas através deste sensor remoto.

Já imaginou uma expedição exploratória em montanha, aos moldes que Humboldt, Reinhard Maack faziam em pleno século XXI? Então pegue um GPS de precisão e vai explorar este fim de mundo!

Localização da Serra da Mocidade.

Conclusões

 

O Estado de Roraima possui 4 montanhas acima de 2 mil metros e a montanha que deveria ser considerada a terceira mais alta do Brasil, perdendo em altitude apenas para o Pico da Neblina e o Pico da Bandeira, uma vez que o 31 de Março é apenas um ombro do Neblina e não pode ser considerada uma montanha em nenhum conceito técnico científico.

Aliás, neste artigo, encontramos mais argumentos para endossar as inconsistências da lista das montanhas mais altas do Brasil do IBGE. Primeiro por considerar a altitude do marco da divisa como sendo a altitude do Roraima e depois por ignorar na lista as demais três montanhas com mais de 2 mil metros que existem a leste do Roraima na fronteira com a Guiana. Todas montanhas inquestionáveis em todos os conceitos.

É incrível como um órgão técnico de excelência possa incluir uma “ombreira “do Pico da Neblina como uma montanha na lista e simplesmente nem citar a existência do Roraiminha.

Deixo meu apelo para que o IBGE passe a utilizar o critério de Índice de Dominância e que atualize a lista com as montanhas mais altas do Brasil.

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Sobre o autor

Pedro Hauck natural de Itatiba-SP, desde 2007 vive em Curitiba-PR onde se tornou um ilustre conhecido. É formado em Geografia pela Unesp Rio Claro, possui mestrado em Geografia Física pela UFPR. Atualmente é sócio da Loja AltaMontanha, uma das mais conhecidas lojas especializadas em montanhismo no Brasil. É sócio da Soul Outdoor, agência especializada em ascensão em montanhas, trekking e cursos na área de montanhismo. Ele também é guia de montanha profissional e instrutor de escalada pela AGUIPERJ, única associação de guias de escalada profissional do Brasil. Ao longo de mais de 25 anos dedicados ao montanhismo, já escalou mais 140 montanhas com mais de 4 mil metros, destas, mais da metade com 6 mil metros e um 8 mil do Himalaia. Siga ele no Instagram @pehauck

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